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Comentários sobre a nota promissória vinculada a contrato na jurisprudência do STJ

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A garantia do adimplemento do crédito é muito relevante para a economia do país. A legislação e as decisões da Justiça precisam dar conta dessa garantia.

Introdução

No presente artigo, faremos algumas considerações sobre a nota promissória vinculada a contratos na jurisprudência do STJ, comentando acórdãos a respeito. Inicialmente, porém, cabem algumas observações iniciais sobre os títulos de crédito e sobre as próprias notas promissórias.

Sabemos, conforme a doutrina, em especial as obras do eminente comercialista Sérgio Campinho (2019), que crédito etimologicamente nos remete à credere, que significa confiança. Assim, pois, a confiança é a base do crédito para a sua concessão. Um credor, ao conceder um crédito a um devedor, confia que este devedor seja honesto, tenha patrimônio e vá cumprir a obrigação de quitar sua dívida. Trata-se do elemento subjetivo. Além disso, o credor confia que há mecanismos que asseguram o pagamento, oferecidos pelas leis, pelas instituições, pelo Judiciário etc. Trata-se do elemento objetivo desta confiança.

A falta da confiança no funcionamento desses mecanismos que asseguram pagamento, ou seja, em um ambiente seguro de negócios, leva a menos crédito e a um custo mais elevado do crédito disponível no mercado. Portanto, a garantia do adimplemento do crédito é muito relevante e é neste aspecto que o Direito e o Judiciário têm um papel da maior importância. Afinal, a legislação e as decisões dos julgadores precisam dar conta dessa garantia.

Admitindo que o crédito seja uma possibilidade de, em uma data presente, alguém ter valores que só estaria à sua disposição em uma data futura, antecipando valores de modo à economia girar, podemos compreender juridicamente que o crédito se traduza na troca de algo presente seja um bem, um serviço ou mesmo numerário pela promessa de uma prestação futura, sendo os títulos de crédito um meio de se viabilizar com segurança o comércio do crédito, isto é, um instrumento que visa viabilizar negócios com base no crédito, conferindo segurança às transações.

Por isso, a existência dos títulos de crédito se justifica para o registro do crédito em meio cartular ou eletrônico, capacitando a circulação do crédito, sendo sua circulabilidade um de seus atributos, podendo o credor fazer circular o título, por exemplo, transferindo para um terceiro em pagamento ou garantia.

No presente artigo, nos ateremos a um título de crédito específico a nota promissória e a um tipo específico: a nota promissória vinculada a contrato. Discutiremos brevemente a seu respeito, tratando ainda de dois acórdãos do STJ referentes a este tema e, então, concluiremos nossas considerações acerca desse ponto.

A nota promissória vinculada a contrato e os princípios dos títulos de crédito: cartularidade, literalidade e autonomia (e a inoponibilidade), além da independência e abstração

Passando a uma discussão específica sobre a nota promissória vinculada a contrato, ainda cabem algumas palavras, com base nas obras de Sérgio Campinho (2019), em relação à chamada Teoria Geral dos Títulos de Crédito, para que possamos fundamentar aprofundadamente, do ponto de vista teórico, nossas observações acerca de dois julgados do STJ sobre a matéria mais adiante.

Como exposto pelo doutrinador italiano Cesare Vivante, segundo o eminente Campinho, os títulos de crédito seriam um documento formal necessário para que seu titular possa exercer o direito literal e autônomo nele consignado, ou seja, um documento formal que realiza valor para seu titular exercer direito literal e autônomo nele consignado, havendo princípios essenciais e princípios não essenciais presentes em todos os títulos de crédito.

  • A cartularidade

Dentre os princípios essenciais dos títulos de crédito, estão a cartularidade, a literalidade e a autonomia, sendo compreendido que a cartularidade só é um princípio essencial nos títulos cartulares, não se conciliando com os títulos eletrônicos, no chamado fenômeno da desmaterialização dos títulos de crédito. Mas tal cartularidade que exige a apresentação física de um título de crédito para um credor exercer direitos contidos no título continua sendo um princípio essencial em títulos de crédito como cheques, letras de câmbio e, o que aqui nos interessa, notas promissórias.

Nesses casos, é importante que se apresente o título ao devedor no vencimento, para se poder exigir o crédito, isto é, o direito literal e autônomo contido no título de crédito. Tanto é assim que ao se ajuizar uma ação para cobrança de um título de crédito, há que se juntar o título original, só se admitindo a juntada por cópia autenticada se o original estiver instruindo outro processo, dada a relevância da cartularidade.

  • A literalidade

Já quanto à literalidade, tal princípio nos aponta que o título de crédito é literal porque é regulado pelo conteúdo exclusivo de sua carta, ou seja, vale o que está escrito, frase inclusive popularizada no imaginário social. O título, assim, pode ser combinado com outra obrigação com força executiva, separadamente, mas o pactuado ali não se incorpora ao título. Porque quando se executa o título de crédito, só se exige o que deriva de lei ou o que está expressamente ali.

Em um caso de nota promissória vinculada a contrato, se o contrato prevê, por exemplo, que o inadimplemento de cada parcela ensejará uma multa, em caso de execução da nota promissória, a multa estará prevista no contrato, que deverá ter força executiva, mas não na nota promissória, pois a nota promissória não admite cláusula penal, apenas juros e dentro das especificidades estabelecidas por lei. Se a obrigação foi vencida e não foi paga, em execução da nota promissória só se pedirá o principal, juros moratórios e correção monetária, pois é o que decorre de lei, pois a multa apenas pode estar prevista no contrato, mas jamais na nota promissória, dada a relevância do princípio da literalidade. Lembrando que qualquer vício de forma tornará o título de crédito ineficaz.

  • A autonomia (e a inoponibilidade de exceções)

Por fim, há ainda o princípio da autonomia dos títulos de crédito. Segundo este princípio, cada obrigação assumida em um título de crédito goza de autonomia em relação às demais. O vício material de uma obrigação, fica preso a ela, salvo o vício de forma, que contamina todo o título. Isso quer dizer que, se em um título de crédito temos cinco obrigações, por exemplo, e duas delas possuem um vício material, as demais três permanecem válidas e o título pode ser cobrado em relação a essas obrigações que permanecem válidas. Lembrando que quando nos referimos a diferentes obrigações em um mesmo título, isso se dá porque um título de crédito é emitido, podendo ser endossado, avalizado etc. E, em suma, cada obrigação assumida em um título de crédito é autônoma em relação às demais, sem que um vício material de uma obrigação se propague às demais.

Por fim, ainda temos que nos referir, dentro do princípio da autonomia, do qual decorre, ao princípio da inoponibilidade de exceções a terceiros de boa-fé: a oponibilidade de exceção de um devedor não pode ser evocada diante de um credor de boa-fé para se deixar de cumprir uma obrigação de outro devedor. Por exemplo, no caso de um devedor ter uma moléstia (por exemplo, Alzheimer) que faça com que sua obrigação tenha um vício material (pois não seria um agente capaz), tal vício fica restrito à obrigação deste devedor, porque obrigações são autônomas, podendo apenas este devedor invocar sua incapacidade, no exemplo dado, mas os demais devedores não podendo invocar vícios relativos a obrigações de outros devedores.

Isso tudo porque as relações cambiais derivam de declaração unilateral de vontade válida e eficazmente lançada no título de crédito. O endosso é autônomo, o aval é autônomo etc. Porque cada obrigação assumida no título é autônoma em relação às demais. E dessa autonomia decorre a inoponibilidade de exceções: o devedor, uma vez cobrado pelo credor, só pode opôr direito pessoal, não pode invocar exceções próprias de outros devedores do título, signatários.

  • A independência e a abstração

Há, finalmente, dois princípios não essenciais, mas com relevo para a matéria a que nós nos voltamos na presente análise, que não estão em todos os títulos de crédito, mas que devemos nos referir em nossa exposição: o princípio da independência, segundo o qual o título de crédito é independente porque para sua emissão ser válida e eficaz é suficiente uma simples declaração de vontade do emissor; e o princípio da abstração, segundo o qual o título é abstrato, ou seja, não tem uma causa pré-definida em lei para sua emissão e, uma vez emitido e posto em circulação, tem funcionalidade, independentemente de sua causa que, como regra, não pode ser invocada para sua defesa.

Qual a questão que surge em relação a esses dois últimos princípios, chamados de não essenciais, para a matéria aludida neste artigo? O fato de que, por exemplo, uma nota promissória vinculada a um contrato de cessão de cotas de uma sociedade perca a sua abstração! Passa-se a admitir, entre o emitente e o credor do título, uma defesa com base na causa da emissão deste título de crédito.

Ou seja, se um título de crédito é vinculado a um contrato, o devedor passa a poder invocar a causa do título de crédito como defesa, desde que a emissão tenha feito parte do contrato, o que faz com que tal título de crédito perca seu caráter abstrato e sua causa possa ser arguida, relativizando-se sua abstração.

Por essa razão, a abstração não pode ser considerado um princípio presente em todos os títulos de crédito. Há vários títulos de crédito vinculados a contratos e neste caso a abstração serviria apenas para terceiro de boa-fé se o título circulasse. Assim, em resumo, os títulos de crédito perdem sua abstração (1) quando estão expressamente vinculados a um contrato ou (2) não sendo o terceiro considerado de boa-fé. Mas, observe-se: tem que estar no título de crédito e no contrato que o título de crédito é vinculado ao contrato!

Com o exposto, prossigamos em uma breve análise de jurisprudência, apresentando duas decisões, em acórdãos do STJ, em que o entendimento foi de que a vinculação da nota promissória a um contrato retira-lhe a autonomia de título cambial, mas não a sua executoriedade, desde que a avença seja liquida, certa e exigível, conforme os julgados do Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Recurso Especial nº 1367833/SP, de 2016, e os Embargos de Declaração nos Agravos de Instrumento nº 1120546/MG, de 2011.

Ambos são considerados paradigmáticos e é esta a razão de nossa escolha, pois, embora não sejam das decisões mais recentes do STJ sobre esta matéria, produziram decisões que ainda hoje são consideradas marcos para novos julgados do presente em relação ao tema.

O AgRg nos EDcl no REsp 1367833/SP e os EDcl no Ag 1120546/MG

Bem compreendidos acima os princípios essenciais e os princípios não essenciais dos títulos de crédito, em relação aos quais vimos a importância da discussão sobre o princípio da abstração no que concerne à nota promissória vinculada a um contrato, passemos a uma discussão sobre a nota promissória vinculada a contrato na jurisprudência do STJ. Para tanto, nos valeremos do AgRg nos EDcl no REsp 1367833/SP, que teve como relator o Ministro Marco Aurélio Bellizze, da Terceira Turma, sendo o julgado de 16/02/2016 (publicado no DJE em 19/02/2016) e os EDcl no Ag 1120546/MG, que teve como relator o Ministro João Otávio de Noronha, da Quarta Turma, sendo o julgado de 14/06/2011 (publicado no DJE de 20/06/2011).

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Sobre o AgRg nos EDcl no REsp 1367833/SP, tratou-se de um agravo regimental interposto por Auto Porte Rio Preto Veículos Ltda. e outros contra decisão monocrática de relatoria do próprio Ministro Bellizze, que havia negado seguimento ao recurso especial de embargos à execução de nota promissória vinculada a contrato de parceria. O ministro manteve a executoriedade da nota promissória, dentro do entendimento da Súmula nº 83 do STJ, havendo oposição de embargos de declaração, também rejeitados.

No agravo interno, novamente foram trazidos os fundamentos aduzidos no apelo extremo, como diz o próprio relator, acerca da necessidade de se decretar a nulidade da execução pela ausência de título executivo hábil à sua instrução, pois não haveria valor líquido a executar e, segundo os insurgentes, conforme o entendimento do STJ, a nota promissória vinculada a contrato de mútuo não gozaria de autonomia para embasar ação de execução.

Em seu voto, o Ministro Bellizze entendeu que os argumentos dos insurgentes não eram capazes de modificar as conclusões da sua decisão monocrática. Disse o ministro que a jurisprudência sedimentada do STJ se dava no sentido de que a nota promissória vinculada a um contrato de abertura de crédito perderia a sua autonomia ante a iliquidez do título que a originou, acarretando, portanto, na nulidade da execução por ela embasada, conforme o enunciado nº 258 da Súmula do STJ, segundo o qual a nota promissória vinculada a contrato de abertura de crédito não goza de autonomia em razão da iliquidez do título que a originou.

Entretanto, salientou o ministro que o caso específico do AgRg nos EDcl no REsp 1367833/SP se referia a um contrato de parceria comercial garantido por nota promissória. Por esse motivo, para ele, o fato da nota promissória neste caso estar vinculada a um contrato não impediria que se discutisse a relação jurídica subjacente à emissão do título, pois a característica da autonomia inerente aos títulos cambiários em geral seria suprimida. Sabemos os motivos pelo exposto na seção anterior deste artigo.

O Ministro Bellizze então reiterou que, se essa relação jurídica subjacente estivesse consubstanciada em contrato que espelhasse uma dívida líquida, o que de fato se tratava no caso que julgava, não haveria empecilho ao prosseguimento da execução. Seria diferente, porém, se estivesse amparada em contrato que não espelhasse dívida líquida, como se verificaria em contratos de abertura de crédito, em que não seria possível a execução.

A conclusão do ministro foi de que a vinculação de uma nota promissória a um contrato retira a sua autonomia de título cambial, mas não, necessariamente, a sua executoriedade. Nesses casos, a executoriedade do título só estará comprometida se o contrato respectivo não for capaz de refletir uma dívida líquida e exigível, sendo admissível a execução de nota promissória vinculada a contrato de mútuo que contenha valor, como já havia sido antes admitido pelo STJ, uma vez que o contrato traduz a existência de dívida líquida e certa. Para embasar a decisão, o ministro citou o REsp 861009/SC, de relatoria do Min. Sidnei Beneti, da Terceira Turma, julgado em 2010, e o REsp 259819/PR, de relatoria do Min. Jorge Scartezzini, da Quarta Turma, julgado em 05/12/2006.

Destarte, manifestando-se de acordo com o entendimento dos acórdãos referidos, e com a jurisprudência do STJ, o ministro negou provimento ao agravo regimental, nos termos da argumentação que analisamos acima, com a Terceira Turma, por unanimidade, votando junto a ele, no sentido de negar provimento ao agravo regimental, tendo votado os ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva.

Já nos EDcl no Ag 1120546/MG de cinco anos antes, o relator, Ministro João Otávio de Noronha, em igual sentido, julgou agravo regimental interposto por Vicente Cézar Zucolim Belasque e outro, contra uma decisão sua que se referia também à nota promissória e à autonomia, em relação a um contrato de empréstimo pessoal. O entendimento do ministro foi de que a nota promissória não perderia a autonomia se vinculada a contrato de mútuo. E apontou como precedentes a aplicação da Súmula nº. 282 do STF, conhecendo o agravo de instrumento para conhecer parcialmente do recurso especial e dar-lhe provimento.

Mas alegavam os embargantes que a decisão havia sido contraditória e omissa ao deixar de aplicar a Súmula n. 258/STJ, uma vez que o Tribunal havia concluído pela nulidade do contrato de empréstimo pessoal, e apontavam omissão, contradição e erro material porque a sentença e o acórdão ora reformados julgaram procedentes os embargos do devedor para extinguir a execução ante a ausência de título executivo.

Em seu voto, o Ministro Noronha, relator, começou apontando o quanto entendia ser perfeitamente cabível a oposição de embargos declaratórios a decisões monocráticas, mas que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça havia se firmado no sentido de que tal recurso, sempre que possível, fosse recebido como agravo regimental, sendo estes embargos de declaração admitidos por ele como agravo regimental.

O ministrou relembrou neste voto que tais embargos à execução haviam sido julgados procedentes para declarar a nulidade da execução por falta de título executivo e que tal conclusão foi mantida no acórdão recorrido, porque o entendimento foi de que a nota promissória perderia as suas características de abstração e autonomia, ficando subordinada à eficácia de contrato de mútuo.

O acórdão foi, porém, reformado pela sua decisão, por estar em confronto com julgados do STJ firmados no sentido de que a nota promissória não perderia a executoriedade se vinculada a contrato de mútuo que contivesse dívida líquida e certa, sendo referidos como precedentes o AgRg no REsp n. 777.912/RS, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ de 28/11/2005, e os EDcl no REsp n. 536.776/SP, de relatoria do Ministro Barros Monteiro, da Quarta Turma, DJ de 13/9/2004, além do REsp n. 861.009/SC, de relatoria do Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, DJe de 29/3/2010, e do AgRg no Ag n. 594.772/MG, de relatoria do Ministro Humberto Gomes de Barros, da Terceira Turma, DJ de 4/12/2006.

Por esses argumentos, o Ministro Noronha entendeu que deveria ser mantida a decisão atacada, destacando que a decisão agravada limitou-se a reconhecer a natureza executiva do título de crédito, devendo as demais questões postas nos embargos do devedor ser julgadas no foro competente.

É interessante observar que o ministro retificou, de ofício, erro material constante do dispositivo da decisão monocrática, uma vez que foi reconhecida a executoriedade do título, e não a sua autonomia, como estava expresso no texto, pedindo o ministro que, onde se lia ante o exposto, conheço do agravo de instrumento para conhecer parcialmente do recurso especial e dar-lhe provimento para, nos termos da fundamentação retro, reconhecer a autonomia da nota promissória, se passasse a ler, na verdade, ante o exposto, conheço do agravo de instrumento para conhecer parcialmente do recurso especial e dar-lhe provimento para, nos termos da fundamentação retro, reconhecer a executoriedade da nota promissória.

Com isso, recebeu o ministro os embargos de declaração como agravo regimental e lhes negou provimento, retificando, de ofício, erro material constante do dispositivo da decisão agravada. Com esse voto, a Quarta Turma, ao apreciar o processo, por unanimidade acompanhou o relator, decidindo por receber os embargos de declaração como agravo regimental e lhes negar provimento, tendo votado os ministros Luis Felipe Salomão, Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti e Antônio Carlos Ferreira.

Analisados esses dois acórdãos após expormos aprofundadamente as balizas teóricas e doutrinárias acerca da matéria, a partir das obras de Sérgio Campinho (2019), procedamos agora à conclusão do presente artigo, encerrando nossa análise sobre algumas considerações da nota provisória vinculada a contrato na jurisprudência do STJ.

Conclusão

Como vimos ao longo deste artigo, os títulos de crédito possuem a maior relevância, podendo ser considerados verdadeira mola propulsora da economia, por tudo que foi discutido desde a introdução do presente texto.

Além disso, há alguns princípios dos títulos de crédito, como a cartularidade, a literalidade, a autonomia e a inoponibilidade de exceções. Porém, há também os chamados princípios não essenciais, como a independência e a abstração.

Vimos ainda dois julgados paradigmáticos do STJ o AgRg nos EDcl no REsp 1367833/SP, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, de 2016, e os EDcl no Ag 1120546/MG, que teve como relator o Ministro João Otávio de Noronha, de 2011.

O que a decisão sobre o AgRg nos EDcl no REsp 1367833/SP nos mostra é que, com tal voto, se reiterou mais uma vez que apesar da jurisprudência do STJ se dar no sentido de que a nota promissória vinculada a um contrato de abertura de crédito perde a sua autonomia ante a iliquidez do título que a originou, acarretando a nulidade da execução por ela embasada (Súmula 258/STJ) a vinculação de uma nota promissória a um contrato retira a autonomia de título cambial deste título de crédito, sem tirar, necessariamente, a sua executoriedade, caso esteja consubstanciada em contrato que espelhe uma dívida líquida, caso em que não há empecilho ao prosseguimento da execução, o que se distingue do contrato de abertura de crédito, que não possibilitaria a execução.

Por sua vez, o STJ na decisão do EDcl no Ag 1120546/MG admitiu, como agravo regimental, tais embargos de declaração opostos a uma decisão monocrática proferida pelo Min. Noronha, mas ressalvando que a nota promissória não perde a executoriedade se vinculada a contrato de mútuo que contém dívida líquida e certa, sendo, no voto do relator apresentados precedentes do próprio STJ. Com isso, os embargos de declaração foram recebidos como agravo regimental, mas se negou a eles provimento, aproveitando o relator para retificar erro material de ofício em relação à sua decisão monocrática, como vimos acima.

Ambos os julgados nos mostram basicamente de que forma a nota promissória vinculada a um contrato perde sua autonomia, sim, embora não perca a sua executoriedade, pois continua sendo um título de crédito eficaz, atrelado a um contrato, o que não representa vício de nenhum tipo que ensejasse a sua nulidade, pelo contrário, embora não vá mais satisfazer o princípio da abstração, e não vá mais estar dotado da autonomia que teria se não estivesse vinculada, essa nota promissória, a um contrato.

Há hoje novos julgados no STJ neste mesmo sentido, mas aos quais, por economia de espaço não nos referiremos no presente artigo, em que quisemos basicamente apresentar dois julgados paradigmáticos sobre o tema das notas promissórias vinculadas a contrato, estando as notas promissórias, de modo geral, normatizadas na LUG, e sendo títulos de crédito que possuem duas figuras originárias na criação deste título, o emitente (o devedor do título, obrigado principal, também chamado de sacador) e o beneficiário (credor originário, o tomador), com natureza jurídica de promessa de pagamento em dinheiro (Art. 75 da LUG), traduzindo uma promessa de pagamento em dinheiro à vista ou a prazo formulada pelo emitente em favor do beneficiário, que pode circular por endosso, sendo o endossante um coobrigado, por garantir o pagamento ao endossatário.


Jurisprudência consultada

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg nos EDcl no REsp 1367833/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 16/02/2016, DJE 19/02/2016.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. EDcl no Ag 1120546/MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma, j. 14/06/2011, DJE de 20/06/2011.

Referência Bibliográfica

CAMPINHO, Sérgio. Direito de Empresa. Curso de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva, 2019.

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Sobre o autor
Carlos Eduardo Oliva de Carvalho Rêgo

Doutor e mestre em Ciência Política (UFF), especialista em ensino de Sociologia (CPII) e em Direito Público Constitucional, Administrativo e Tributário (FF/PR), bacharel em Direito (UERJ), bacharel e licenciado em Ciências Sociais (UFRJ), é professor de Sociologia da carreira EBTT do Ministério da Educação, pesquisador e líder do LAEDH - Laboratório de Educação em Direitos Humanos do Colégio Pedro II.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RÊGO, Carlos Eduardo Oliva Carvalho. Comentários sobre a nota promissória vinculada a contrato na jurisprudência do STJ. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 7088, 27 nov. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/101348. Acesso em: 28 abr. 2024.

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