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O controle das redes sociais, a liberdade de expressão e a privatização da jurisdição

O controle das redes sociais, a liberdade de expressão e a privatização da jurisdição

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Analisando a liberdade de expressão em diferentes sistemas jurídicos e seu impacto nas redes sociais, o artigo destaca as ameaças à democracia com a restrição do discurso e a privatização da jurisdição.

Resumo: O presente artigo científico visa analisar a liberdade de expressão sob a ótica de ao menos três sistemas distintos, o norte-americano, o europeu e o brasileiro bem como o impacto dessas variadas formas de aplicar a liberdade de expressão quando veiculada na novel tecnologia digital denominada “redes sociais”. Busca-se contrastar as variadas formas de aplicação decorrentes dos três sistemas de forma a melhor sopesar e garantir o fundamental direito à livre expressão do pensamento como a mais pura forma de nutrir-se o sentimento de liberdade ínsito à democracia enquanto legítima forma de governo, considerando-se o dispositivo constitucional que prevê que todo poder emana do povo. Nesse diapasão, de forma a permitir um melhor contraste busca-se as origens dessa nova forma de comunicação, delimita-se a plena liberdade de expressão em seus primórdios e as diversas tentativas de amputar-se essa mesma liberdade especialmente nessa segunda década do século XXI. Busca-se ainda um paralelo entre o que ocorreu com a disseminação do conhecimento entre seu nascedouro e a maturidade de modo a contrastar a inocuidade de se limitar um direito fundamental como a expressão livre de pensamento. Ao final busca-se demonstrar a gravidade de tais investidas contra o livre pensar para próprio sistema democrático de governo, considerada, especialmente, a regulação restrita do discurso eleitoral e atribuição à grandes companhias de tecnologia do direito de mitigar a divulgação de ideias e discursos em suas plataformas digitais, naquilo que chamamos de privatização da jurisdição, alterando fundamentalmente o conceito de democracia e, hiperbolicamente, resultando na efetiva desconstrução do regime democrático insculpido na Constituição Federal. O método dedutivo foi a linha condutiva dessa pesquisa, tendo por base a leitura de fontes bibliográficas, documentais e legislativas.

Palavras-chave: Liberdade de expressão. Privatização da jurisdição. Direitos fundamentais. Regime democrático.

Sumário: 1. Introdução. 2. A liberdade de expressão segundo as cortes supremas. 2.1. Direito comparado. 2.1.1. Estados Unidos da América. 2.1.2. Europa. 2.1.3. Brasil. 3. As redes sociais. 3.1. Origens. 3.2. BBS e ICQ. 3.3. O MSN da Microsoft. 3.4. O Orkut. 3.5. O Facebook. 3.6. O Whatsapp. 3.7. O Instagram. 3.8. O Youtube. 3.9. O Twitter. 4. Evolução da liberdade de expressão. 4.1. Idade Média. 4.2. Idade moderna. 4.2.1. A renascença e o iluminismo. 4.3. Contemporaneidade. 5. A neutralidade da rede. 5.1. A lei norte-americana. 5.2. A lei brasileira. 5.3. A lei alemã. 6. O aspecto eleitoral. 7. O exemplo polonês. 8. Conclusão. 9. Referências.


1. Introdução

A quase que onipresença das redes sociais e suas influências sobre o comportamento humano tem se mostrado tratar-se de um campo de pesquisa ainda muito pouco explorado embora esses efeitos já sejam fortemente sentidos pela sociedade. Lançar um olhar crítico acerca daqueles reflexos sobre a forma como e onde nos expressamos e quem pode ou não limitar essa fundamental característica da personalidade humana é uma necessidade premente dado os graves efeitos que abusos nessa seara podem resultar, inclusive para o próprio estado de direito.

Estabelecer, ainda que minimamente, dado o formato do presente paper, acerca de como se formou e como está, atualmente, concentrado nas mãos de poucas empresas o mercado de aplicativos que permitem a expressão e disseminação de ideias nas redes sociais e na rede mundial de computadores se mostra uma condição sine qua non quando se busca compreender quem pode controlar o direito de expressão dos cidadãos, especialmente em regimes democráticos.

A jurisdição enquanto função primordial do Poder Judiciário, não pode ser afastada, ainda que por vias implícitas, subliminares ou transversas, sob pena de se privatizar um função inarredável do Estado, segundo princípios constitucionais e a teoria clássica da divisão tripartite dos poderes.


2. A liberdade de expressão segundo as cortes supremas

2.1. Direito comparado

2.1.1. Estados Unidos da América

A liberdade de expressão como direito incorpora em seu amplo espectro conceitual as diversas formas humanas de manifestação do pensamento, assim v.g. a liberdade de pensamento político, artística, a liberdade de imprensa, a liberdade de pensamento religioso e a liberdade de associação. É altamente improvável que qualquer nação, cujo arcabouço constitucional seja desenvolvido e pregue a estrita observância dos direitos humanos em um Estado democrático de direito, não tenha se deparado em suas cortes de justiça com contendas judiciais que implicassem na contextualização material do espectro de aplicabilidade e definição da liberdade de expressão.

Num estado democrático de direito, nos parece ser, o direito à liberdade de expressão, a pedra angular de qualquer regime de governo que se diga democrático e, dentro das limitações do artigo cientifico e mesmo da brevidade do ensaio, trazer algumas linhas acerca de direito comparado, especialmente em relação à interpretação da liberdade de expressão – em seu amplo aspecto - , com foco nas decisões judiciais da Suprema Corte dos EUA, da Corte Europeia de Direitos Humanos e do Supremo Tribunal Federal do Brasil.

Nosso foco é debater as tentativas de limitaçãoa do direito à liberdade de expressão naquela que é a nova fronteira das interrelações humanas, a rede virtual de computadores, que por suas características quase que inefáveis, acabou por dar voz a todo e qualquer cidadão sobre todo e qualquer tema que lhe aprouver ou interessar, indistintamente, a qualquer momento e lugar, em formas e com eficácia antes apenas sonhadas pelos gregos defensores da democracia direta.

Se é certo que há dificuldade na delimitação do alcance desse direito, não menos assertiva é a proposição de que os diversos países divergem mais do que convergem quando se trata da aplicabilidade da previsão constitucional de liberdade de expressão contrastada com as ações típicas do gênio humano no cotidiano da vida social. Em geral, o exercício da liberdade de expressão incomoda aqueles que estão em uma determinada zona de conforto que, exatamente para manter o status quo, demandam judicialmente a limitação do exercício do direito por quem quer que possa lhe acossar a posição já pré-estabelecida, seja social, comercial, política, filosófica, artística, etc., que tinha por garantido/a e ou já delimitada.

Nos parece ser incontornável a obrigatoriedade de se iniciar a comparação legal de normas regência constitucional acerca do tema proposto pelo paradigma dos EUA. É de tal forma inescondível a projeção da doutrina e, por consequência, da jurisprudência daquele país sobre o tema em tela, que é praticamente impossível endereçá-lo cientificamente sem que se leve em alta conta as decisões de sua corte suprema.

A liberdade de expressão foi introduzida formal e constitucionalmente nos Estados Unidos com a publicação da primeira emenda, levada a cabo em razão da forte resistência nas então colônias, recém elevadas a estados federados, pela ausência de uma carta de direitos e pelo medo de que o poder federal recém criado pudesse impor ameaça aos direitos dos cidadãos, quando da promulgação da Constituição. Em face disso, a chamada “bill of rigths” entrou em vigor naquele país no dia 15 de dezembro de 1.791, vigorando, portanto, na data que este ensaio é materializado, por 229 anos ininterruptos.

Desde então, a Suprema Corte dos EUA, quando chamada a contrastar o teor da primeira emenda1, o faz com base em uma premissa de que a liberdade de expressão é absoluta e de estrita observância não só pelo legislativo federal, mas também estadual2, uma vez que não há no texto constitucional daquele país qualquer condicional para o exercício desse direito.

Nos Estados Unidos, em razão da forma de interpretação constitucional do tema relativo à liberdade de expressão, são autorizados discursos e publicações vedados em outros países com avançado sistema constitucional de proteção de liberdades individuais, como por exemplo discursos de ódio racial e negativa do holocausto, exatamente em razão da ausência de condicionais à liberdade de expressão. Por certo que o fato de estarem praticamente a um quarto de milênio sob a mesma égide constitucional garante aos Estados Unidos uma abordagem bastante consistente do tema em tela.

Porém, é certo que a maior contribuição do sistema Norte Americano é mesmo o grande número de casos enfrentados pela Suprema Corte daquele país, especialmente a partir de 1919, quando houve grande incremento3 de demandas judiciais abrangendo uma enorme variedade de temas relativos à liberdade expressão, servindo os julgados, é claro como um farol para decisões dos demais países que observam os mesmos princípios constitucionais, além de enorme fonte de debates acadêmicos que enriquecem e, ao fim e ao cabo, também integram julgamentos4.

Na Europa, todavia, o sistema judicial prevalecente é o proporcional, onde a liberdade de expressão é garantida e ao mesmo tempo limitada no art. 105, da Convenção Europeia de Direitos Humanos, cujos estatutos são de observância obrigatória pelos países europeus signatários, entre eles a Alemanha, França, Noruega, Portugal e Reino Unido.

2.1.2. Europa

Diferentemente dos EUA, a liberdade de expressão não é um direito absoluto na Europa, mas relativo e com delimitações definidas que são avaliadas caso a caso. Enquanto nos Estados Unidos não há referência quanto à potencialidade de direitos opostos à liberdade de Expressão, na Europa ela poderá ser mitigada em casos tidos como passíveis de violação da honra alheia, por exemplo.

Outra peculiaridade do sistema Europeu é que, apesar de não ser novo, a Convenção Europeia Direitos Humanos foi adotada apenas em 1953 em comparação com a 1ª emenda – bill of rigths -, de tal modo que está em vigor a 67 anos e teve seu primeiro caso apenas em 19796.

Há críticas a ambos os sistemas. Se por um lado Europeus criticam os Norte Americanosb por não sopesarem outros valores constitucionais em comparação ao direito de liberdade de expressão, uma vez que os julgamentos daquele país dissimulam muitas das complexas formas estabelecidas na Europa para contrastar esse direito, inclusive quando negam o direito à liberdade de expressão, os Norte-americanos criticam o sistema europeu, alegando que as decisões caso a caso tomadas pelas cortes europeias são de certa forma absentes de complexidade, cânones, máximas e presunções legais dado ao ainda curto espaço de tempo e volume de causas que julgam. Outra crítica contundente ao sistema europeu são as formas das decisões da Corte Europeia de Direitos Humanos, tomadas quase sempre para o caso concreto e não com espectro sistêmico além de não serem conclusivas, ou seja, há sempre margem para largas interpretações.

2.1.3. Brasil

No Brasil o Supremo Tribunal Federal, com jurisdição apenas a partir de 1988, portanto, com parcos 32 anos de existência, confronta-se constantemente com demandas que levam o tema da liberdade de expressão, tal qual se entende hodiernamente, ao plenário da Corte. Talvez em razão do longo período vivido desde a revolução constitucionalista, momento a partir do qual os brasileiros se viram totalmente desprovidos da plena liberdade de expressão78, alternando entre duas ditaduras, Vargas e Militares, com curtos e turbulentos períodos de certa liberdade democrática (1934-1937 / 1946-1967) até a redemocratização efetiva, em 1988910, o tema seja tão caro e fustigado pelos brasileiros das mais variadas matizes sociais, econômicas e políticas.

Tal qual o sistema europeu, o sistema brasileiro de liberdade de expressão é baseado na proporcionalidade11 decorrente entre o direito à liberdade de expressão e os demais direitos fundamentais constitucionais, não constituindo no Brasil, como nos EUA, o direito à liberdade de expressão um direito absoluto12, senão um direito fundamental a ser sopesado em relação aos demais direitos humanos descritos na Constituição da República.

Conquanto informe serem os direitos à liberdade de expressão passíveis de limitação, a Suprema Corte do Brasil, pelo menos até o início de 2019, vinha garantindo interpretações sistemáticas com amplo13 espectro fundamentalmente minimizando a limitação ao direito de se exprimir14. Conforme se verificará ao longo do presente artigo, essa visão maximalista1516 da liberdade de expressão vem se alterando de forma rápida desde meados de 2.019, razão basilar de materialização do presente ensaio. Neste processo crítico da posição da Suprema Corte Brasileira quanto à mitigação do direito fundamental à liberdade de expressão, buscamos contrastar o que entendemos ser a politização ou enviesamento ideológico do debate acerca do mais fundamental dos direitos democráticos – plena liberdade de expressão – não apenas sob a forma da previsão constitucional do mesmo, norte americana – absoluta - ou na forma europeia e brasileira, proporcional, mas igualmente sob a ótica da garantia do exercício do direito através dos julgados das cortes constitucionais respectivas.

Não adotamos, entretanto, como premissa da conclusão ao final esposada, qualquer preferência a quaisquer dos sistemasc acima referidos, mas buscamos finalisticamente um contraste entre os riscos advindos da subjetividade adjacente e inerente ao sopesamento de argumentos pelos juízes da Corte Suprema à limitação dos discursos e liberdades públicas, quase sempre impregnados de vieses ideológicos e ou pré-conceitos políticos17, como sói ocorrer quando se trata do julgamento de direitos político-fundamentais constitucionais e a aplicação sistemática e pouco flexível da interpretação constitucional absoluta e a segurança jurídica decorrente da imutabilidade dessa interpretação sobre o espírito do cidadão jurisdicionado. Igualmente defendemos a inafastabilidade da jurisdição Estatal, quando necessário sopesar o direito de livre expressão em face dos demais direitos fundamentais.


3. As redes sociais

3.1. Origens

A humanidade é por definição uma enorme rede social. Foi o clérigo e poeta Inglês John Donne quem melhor sintetizou a necessidade humana do contato social quando magistralmente declamou em 1.624 que “No man is an island entire of itself; every man is a piece of the continent, a part of the main; if a clod be washed away by the sea, Europe is the less, as well as if a promontory were, as well as any manner of thy friends or of thine own were; any man's death diminishes me, because I am involved in mankind. And therefore, never send to know for whom the bell tolls 18; it tolls for thee.

Da Suméria antiga, quando em Ur a humanidade começou a se reunir em tribos para colaborar para sua subsistência comum forçando a coexistência de diversas pessoas e famílias em uma mesma urbe, as bases da sociedade moderna vem evoluindo. Desde aqueles tempos imemoriais as pessoas convivem em redes sociais mais ou menos organizadas, de castas como as sacerdotais vistas desde a Suméria até o Egito antigo, às sociedades seclusivas que floresceram na dura repressão de pensamento da idade média até as redes de comunicação digital do século XX. O gênio humano não consegue permanecer isolado e não aceita limitação. O pensamento é como a água, contido encontrará um meio de se libertar, forçado, moldar-se-á sob a pressão do container, até que este se rompa em razão de sua densidade e força inatas.

A história é a mais viva prova de que o livre-pensar não pode ser contido. A revolta, expressa por meio de apotegma, arte e palavras é a essência da evolução social. Todo movimento voltado a moldar, a conter esse inexorável e torrencial influxo de indignação verbalizado, grafitado ou impresso sucumbiu fragorosamente, mais cedo ou mais tarde. A história é implacável com aqueles que buscam impor seu pensamento sobre os demais. A tolerância é a maior arma contra os excessos do pensamento, pois demonstra em razão do próprio exercício do argumento suas falhas e a necessidade da moderação para seguir-se a rota evolucionária sem maiores percalços. As amarras forçam as reações, distendendo a serenidade, acendendo a chama da revolta e reiniciando os processos de polarização como forma de auto-defesa. É certo que todo discurso extremado encerra em si mesmo seu próprio ocaso, devendo a sociedade, enquanto poder organizado não limitar esse discurso, mas expor suas próprias falhas de modo a deslegitimar perante a maioria, a adoção daquelas práticas.

O século XX foi o século da libertação do pensamento e a prova do quão danoso pode ser a imposição de uma ideologia sobre um povo. As limitações ao livre pensar e as moderações enviesadas levaram à morte milhões de pessoas, assim como libertaram outro tanto19. Nunca na história a liberdade de pensamento se fez tão necessária quanto no sombrio período que encerrou os anos de 1917 a 1989d.

É nesse contexto que, dos primórdios do desenvolvimento do primeiro computador modernoe, até o desenvolvimento da primeira rede de computadores chamada ARPANET, posteriormente denominado de DARPAf, já existiam comunidades, fechadasg, de comunicação social, embora naquele tempo pouco se parecessem com que viriam a ser nos dias atuais. Sua configuração nos moldes que as conhecemos atualmente dá-se, de forma acelerada a partir da popularização da rede mundial de computadoresh.

3.2. BBS e ICQ

Nessa época florescem as BBSi que ainda rodavam em sistemas operacionais mono-tarefaj. Com o advento dos sistemas operacionais multitarefas, especialmente o Microsoft Windows, diversos mensageiros instantâneos se propagaram. Entre eles, MIRC, AOL I.M. e, a partir de 15/11/1996 o principal deles, o Israelense ICQk. Com apenas um ano no mercado, o ICQ, em dezembro de 1997, já contava com 300.000 usuários. No início de 1998 chegava a inédita marca de 1.000.000 de usuários e, em junho de 1998, atingia a marca de 13.000.000 de usuários ativos, tendo crescido naquele semestre inicial de 1998 à incrível taxa de 1.000.000 de usuários a cada três semanas. O vertiginoso crescimento fez com que a então gigante dos meios digitais, a AOLl pagasse pela empresa a cifra de U$ 287 milhões de dólares americanos, chegando à marca de mais de 100 milhões de usuários ativos em 2010.

3.3. O MSN da Microsoft

Em meio ao crescimento do ICQ, no ano de 1999, a gigante da tecnologia, Microsoft Corporation, lançou seu próprio mensageiro, chamado de MSN. Em 1995 ela faz a integração do MSN ao Windows 95 e já na versão de 1999 nasce o MSN Messenger que, em seguida, em 2001, recebe nova interface e conversa entre usuários chegando, em 2002 a 75 milhões de usuários, evoluindo novamente em 2005 para Windows live Messenger, atingindo, em 2009, à incrível marca de 330 milhões de usuários mensais, desbancando completamente o ICQ. Em 2011, a Microsoft adquiriu o Skype, outro mensageiro instantâneo e em 2012 fundiu Skype e Windows Live Messenger, colocando um fim naquele sistema em 30/05/2013 no Brasil e por fim, no mundo em 31/10/2014 com o encerramento do MSN na china.

3.4. O Orkut

Com o crescimento dos mensageiros instantâneos, outras formas de redes sociais começaram a surgir na virada do milênio, entre elas uma que se tornou um ícone no Brasil, chamada de Orkut, cujo nome na verdade vem do seu criador, Orkut Büyükkokten20, um engenheiro de software nascido na Turquia. Em 2001 ele criou as bases do que viria a ser sua rede principal, chamada de Nexus, que basicamente era utilizada por estudantes, que podiam trocar convites, conversar e comprar e vender coisas. A Nexus, chegou a ter um máximo de dois mil usuários. Naquele início de milênio, as redes sociais, como conhecemos hoje ainda estavam engatinhando e pioneiros como Myspace21 e o Friendster22 ainda não existiam. Logo em seguida, Büyükkokten criou uma segunda rede social, desta vez denominada de Incircle, também na Universidade, Stanford23, com basicamente as mesmas funcionalidades. Em 2002, com duas propostas de trabalho, uma da Microsoft e outra da Google, que ficava perto da Universidade Stanford optou pela Alphabet24, e utilizando-se da inovação de sua gestão que garante aos seus funcionários 20% de seu tempo para trabalhar em projetos paralelos, ele desenvolveu então sua terceira rede social, aquela que conhecemos como Orkut. A Rede ficou pronta em 24 de janeiro de 2004. Inicialmente a rede permitia apenas o essencial, como adicionar amigos, enviar recados pessoais, classificar os seus amigos, pensamentos reflexivos, e só se podia entrar na rede por meio de convite.

O Orkut foi a rede social mais utilizada do Brasil, tendo inclusive seu comando transferido para cá, em razão dessa popularidade. No segundo semestre de 2004 o Brasil já tinha 700 mil cadastrados, ou 51% dos usuários totais da Rede que de tão conhecida tornou-se até letra de música popular25. Em seu auge, o Orkut chegou aos 300 milhões de usuários cadastrados no mundo todo. Porém, programas maliciosos e a ausência de segurança pesaram muito contra a rede e a concorrência com o Facebook que já havia se tornado a maior rede social do mundo, superando-a no Brasil em apenas um ano26 depois de estrear aqui, em dezembro de 2011, foram a pá-de-cal para o Orkut. Em 30 de junho de 2014 a Google anunciou o fim de sua rede.

3.5. O Facebook

Coincidentemente ao lançamento do Orkut em 24 de janeiro de 2004, em 04 de fevereiro daquele mesmo ano, estudantes da não menos prestigiosa universidade Harvard27, lançavam um site chamado “The Facebook”, dos quais, um dos idealizadores foi o brasileiro Eduardo Saverin. Em março do mesmo ano o programa ganha corpo e se expande para as universidades de Columbia e Stanford, atraindo a atenção de investidores, entre eles o do fundador do Napster, um programa que permitia o compartilhamento de músicas sem garantia de direitos autorais, Sean Parker, nessa mesma época mudam-se para Palo Alto, California. Em 2005 passa a chamar-se apenas “Facebook” e abre cadastro para estudantes do ensino médio, liberando a postagem de fotos sem restrição, com a marcação de amigos. Também em 2005 o brasileiro Saverin deixa a empresa em razão de desentendimentos com Mark Zuckerberg, o fundador do Facebook. No ano seguinte, 2006 entra no ar a versão mobile e a o feed de notícias, com atualizações dos amigos. Em 2007 o Marketplace nasce e 2008 é o ano da internacionalização da empresa. O botão curtir vem em 2009, com inauguração de um datacenter em 2010 e em 2011, com a primavera árabe, o mundo descobre a importância das redes sociais, acompanhando em tempo real os acontecimentos que até então só podiam ver com horas de atraso e através das lentes e vieses das redes de televisão e mídia impressa tradicional.

Em 2012 o Facebook adquire o Instagram, outra rede social, por um bilhão de dólares e abre seu capital na bolsa eletrônica NASDAQ28 captando nada menos que cento e quatro bilhões de dólares em capitalização de mercado, se tornando a maior abertura de capital da história da internet. No terceiro quadrimestre de 2012 a rede social atingiu a marca de um bilhão de usuários ativos e em 19/02/2014 adquiriu outra rede social de mensagem instantânea, o WhatsApp. O Facebook continua crescendo e conta atualmente com mais de dois bilhões e seiscentos milhões de usuários ativos mundo afora.

3.6. O WhatsApp

Uma das preferidas redes sociais e mensageiro instantâneo é também uma das mais novas, o WhatsApp, nascido em razão da popularização dos smartphones, especialmente o Iphone lançado em 9 de janeiro de 200729 e dos chamados SMS que custavam muito aos usuários em razão das taxas cobradas pelas companhias telefônicas. A empresa, fundada por Brian Acton e Jan Koum, derivou de um tirocínio do primeiro que ao comprar seu primeiro Iphone percebeu a necessidade dos usuários em comunicar-se, fundando em 04 de fevereiro de 2009, exatos cinco anos após a criação do Facebook, o WatsApp, também na Califórnia. Sua tecnologia, utiliza-se da internet para interligar os usuários, driblando os pacotes de SMS e o uso da rede celular, já se utilizava o Wi-fi, ou internet sem fio. Durante um tempo a guerra das Teles contra o aplicativo foi ferrenha, a ponto de querem taxá-lo30, alegando prejuízo. Venceram os usuários e as Teles perceberam que na verdade podiam até ganhar e passaram mesmo a não cobrar o uso da banda de internet via WhatsApp31. O aplicativo criou instantaneamente uma febre de usuários que queriam falar entre si sem ter de arcar com os altos custos dos SMS, cobrados por pacotes de mensagens individuais. Depois de vários investimentos e os recados por áudio, em agosto de 2013 o aplicativo chegou aos 400 milhões de usuários, fator que foi terminativo para o encerramento das atividades do MSN da Microsoft. O crescimento então, a partir de 2013 é exponencial, e o WhatsApp hoje já rivaliza com sua holding, o Facebook, em nº de usuários, tendo atingido, em março de 2020 a incrível marca de dois bilhões de usuários. O mensageiro, assim como o Orkut, caiu nas graças do Brasileiro. O Brasil é um dos maiores usuários do mundo do aplicativo, com 98% (noventa e oito por cento)32 dos smartphones brasileiros usando-o.

3.7. O Instagram

Outra rede social, também adquirida pelo Facebook e que é muito popular mundialmente, é o Instagram. Fundada pelo brasileiro Mike Rigg e o norte americano Kevin Systrom. Nascida em 2010, no primeiro dia de disponibilização de seu aplicativo milhares de downloads simultâneos ocorreram e o servidor que mantinha as fotografias não conseguiu manter o funcionamento em razão de travamentos dado ao volume de compartilhamento e uploads. Com dois meses de funcionamento o Instagram já atingia a marca de um milhão de usuários, graças à adesão de centenas de celebridades que adoraram a plataforma como base de divulgação de suas imagens. Em abril de 2012 já atingia 27 milhões de usuários despertando o interesse do Facebook que o adquiriu por um bilhão de dólares. A estrutura do Facebook fez com que o Instagram deslanchasse diversos processos internos, alavancando ainda mais o crescimento da rede social chegando aos atuais um bilhão de usuários.

3.8. O Youtube

A penúltima rede social objeto desse estudo é o Youtube, a maior plataforma de vídeos digitais do mundo, e uma das principais formas de expressão da internet mundial. Nascido em 14 de fevereiro de 2005, pelas mãos de 3 cofundadores, O Norte Americano Chad Hurley33, o Taiwanês Steve Chen e o alemão Jawed Karim. O sucesso foi imediato e já em 2006, a Alphabet comprou o site por meros $1,65bi (um bilhão seiscentos e cinquenta mil dólares). Atualmente o Youtube conta com aproximadamente 2 bilhões de usuários cadastrados, e recebe em seus servidores nada menos que 500 horas de vídeo por minuto34. Por seus canais os usuários transmitem vídeos ao vivo, tendo sido um dos principais canais digitais de demonstração do que ocorria, em tempo real, na chamada “primavera árabe”.35

3.9. O Twitter

Abordamos, por fim, o Twitter, a rede social que é tida com a mais “culta” em razão de ter entre seus usuários, jornalistas, profissionais liberais e pessoas com formação técnica nas diversas áreas do conhecimento humano. O Twitter, cujo significado quer dizer falar rápida e nervosamente, em tom alto, coisas de pouca importância ou interesse36, foi fundado em Março de 2006 por Jack Dorsey, Noah Glass, Biz Stone e Evan Williams, como um micro-blog em que as pessoas podiam postar suas ideias em até 140 caracteres. Atualmente, esse limite foi dobrado para 280 caracteres, sendo essa uma das mais marcantes características da rede social. A empresa abriu seu capital em 2013, pelo valor total de $ 31 bilhões (trinta e um bilhões de dólares). Conta atualmente com 300 milhões de usuários e se vê em uma estagnação, não conseguindo superar esse número gerando preocupações sobre a capacidade da rede social de manter-se relevante em mundo cada vez mais conectado, o Twitter aparenta ser notícia velha para as pessoas jovens.


4. Evolução da liberdade de expressão

4.1. Idade média

A livre manifestação do pensamento, é tema de extenso debate social e judicial, principalmente no mundo dito democrático, conforme já exposto acima. O que é relativamente novo é o alcance da liberdade de expressão no chamado universo on line, especialmente nas redes sociais, onde há intenso debate e, muitas vezes, verdadeiros embates entre cidadãos acerca de suas convicções, notadamente, religiosas, raciais e políticas.

É, em virtude do necessário contraponto entre esses dois universos, aparentemente diversos, que observamos acima a evolução das redes sociais, com notável foco nas companhias que dominam os aplicativos que controlam o acesso dos cidadãos ao mundo virtual. É inescondível a necessidade de se debater não apenas esse controle, concentrado nas mãos de poucas empresas, com o que o ocorreu com as empresas que controlavam a chamada mídia tradicional e com os jornais impressos, no final do Século XX. Igualmente não podemos deixar de levantar o debate acerca da repressão à publicação de impressos, desde tempos anteriores à Gutemberg, até meados do século XX e o controle imposto à tal meio de expressão em diversos países até os dias atuais.

Não intentamos debater aqui se efetivamente existiu ou não a chamada “dark ages” ou era da ignorância, na idade média, dado o cenário histórico e os vieses relativos à tal denominação37, mas efetivamente é inconteste a limitação do acesso ao conhecimento, que naqueles tempos estavam restritos basicamente ao Clero, em seus monastérios, especialmente os beneditinos e à Realeza, ainda assim, de forma restrita. Tal limitação permitiu a contenção de ideias e a manutenção de uma verdade que representava apenas a vontade de uns poucos membros da sociedade, bem como seus privilégios durante vários séculos.

4.2. Idade moderna

4.2.1. A renascença e o iluminismo

Com o tempo, mesmo diante de todas as medidas criadas para contenção do compartilhamento do conhecimento, o gênio humano acabou por suplantar as barreiras e a Renascença trouxe de volta o sopro benfazejo da expressão das ideias, de forma um tanto subliminar ainda, como a inserção do cérebro humano na capela sistina, representando o racionalismo defendido por Michelangelo38, que era grande conhecedor da anatomia humana.

A expressividade explícita ainda levava a perseguições e condenações embasadas em falsas premissas criadas para manter o status quo das classes dominantes, especialmente os supostos intelectuais, em sua maioria clérigos, como acabou por ocorrer com Galileu Galilei quando a Inquisição Católica o deteve por contrariar a tese que a terra era o centro do universo e tudo girava a seu redor. A obra que representava duro golpe nas teses da Igreja foi incluída no Index Librorum Prohibitorum 39,por atentarem contra a moral e a fé católica. Entretanto, os Países Baixos, onde a reforma protestante já havia substituído o catolicismo como fé dominante acabou por inobservar as ordens papais e publicou o livro heliocentrista de Galileu denominado Dialogo di Galileo Galilei sopra i due Massimi Sistemi del Mondo Tolemaico e Copernicano 40.

Tal obra, ainda que pensada e impressa na renascença, impactou fortemente o iluminismo, que se seguiu àquele período, onde de forma um tanto mais expressa, as ideias e pensamentos foram aflorando, embora os resquícios da manutenção dos privilégios da classe pensante, erudita, ainda que fora do clero, não tenha perdido totalmente sua força. Iluministas como Voltaire41 pregavam claramente a liberdade total de expressão. Voltaire é mais lembrado por uma frase que ele nunca disse, mas que lhe é atribuída em razão de sua biografia42 escrita por Evelyn Beatrice Hall, onde ela sumariza o pensamento do filósofo ao afirmar “Eu desaprovo o que dizeis, mas defenderei até a morte vosso direito de dizê-lo”. Entretanto, ainda que defendesse a liberdade de expressão Voltaire defendia que países mais atrasadas deveriam ser governados por Governantes aconselhados por Iluministas, em clara referência à teoria platônica de que é preferível a ignorância absoluta ao conhecimento em mãos inadequadas. Uma contradição que mostra que mesmo entre aqueles mais bem intencionados, há fortes resquícios de vaidade intelectual. Também conhecido como viés.

4.3. Contemporaneidade

Nas primeiras décadas do século XX, a liberdade de expressão já era mais generalizada, com a difusão de meios de comunicação como jornais impressos e programas radiofônicos. Entretanto, não foi antes do fim da guerra fria que a imprensa se tornou verdadeiramente livre de amarras, sejam governamentais sejam ideológicas, no chamado mundo ocidental democrático. Nesse período, já com a grande difusão de outros meios de expressão como a televisão, a música e a sétima arte representada pela cinematografia, a liberdade de expressão atingiu seu auge no mundo ocidental livre. Ainda assim, porém, mesmo agora, no século XXI, ainda há centenas de países que controlam43 a liberdade de expressão de seu povo, v.g., Coreia do Norte, China, Rússia, Cuba, Iran, Venezuela, Eritreia, Turcomenistão etc. Naquelas plagas apenas as ideias e vontade dos governantes se propagam, considerando-se que a vontade de governantes quase nunca é desacompanhada das vontades de alguns grupos empresariais ou eclesiásticos.

Também é a partir do fim da guerra fria observamos o desenvolver do meio de comunicação digital de ideias que encontra seu apogeu com a entrada em cena dos blogs virtuais, programas de mensagens instantâneas e páginas pessoais na rede mundial de computadores, conforme exposto acima. Esse novo universo digital levou a liberdade de expressão a um nível jamais visto na história humana, democratizando, verdadeiramente, o conhecimento e as opiniões. Através desse novo meio a primavera árabe se mostrou ao mundo, mesmo diante da imposição de controle estatal à mídia tradicional. Foi através da internet que o mundo conheceu a verdadeira opinião do povo líbio44, em contraste com aquela publicada na mídia controlada. A transmissão ao vivo, via internet de opiniões contrárias ao governo e a revolta de inúmeros populares fortaleceu a indignação geral e erigiu o levante à integralidade da nação derrubando um dos mais duros regimes ditatoriais então existentes. Fossem os meios digitais, controlados, houvesse o chamado filtro de conteúdo atualmente em voga, provavelmente os vídeos seriam censurados pelas próprias empresas controladoras dos aplicativos e a derrubada do ditador talvez não ocorresse. Tudo depende do viés de quem controla a informação e sua disseminação.

O que estamos testemunhando neste início da segunda década do século XXI é uma novo ciclo de perda da força da liberdade de expressão, com mais e mais governos e empresas privadas controlando a informação e o pensamento, seja para limitação da vontade popular seja para direcionamento desta. No primeiro caso, visando a manutenção de um status quo: utiliza-se do controle da informação para manutenção do poder, em clara repetição do ciclo histórico medieval e da vaidade intelectual iluminista, quando os censores adotam como justificativa dos abusos censuários, discursos embasados naquele período histórico, entretanto alterando a verdade dos fatos, utilizando-se de falsas premissas, no que Schopenhauer45 se assustaria ao se deparar com a dimensão que tomou sua dialética erística. No segundo caso, direcionamento da vontade, visa-se não apenas a manutenção de um estado de coisas, mas igualmente a alteração da realidade atual através do direcionamento da opinião popular, desta feita, ao menos, por duas formas: supressão de um pensamento e divulgação maciça de seu contrário, ambas a cargo de grandes companhias de telemática, como Cambridge Analytica, Google, Facebook e Microsoft, para citar apenas as principais. Nesse cenário, a efetiva neutralidade da rede deve ser imposta pelo Estado como meio de garantir, verdadeiramente, a livre expressão do pensamento.


5. A neutralidade da rede

Decorrência do raciocínio até aqui desenvolvido é o fato de que, estatisticamente, já há um preocupante oligopólio no mercado de tecnologia da informação e que deve ser objeto de intenso debate com fincas na exultação da necessidade de manter o ambiente digital livre de controle dessas poucas, mas gigantescas empresas, considerando que no espectro analisado, está a capacidade delas de impedir as pessoas de exporem seu livre pensar no mundo digital. Atualmente, apenas 4 empresas detêm mais de 85% de controle sobre a redes sociais mais utilizadas pelas pessoas no mundo, sendo 3 deles norte-americanas – Facebook, Microsoft e Google – e uma chinesa, Tencent46. O mesmo oligopólio ocorre nos mercados de mídia tradicional, onde, na maioria dos países, poucos grupos comandam as redes de rádio, televisão, jornais e revistas impressos. Nos EUA, apenas 5 empresas controlam todo o setor midiático local.

A concentração dos meios de comunicação tradicionais gerou um grave declínio na credibilidade das informações publicadas pelos mesmos, cuja consequência é a perda de audiência e ao fim e ao cabo ausência de fontes alternativas de notícias e dados de qualidade. O enviesamento desse meio tradicional é igualmente uma das fontes de seu atual descrédito social, aliado, é claro, à modernização dos meios de comunicação e à adoção dos smartphones como meio primordial de acesso à rede mundial de computadores e, consequentemente à informação. Entretanto, o descrédito já verificado na mídia tradicional poderá rapidamente espalhar-se pelo meio digital criando um ambiente totalmente desprovido de informações críveis para o usuário comum, gerando grande desconfiança em tudo quanto venha a ser informado, desaguando em um indesejado, ao menos para a maioria da população, ambiente de caos informacional, que poderia justificar ainda mais indesejadas medidas visando a “lei e a ordem”, através da regulação total dos meios de comunicação por governos, ou empresas, ou, ainda, ambos em associação, acabando de vez com a livre expressão do pensar.

5.1. A lei norte-americana

É nesse cenário que a necessidade de neutralidade da rede se impõe. Sem uma internet neutra, isto é, sem que seja possível impedir que as empresas que controlam os aplicativos de comunicação social, possam realizar os chamados filtros de conteúdo, a seu bel prazer, será inevitável o caos, uma vez que as pessoas deixariam de acreditar em algo que esteja sendo divulgado e que seja contrário aos seus interesses, religião, moral, costumes, religião etc., pelo simples fato de crerem tratar-se de manipulação de dados pelas chamadas Bigtechs. O debate verdadeiro, a salutar contraposição de ideias e ideais deixará de ter cabimento, uma vez que tudo parecerá ser tentativa de submissão dos leitores, participantes, integrantes, população etc. à opinião que mais pareça interessante às Bigtechs, ou quem quer que possa parecer ser beneficiado pela procedência do argumento propagado. Praticamente se põe fim à dialética Aristotélica, e implantação da ditadura do mais forte.

Os EUA regularam suas telecomunicações através do “Communications Act”, de 1934, que teve aditado sua seção 230 em 1996, através da Seção 9 do “Communications Decency Act / Section 509 of the Telecommunications Act” que estabeleceu que "Nenhum provedor ou usuário de um serviço de computador interativo deve ser tratado como editor ou locutor de qualquer informação fornecida por outro provedor de conteúdo de informação 47." Essa norma estabelece, portanto, que as empresas que proveem serviços de internet não podem ser responsabilizadas pelo conteúdo compartilhado por seus usuários, tendo em vista que não fazem a edição dos mesmos. Por outro lado, igualmente protege os mesmos provedores de serviços de telecomunicação na internet de serem responsabilizados quando eles mesmos reduzem o alcance das informações com determinado conteúdo ou simplesmente garantam meios para que terceiros o façam.

O temor geral sempre foi o de que a permissão para qualquer regulação dos serviços digitais levaria a um desnecessário controle governamental geralmente ligado a ideologias e vieses que prejudicam o livre pensar. Até pouquíssimo tempo, todo em qualquer legislador democrático, ao se deparar com normas que visavam o controle de conteúdo da internet ou o controle das empresas que proveem acesso das pessoas às plataformas ou aplicativos que permitem ao usuário expressar suas ideias, ficaria arredio à ideia ou até mesmo a rejeitaria de plano. Não mais.

5.2. A lei brasileira

No Brasil, apenas em 2014 foi aprovado o marco civil da internet, através da Lei nº 12.965/2014, que estabelece em seus arts. 18. e 19, basicamente o mesmo comando legal previsto na seção 230 da Lei Norte-americana, prevendo a responsabilização do provedor de aplicações de internet só quando este não tomar providências após a intimação judicial específica48, deixando expressamente estabelecido que tal medida visa a proteção da liberdade de expressão.

No ano de 2020, visando combater a propagação de fake news, o Senado brasileiro, acabou por aprovar o P.L.S. 2.630/2020, cuja matéria ainda depende de votação na Câmara dos Deputados, onde entre outras normas, impõe aos provedores de conteúdo e aplicações de internet a obrigatoriedade de identificação49 válida e obrigatória dos usuários, praticamente vedando o anonimato, utilizado desde os tempos de Voltaire, ou de Benjamim Franklin, que para expressar e veicular suas ideias relativas à revolução americana e escapar da censura dos jornais da época, vinculados à monarquia inglesa, utilizou-se do pseudônimo de Silence Dogood 50. O P.L.S. 2.630/2020 acaso aprovado sem ressalvas na Câmara Federal é um remédio que ao revés da cura, trará a morte ao paciente.

5.3. A lei alemã

A Neztdurchsetzungsgesetz 51, ou em tradução livre, Lei de Repressão da Rede, aprovada pelo Bundestag, a Câmara Baixa do Parlamento Alemão, em fevereiro de 2018 é a inspiração e base do P.L.S. 2.630/2020 do Senado Brasileiro e ambas tem sido seriamente questionada por Juristas, Políticos, Organizações não governamentais e a própria imprensa5253. A premier alemã, Angela Merkel, já reconheceu publicamente ser necessário “alguns” ajustes na norma aprovada de modo a efetivamente não impedir a liberdade de expressão. A NetzDG obriga os provedores de redes sociais a fornecer um sistema para lidar com reclamações sobre conteúdo ilegal. Se o conteúdo for "manifestamente" ilegal, ele deve ser bloqueado pelo provedor de rede social dentro de 24 horas. Outros conteúdos ilegais devem ser bloqueados geralmente dentro de sete dias após o recebimento de uma reclamação. O período de sete dias pode ser estendido se o usuário que postou o conteúdo tiver a chance de responder à reclamação ou se um órgão de autorregulação estiver envolvido. Conteúdo ilegal é aquele que se enquadre em tipos previstos no Código Penal Alemão, incluindo incitação ao ódio, insulto e difamação (intencional). A lei também contém uma obrigação de relatório semestral de conteúdo e um requisito para os provedores de redes sociais fora da Alemanha terem uma pessoa autorizada para receber serviços dentro da Alemanha.

O mais grave erro da Lei Alemã, assim como em seu espelho Brasileiro, o P.L.S. citado, é a terceirização do juízo acerca do que venha a ser conteúdo passível de controle social, imputando o ato de censura à empresas de tecnologia e organizações não governamentais cujas políticas internas e vieses ideológicos não são objeto de regulação pela mesma lei, garantindo, em último caso que um discurso seja vedado pelo simples fato de contrariar a ideologia da O.N.G. ou da própria empresa de tecnologia, ou pior ainda, de um técnico qualquer dessa empresa, que por questões pessoais, possa vir a discordar da ideia propagada, ferindo a liberdade de expressão com total aquiescência do Estado e sem a participação do poder judiciário, o que no Brasil fere a previsão constitucional prevista no inciso XXXV do art. 5º da CF/8854. Na Alemanha, as críticas mais severas são acerca da necessidade da NetzDG, considerando que pelo regramento55 previsto no art. 14. da Diretiva de E-commerce do Parlamento Europeu cabe aos Governos dos Estados membros, através das respectivas agências legais, a aplicação da lei penal e processamento administrativo e judicial dos provedores de conteúdo na internet, além de que a própria Lei Alemã já prever através do instituto do Störerhaftung, ou responsabilidade de interferência, o acionamento judicial dos provedores de conteúdo de internet, em casos de violação de direitos constitucionais de uma pessoa.


6. O aspecto eleitoral

Como não poderia deixar de ser, as implicações acerca da limitação da liberdade de expressão espalham-se pelos diversos vértices do prisma social humano, sendo, o eleitoral, um de seus mais visados, dado o poder de influência deste sobre os demais. É neste espectro que o discurso de controle das mídias sociais tomou maior corpo, especialmente após as eleições norte-americanas de 2016, quando a empresa chamada “Cambridge Analytica” e seus métodos de compilação da chamada big data vieram à tona, embora aquela empresa fizesse uso desses mesmos modus operandi anteriormente. O debate enveredou pela censura das redes porquanto é sempre mais interessante, àqueles que exercem o poder, o controle da opinião do que a regulação da atividade econômica. Há, mesmo nas mais maduras democracias um anseio ditatorial sempre pronto a ser despertado, especialmente se puder vir disfarçado de medidas de contenção de abusos. O falseamento da verdade é caminho escolhido por todo e qualquer regime absolutista, especialmente em sua gênese. Há sempre o discurso da proteção dos mais fracos, do benefício da maioria e da punição aos grandes. O Nazismo, v.g., iniciou-se a partir do Partido dos Trabalhadores alemães - German Workers' Party – rebatizado por Hitler como Partido Nacional Socialista Alemão, com uma política vaga e ampla, o partido prometia principalmente melhores pensões, aposentadoria e mais trabalho, numa Alemanha devastada pela primeira guerra e vendida no tratado de Versailles. Utilizando-se massiva de propaganda, Goebbels ao mesmo tempo impedia que aqueles que se opunham à visão da política nazista conseguissem se expressar de forma que impedia o público geral de tomar contato com a oposição, massificando apenas uma opinião junto à população56. Deu no que deu.

É certo que não se pode negar a influência funesta de empresas como a Cambridge Analytica em uma eleição, assim como é certo que se ela, assim como suas concorrentes, não operarem na legalidade operarão na clandestinidade; as agências governamentais de inteligência estão aí para provar que dados podem ser obtidos de qualquer forma, seja por força do Estado, seja por propinas, vazamentos57 ou até mesmo defecções58. Cercear a opinião de pessoas, limitando o que podem ou não compartilhar certamente não impedirá que empresas de big data obtenham dados dos usuários de empresas big tech, até porque não se concebe que eleitores – usuários da www – desaparecerão das redes sociais, ou simplesmente pararão de compartilhar seus dados nos respectivos aplicativos, aumentando exponencial e diariamente o volume de dados disponíveis sobre suas preferências, sociais, morais, religiosas e políticas.

A regulação, portanto, deve ser das empresas e como elas utilizam os dados do usuário, permitindo que este, que para aquelas empresas não passa de um asset, ou seja, um valor a ser negociado, possa saber para quem seus dados foram repassados, negociados ou vendidos, de tal forma que este possa igualmente receber um valor acaso tal negociação ocorra. Afinal, se a opinião importa para alguém é porque tem valor, social, político, moral, religioso, eleitoral e principalmente econômico e nesse caso, considerada a neutralidade da rede, esse valor pertence não à big tech respectiva, mas ao dono dos dados, o usuário que compartilhou. Seja lá o resultado que for obtido da negociação desses dados, eles devem ser repassados ao seu legítimo autor.

É cristalino que se caminharmos no rumo de restrições às opiniões políticas e partidárias em redes sociais ditado a partir de 2016, com a privatização da jurisdição em favor das big techs, teremos uma inconstitucional limitação da liberdade de opinião e expressão exercido por companhias privadas não investidas de múnus público para tanto. Nesse caminho toda divulgação de pensamentos, ideias e opiniões acerca do espectro eleitoral e, consequentemente, dos rumos de uma eleição seria ditado não por oficiais do Estado, devidamente eleitos e revestidos de múnus público, mas por empresas privadas com suas próprias agendas ideológicas e comerciais, totalmente dissociadas da vontade de maioria e, mais, sem legitimidade constitucional para tanto.

Num simples exercício retórico, podemos concluir, que essas companhias, ao suprimir de suas plataformas de discussão pública as opiniões que lhes são contrárias, mantendo-se apenas aquelas que se coadunam com suas próprias agendas, seja política seja comercial, estariam agindo como agentes de propaganda de seus próprios interesses, numa inescondível similaridade com o ocorrido na Alemanha dos anos 20 do século passado, desta vez, entretanto, a seleção do que se propaga é escolhida não por um agente de propaganda de um determinando partido com uma determinada agenda, mas por um algoritmo de inteligência artificial, de uma ou várias empresas, com suas próprias agendas, que por sua semelhança e função, poderia perfeitamente ser denominado de algoritmo Goebbels. Evoluiríamos de governos de pessoas totalitárias para inteligências artificial autoritária.

Mais, nas democracias consolidadas, o regime de governo é sempre cláusula pétrea nas respectivas constituições. Cabe ao povo, através dos legítimos processos de sufrágios eleitorais, a escolha daqueles que darão cumprimento ao estatuído nessas Cartas Magnas. Nesse passo, se os governos serão de esquerda, centro ou direita, ou, ainda, um misto de todos, cabe ao eleitor a escolha. O processo eletivo, conduzido dentro da garantia da máxima liberdade de expressão, opinião e ideias é o que garante a saudabilidade de um regime democrático. Ao privatizar-se a jurisdição, garantindo-se a empresas de tecnologia a prerrogativa de identificação do que é ou não é discurso vedado, seguindo seus interesses privados, o Estado omite-se, covardemente. Sem poder ditar o rumo que quer seguir, a partir da vontade de sua população, o país deixa de existir internamente, falta-lhe um dos requisitos da soberania interna. Ao delegar o controle da vontade de seu povo a um poder externo, privado, desaparece a soberania externa. A perda total da soberania é, portanto, seguindo-se o passo da privatização da jurisdição, em curso, inevitável. No caso brasileiro, a terceirização de controle de conteúdo para companhias privadas, nos moldes aqui debatidos, especialmente no que tange ao discurso político, fere o inciso V do artigo 1º da CF/88.

Não se trata, portanto, de limitar ou controlar-se o que dizem e pensam as pessoas, mas sim como as empresas coletam, tratam e comercializam os dados dos usuários em suas plataformas. Nesse campo, é preciso relembrar que já há diversas ferramentas de controle do que se pode e o que não se pode veicular em redes sociais e na internet como um todo, v.g., nos EUA é vedado a veiculação de qualquer mensagem ou conteúdo que contenha ou que esteja relacionado com pornografia infantil59, incitação à violência, com risco atual, eminente e dirigido especificamente à pessoa60, ameaça ao presidente da república, obscenidade61, direito autoral e publicidade comercial fraudulenta, fake news, assim considerada a propagação dolosa de informação sabidamente falsa62. A França, aprovou uma alteração em seu código eleitoral em dezembro de 2018, através da Lei nº 2018-120263, visando punir a propagação de fake news em períodos eleitorais, de tal forma que ao limitar a expressão, igualmente se adorna ao tema em comento. Nesse aspecto, a novel legislação francesa prevê a vedação e punição de difusão deliberada, em período eleitoral de informação que possa ser objetivamente identificada como falsa, desde que demonstrado o real perigo de afetação do resultado eleitoral, não abarcando opinião, paródia, falsidade parcial ou exageros(memes). Já no Brasil, não faltam, igualmente regramentos para conter abusos na rede, mesmo no período eleitoral, já que o próprio código eleitoral prevê a punição de crimes contra a honra e denunciação caluniosa, em seus artigos 324-327. Considerando-se, como exposto no início deste artigo que a liberdade de expressão no Brasil, não comporta a proteção a tais condutas, fica explícita a limitação da liberdade desse tipo de opinião igualmente nas redes sociais. O mesmo se diga no que tange à proteção e a dignidade sexual de crianças e adolescentes, através do ECA e da recente lei de infiltração policial na internet64 ou, ainda, a lei de combate às organizações criminosas65. Claramente, é desnecessário que se atribua ou, pior, que se aceite, sem qualquer norma legal expressa, às empresas privadas o direito de filtragem do conteúdo de opiniões de suas plataformas de comunicação ou da internet como um todo. Esse dever – de análise - é do Estado e apenas dele, mediante provocação e processamento justo, o inarredável due process of law.


7. O exemplo polonês

A Polônia, um dos países que mais sofreram com a repressão política e da liberdade de expressão do mundo, deu um passo na direção do que defendemos aqui. Por proposição do Ministro da Justiça, Zbigniew Ziobro, aquele país enviou ao parlamento uma lei denominada de “lei sobre a liberdade de expressão dos próprios pontos de vista e de pesquisa e divulgação de informações na Internet”. A lei prevê que acaso um provedor de conteúdo ou aplicativo de rede social, bloqueie uma conta, ou conteúdo publicado, o prejudicado poderá comunicar à empresa sua discordância, demonstrando não ter havido violação às leis de proteção da liberdade de expressão polonesa. A empresa terá então 24 horas para analisar a reclamação. De qualquer forma, dentro de 48 horas da reclamação, fica autorizado o usuário a protocolar diretamente na corte de justiça competente um processo eletrônico judicial que deverá ser decidido em até 7 dias. Julgado procedente o pedido, acaso a empresa não restabeleça a publicação ou o status quo da conta bloqueada, poderá ser multada em até € 1.800.000,00(um milhão e oitocentos mil euros). Para as autoridades polonesas, o arbitramento judicial das diferenças retira da equação a sobrepujança de uma maioria sobre uma minoria, de tal forma que não se poderá retirar um discurso, uma ideia, propaganda ou opinião da rede, apenas em razão de ser contra majoritária. Para tanto, é necessário que haja a violação das respectivas lei polonesas, ficando a cargo de uma corte judicial, dizer se cabe ou não a censura.

Na Polônia não haverá privatização da jurisdição sobre a liberdade de expressão na internet. As eleições ali serão travadas sob o livre manto da liberdade de expressão, sem patrulha ideológica de quem quer que seja, especialmente dos interesses privados das grandes companhias de tecnologia e suas obscuras agendas ideológicas e comerciais.


Conclusão

Manipulação da informação, alteração da verdade, ou simplesmente fake news, é uma prática que deve ser combatida, mas, com muito mais ênfase, deve ser defendido o direito à livre manifestação do pensamento e exposição de ideias. Não podemos aceitar que, em nome do combate à um mal, como efetivamente é a alteração da verdade, dê-se vazão a um leviatã, não na forma pensada por Hobbes, mas muito pior, privado.

Se há grandes diferenças acerca da extensão da liberdade de expressão, quase que absoluta como querem os norte-americanos ou relativa como defendem europeus e brasileiros, o fato é que, em nenhuma grande democracia, se abre mão desse fundamental direito do homem.

Também não passa desapercebida a grande dominação dos meios de comunicação, sejam tradicionais sejam os mais recentes, por poucas e poderosíssimas corporações cujos interesses são guardados a sete chaves e longe da transparência pública.

Faz muito pouco tempo que a maioria das pessoas tem oportunidade de ter acesso quase que ilimitadamente ao conhecimento e à opinião. Restringir a disseminação do livre pensar, falar e idealizar no mundo digital, da forma como se vem prevendo no P.L.S. 2630/2020 e suas inspirações internacionais, além de representar uma privatização da jurisdição, revive o infame Index Librorum Prohibitorum em sua forma virtual, dá se nova vida ao meios nazistas de controle de difusão e controle de propaganda, além de se criar um leviatã privado, que será impossível de ser controlado.

Não se pode permitir que empresas privadas controlem ou se arvorem no direito de dizer o que é e o que não é ilegal. Esse é um direito inarredável da jurisdição e uma das funções constitucionais do poder judiciário. Nesse cenário, a lei polonesa, citada acima, deve servir de inspiração para o Brasil, de modo a garantir-se não apenas a liberdade de livre manifestação em qualquer ambiente, físico ou virtual, mas igualmente de se coibir a circulação de notícias falsamente alteradas.

Fake news é grave quando implica na violação de tipos penais e especialmente quando veiculada massivamente por meios digitais. São a verdade, a transparência a publicidade e a educação, que levam ao desmascaramento público e a consequente reprovação do malfeitor as principais armas para se combater as fake news. Ainda, é importante salientar que essa prática deve ser proporcionalmente sopesada, para que não se atente contra a própria natureza humana e dois de seus maiores defeitos, o invejar e o mentir, que têm estado presentes desde que o homem se entendeu por homem, ou como querem os criacionistas, desde Abel e Caim. Não desaparecerão tão cedo, não importa a lei ou punição que se crie. Os regimes ditatoriais mais cruéis não foram capazes de extirpá-las. Proporcionalidade, reforço da defesa da liberdade de pensamento e combate aos delitos virtuais, conforme se vê, não são auto repelentes, podem e devem conviver perfeitamente em um arcabouço jurídico amplo e compreensivo onde quem aplica o direito é o Estado, através do poder judiciário e apenas por ele.


Referências

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Glossário

a Por governos em suas diversas funções – executivo, legislativo e judiciário.

b Norte Americanos no contexto deste artigo serão sempre os estadunidenses.

c Não podemos, entretanto, deixar de anotar nossa predileção pela aplicabilidade sem limitações da liberdade de expressão, a não ser quanto à mitigação do discurso que ao fim e ao cabo de seu exercício, resulte num atendado contra o próprio direito em testilha.

d Início da revolução russa e queda do muro de Berlim.

e Electronic Numerical Integrator And Computer ou simplesmente ENIAC, de 1946.

f Defense Advanced Research Projects Agency ou em livre tradução Agência de Projetos de Pesquisa Avançada de Defesa.

g Laboratórios já tinham redes não listadas onde não apenas trocavam dados de pesquisa, mas conversas, ainda insipientes acerca de trivialidades cotidianas, como a CTSS(Compatible Time-Shraring System) da universidade M.I.T.(Massachusetts Institute of Technology), que permitia até 30 usuários conectados simultaneamente.

h A chamada WWW, que é a abreviação para World Wide Web, essencialmente desenvolvida por Tim Berners-Lee e Robert Cailliau, que em 12/03/1989 fez o primeiro acesso via internet do mundo, a partir de uma tecnologia desenvolvida por Lee que integrava os antigos hipertextos já desenvolvidos no projeto Xanadu de autoria de Theodor Holm Nelson na década de 1960 com a internet, criando o hiperlink através do uso da URI, permitindo o acesso a documentos disponibilizados naquela rede, sem a necessidade de interação do autor do documento, já que o mesmo estaria armazenado no servidor WEB, encerrando o problema da hiperligação quebrada que se dava quando havia tentativa de acesso ao hipertexto em um local que não estava disponível “on”. Lee desenvolveu também o primeiro navegador de internet o WorldWideWeb que foi disponibilizado gratuitamente. O desenvolvimento da teconologia deu-se enquanto Lee trabalhava no CERN (Organisation Européenne pour la Recherche Nucléaire), ainda na década de 80 e em razão dessa peculiaridade essa mesma organização em 30/04/1993 anunciou que a World Wide Web seria livre para todos e sem custo, dando início à maior revolução e meio de evolução tecnológica da história.

i Bulletin board system.

j Como o MS DOS (Microsoft Disk Operational System).

k A pronúncia do nome em inglês seria uma variação da expressão verbal das letras e se pronunciaria algo como “I seek you”, ou “eu sigo você” em tradução livre.

l AOL – America On Line, então o maior provedor de acesso e conteúdo de internet dos Estados Unidos da América.


Notas

1Congress shall make no law respecting an establishment of religion, or prohibiting the free exercise thereof; or abridging the freedom of speech, or of the press; or the right of the people peaceably to assemble, and to petition the Government for a redress of grievances” Tradução Livre: “O Congresso não fará lei relativa ao estabelecimento de religião ou proibindo o livre exercício desta, ou restringindo a liberdade de discurso ou de imprensa, ou o direito do povo de reunir-se pacificamente e dirigir petições ao governo para a reparação de seus queixas”.

2 Em virtude da décima quarta emenda a Suprema Corte decidiu que a primeira emenda é de observância obrigatória também pelos Estados Federados embora mencione apenas “Congresso” em seu texto. A decisão foi proferida no caso Cantwell v. Connecticut, 310 U.S. 296. (1940). Em suma, três testemunhas de Jeová, Newton Cantwell e seus dois filhos foram acusados de violar três leis do Estado de Connecticut, entre elas uma por violação da paz. Condenados em primeira instância, apelaram para Corte Suprema do Estado de Connecticut onde novamente perderam, embora tenha obtido êxito em alguns dos pedidos. Entretanto na apelação alegaram que não haveria como serem condenados de uma das acusações sem que lhes fosse negado o direito à liberdade de expressão religiosa. Em razão da matéria, a Suprema Corte Americana avocou para si a jurisdição, vez que o julgamento estatuiria a validade de disposição de lei estadual sobre texto da constituição federal e acabou por declarar nula a condenação, neste particular, além de, por decorrência lógica, estender a obrigatoriedade de observância da primeira emenda por todos os estados federados.

3 Schenck v. United States, 249 U.S. 47. (1919).

4 A Suprema Corte Americana adota “testes” para contrastar os fatos ao direito previsto na 1ª emenda. Até o início do Século XX, por volta dos anos 20, a Corte aplicava o teste utilizado pela Suprema Corte Britânica denominado de Bad Tendency Test, esse teste prevê que, quando os fatos indicam que o comunicador pretendia um resultado proibido pela lei, o tribunal pode, razoavelmente, presumir que o discurso teria uma tendência a produzir aquele resultado, então, com base nessa tendência, a corte pode punir o comunicador por violação da lei. Por exemplo, se o ativista incita os conscritos a resistir ao recrutamento militar e se há lei criminalizando tal descumprimento, os juízes podem legitimamente concluir que o discurso tem a tendência de encorajar violações da lei e, portanto, condenar o ativista. Em contraste, o Juiz Oliver Wendell Holmes Jr. (Holmes), introduziu no julgamento Schenck v. United States, 249 U.S. 47. (1919), o teste o teste “clear and present danger”, o qual só viria a ser adotado pela Corte em 1937 no caso Herndon v. Lowry, 301 U.S. 242. (1937), quando o Juiz Owen J. Roberts, o aplicou em razão de que, em contraste com o “bad tendency test”, este propõe distinções a serem aplicadas aos discurso do comunicador com base nas circunstâncias, afirmando, por exemplo, que um discurso em tempos de guerra difere, em seu resultado, do mesmo discurso em tempos de paz, criando assim uma doutrina que igualmente foi suplantada – à excessão das cortes militares - pela doutrina “imminent Lawless action”, que analisa se o discurso analisado efetivamente prega uma desordem iminente. Esse teste foi aplicado no caso Brandenburg v. Ohio (1969), onde um membro da Klu Klux Klan havia sido condenado por incitar um discurso de ódio no qual pregava a supremacia branca. A Suprema Corte de Ohio negou o apelo de Brandenburg, estatuindo que não havia no caso questão constitucional substancial, a qual foi reconhecida pela Suprema Corte Americana, que ao fim e ao cabo acabou por estabelecer que o discurso que defende uma conduta ilegal é protegido pela Primeira Emenda, a menos que esse discurso incite uma “ação ilegal iminente”.

5 Tradução Oficial. ARTICLE 10º - Liberdade de expressão 1. Qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de transmitir informações ou ideias sem que possa haver ingerência de quaisquer autoridades públicas e sem considerações de fronteiras. O presente artigo não impede que os Estados submetam as empresas de radiodifusão, de cinematografia ou de televisão a um regime de autorização prévia. 2. O exercício destas liberdades, porquanto implica deveres e responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas pela lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a integridade territorial ou a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a proteção da saúde ou da moral, a protecção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais, ou para garantir a autoridade e a imparcialidade do poder judicial. In https://www.echr.coe.int/Documents/Convention_POR.pdf .

6 (1979) 2 EHRR 245.

7 A Constituição do Império(25/03/1.824), trazia em seu art. 179, IV e V as seguintes disposições: Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Políticos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte. [...] IV. Todos podem communicar os seus pensamentos, por palavras, escriptos, e publical-os pela Imprensa, sem dependencia de censura; com tanto que hajam de responder pelos abusos, que commetterem no exercicio deste Direito, nos casos, e pela fórma, que a Lei determinar. V. Ninguem póde ser perseguido por motivo de Religião, uma vez que respeite a do Estado, e não offenda a Moral Publica.

8 Já a 1ª Constituição da República(24/02/1.891), previa em seu art. 72, §§ 3º, 8º, 12, previa o pleno gozo da liberdade religiosa, associação e expressão, nos seguintes termos: Art.72 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes: [...] § 3º Todos os individuos e confissões religiosas podem exercer publica e livremente o seu culto, associando-se para esse fim e adquirindo bens, observadas as disposições do direito commum. § 8º A todos é licito associarem-se e reunirem-se livremente e sem armas, não podendo intervir a policia senão para manter a ordem publica. § 12. Em qualquer assumpto é livre a manifestação do pensamento pela imprensa ou pela tribuna, sem dependencia de censura, respondendo cada um pelos abusos que commetter, nos casos e pela fórma que a lei determinar. Não é permittido o anonymato. (Redação dada pela Emenda Constitucional de 3 de setembro de 1926).

9 A denominada Constituição Cidadã (05/10/1.988), trouxe de volta a liberdade de expressão, mantendo em certa medida o sistema proporcional traçado nas constituições pós revolução constitucionalista, mas trouxe também diversos outros direitos que mitigaram sobremaneira a possibilidade de restrição ao exercício desse direito. Nesse aspecto preveem os art. 5º, IV, VI, IX, XVI e XVII, 168, VII e 220 da CF/88: Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei; IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente; XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; Art. 168. [...] VII - é garantida a liberdade de cátedra. Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. § 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

10 1934(segunda república), 1937(Estado Novo-outorgada), 1946, 1967(regime militar) e 1988(redemocratização).

11 Ação direta de inconstitucionalidade. Parágrafo 1º do art. 28. da Lei 12.663/2012 ("Lei Geral da Copa"). Violação da liberdade de expressão. Inexistência. Aplicação do princípio da proporcionalidade. Juízo de ponderação do legislador para limitar manifestações que tenderiam a gerar maiores conflitos e atentar contra a segurança dos participantes de evento de grande porte. [ADI 5.136 MC, rel. min. Gilmar Mendes, j. 1º-7-2014, P, DJE de 30-10-2014.].

12 Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. O direito à livre expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria CF (art. 5º, § 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo", dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica. [HC 82.424, rel. p/ o ac. min. Maurício Corrêa, j. 17-9-2003, P, DJ de 19-3-2004.].

13 A Democracia não existirá e a livre participação política não florescerá onde a liberdade de expressão for ceifada, pois esta constitui condição essencial ao pluralismo de ideias, que por sua vez é um valor estruturante para o salutar funcionamento do sistema democrático. A livre discussão, a ampla participação política e o princípio democrático estão interligados com a liberdade de expressão, tendo por objeto não somente a proteção de pensamentos e ideias, mas também opiniões, crenças, realização de juízo de valor e críticas a agentes públicos, no sentido de garantir a real participação dos cidadãos na vida coletiva. São inconstitucionais os dispositivos legais que tenham a nítida finalidade de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico, indispensável ao regime democrático. Impossibilidade de restrição, subordinação ou forçosa adequação programática da liberdade de expressão a mandamentos normativos cerceadores durante o período eleitoral. Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma Democracia representativa somente se fortalecem em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das mais variadas opiniões sobre os governantes. O direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias. Ressalte-se que, mesmo as declarações errôneas, estão sob a guarda dessa garantia constitucional. Ação procedente para declarar a inconstitucionalidade dos incisos II e III (na parte impugnada) do artigo 45 da Lei 9.504/1997, bem como, por arrastamento, dos parágrafos 4º e 5º do referido artigo. [ADI 4.451, rel. min. Alexandre de Moraes, j. 21-6-2018, P, DJE de 6-3-2019.].

14 O Plenário referendou, com efeito vinculante e eficácia contra todos, decisão monocrática que, em arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), suspendeu os efeitos de atos judiciais ou administrativos emanados de autoridade pública que possibilitem, determinem ou promovam o ingresso de agentes públicos em universidades públicas e privadas, o recolhimento de documentos, a interrupção de aulas, debates ou manifestações de docentes e discentes universitários, a atividade disciplinar docente e discente e a coleta irregular de depoimentos desses cidadãos pela prática de manifestação livre de ideias e divulgação do pensamento em ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de universidades públicas e privadas e serventes a seus fins e desempenhos. (...) A finalidade do art. 37. da Lei 9.504/1997, que regulamenta a propaganda eleitoral e impõe proibição de alguns comportamentos em períodos que especifica, é a de impedir o abuso do poder econômico e político e de preservar a igualdade entre os candidatos no processo. A norma visa resguardar a liberdade do cidadão, o amplo acesso às informações, para que ele decida conforme sua livre convicção, sem cerceamento direto ou indireto a seu direito de escolha. A vedação por ela estabelecida possui a finalidade específica de lisura do processo eleitoral. O que não estiver dentro dos limites dessa finalidade e, diversamente, atingir a livre manifestação do cidadão não se afina com a teleologia da norma eleitoral nem com os princípios constitucionais garantidores da liberdade de pensamento, manifestação, informação, ensino e aprendizagem. Portanto, as providências judiciais e administrativas impugnadas na ADPF, além de ferir o princípio garantidor de todas as formas de manifestação da liberdade, desrespeitam a autonomia das universidades e a liberdade dos docentes e discentes. As condutas limitadas pelos atos questionados restringem não os direitos dos candidatos, mas o livre pensar dos cidadãos. [ADPF 548 MC REF, rel. min. Cármen Lúcia, j. 31-10-2018, P, Informativo 922.].

15 A liberdade religiosa não é exercível apenas em privado, mas também no espaço público, e inclui o direito de tentar convencer os outros, por meio do ensinamento, a mudar de religião. O discurso proselitista é, pois, inerente à liberdade de expressão religiosa. (...) A liberdade política pressupõe a livre manifestação do pensamento e a formulação de discurso persuasivo e o uso de argumentos críticos. Consenso e debate público informado pressupõem a livre troca de ideias e não apenas a divulgação de informações. O artigo 220 da Constituição Federal expressamente consagra a liberdade de expressão sob qualquer forma, processo ou veículo, hipótese que inclui o serviço de radiodifusão comunitária. Viola a Constituição Federal a proibição de veiculação de discurso proselitista em serviço de radiodifusão comunitária. [ADI 2.566, rel. p/ o ac. min. Edson Fachin, j. 16-5-2018, P, DJE de 23-10-2018.].

16 A liberdade religiosa e a de expressão constituem elementos fundantes da ordem constitucional e devem ser exercidas com observância dos demais direitos e garantias fundamentais, não alcançando, nessa ótica, condutas reveladoras de discriminação. No que toca especificamente à liberdade de expressão religiosa, cumpre reconhecer, nas hipóteses de religiões que se alçam a universais, que o discurso proselitista é da essência de seu integral exercício. De tal modo, a finalidade de alcançar o outro, mediante persuasão, configura comportamento intrínseco a religiões de tal natureza. Para a consecução de tal objetivo, não se revela ilícito, por si só, a comparação entre diversas religiões, inclusive com explicitação de certa hierarquização ou animosidade entre elas. O discurso discriminatório criminoso somente se materializa após ultrapassadas três etapas indispensáveis. Uma de caráter cognitivo, em que atestada a desigualdade entre grupos e/ou indivíduos; outra de viés valorativo, em que se assenta suposta relação de superioridade entre eles; e, por fim, uma terceira, em que o agente, a partir das fases anteriores, supõe legítima a dominação, exploração, escravização, eliminação, supressão ou redução de direitos fundamentais do diferente que compreende inferior. A discriminação não libera consequências jurídicas negativas, especialmente no âmbito penal, na hipótese em que as etapas iniciais de desigualação desembocam na suposta prestação de auxílio ao grupo ou indivíduo que, na percepção do agente, encontrar-se-ia em situação desfavorável. Hipótese concreta em que o paciente, por meio de publicação em livro, incita a comunidade católica a empreender resgate religioso direcionado à salvação de adeptos do espiritismo, em atitude que, a despeito de considerar inferiores os praticantes de fé distinta, o faz sem sinalização de violência, dominação, exploração, escravização, eliminação, supressão ou redução de direitos fundamentais. Conduta que, embora intolerante, pedante e prepotente, se insere no cenário do embate entre religiões e decorrente da liberdade de proselitismo, essencial ao exercício, em sua inteireza, da liberdade de expressão religiosa. Impossibilidade, sob o ângulo da tipicidade conglobante, que conduta autorizada pelo ordenamento jurídico legitime a intervenção do direito penal.] [RHC 134.682, rel. min. Edson Fachin, j. 29-11-2016, 1ª T, DJE de 29-8-2017.] Vide ADI 2.566, rel. p/ o ac. min. Edson Fachin, j. 16-5-2018, P, DJE de 23-10-2018.

17 O STF é órgão cuja natureza jurídica é de Suprema Corte híbrida, uma vez que sua atuação envolve não só o exercício dos controles concentrado e abstrato de constitucionalidade de leis e demais atos normativos do poder dirigente, como ainda outras atribuições que não se relacionam ou que o fazem apenas indiretamente com o contencioso constitucional propriamente dito. SANTOS, Felipe Almeida Garcia. Supremo Tribunal Federal e sua natureza jurídica: corte constitucional ou órgão de cúpula do judiciário brasileiro? Disponível em https://www.fasb.edu.br/revista/index.php/campojuridico/article/download/184/221 . Acesso em 25/08/2020.

18 In Devotions Upon Emergent Occasions, and several steps in my Sickness, Domínio Público. Tradução livre: “Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra; se um torrão é arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa dos teus amigos ou a tua própria; a morte de qualquer homem diminui-me, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti.”.

19 Foram, indiscutivelmente, o medo da opressão cultural e ideológica aliados ao fim da liberdade de ir e vir quem mais justificaram a reação Inglesa às investidas do Reich Alemão liderados por Adolf Hitler e seu propagandista mor, Joseph Goebbels. Winston Churchill, ainda no período entre guerras já alertava a Inglaterra para os perigos da propaganda Nazista e suas práticas pouco democráticas, temor que mostrou-se concreto quando da invasão da Polônia e início do mais obscuro capítulo da história.

20 https://pt.wikipedia.org/wiki/Orkut_B%C3%BCy%C3%BCkk%C3%B6kten

21 https://myspace.com/

22 https://www.cbsnews.com/pictures/then-and-now-a-history-of-social-networking-sites/4/

23 https://www.stanford.edu/

24 https://www.nasdaq.com/market-activity/stocks/googl

25 https://www.youtube.com/watch?v=6UZQN9vToi8

26 https://readwrite.com/2012/01/19/it_only_took_one_year_for_facebook_to_beat_orkut_in_brazil/

27 https://www.harvard.edu/

28 https://money.cnn.com/2012/05/18/technology/facebook-ipo-trading/index.htm

29 https://www.history.com/this-day-in-history/steve-jobs-debuts-the-iphone

30 https://www.uol.com.br/tilt/noticias/redacao/2015/08/24/frustradas-com-prejuizos-operadoras-tentam-se-vingar-de-whatsapp.htm

31 https://www.vivo.com.br/para-voce/produtos-e-servicos/para-o-celular/ofertas?gclid=Cj0KCQjwzbv7BRDIARIsAM-A6-1urqZmzirXlA4IYYaT6cn3C8AmYGdpqNJsB3CfiNYVYfZM82nzanQaApcpEALw_wcB&gclsrc=aw.ds

32 https://www.statista.com/statistics/798131/brazil-use-mobile-messaging-apps/

33 https://www.businessinsider.com/youtube-early-employees-list-steve-chen-chad-hurley-2020-5

34 https://blog.hootsuite.com/youtube-stats-marketers/#user

35 Idem 46

36 https://dictionary.cambridge.org/pt/dicionario/ingles/twitter

37 Notadamente Francesco Petrarca, que via a Grécia antiga e Roma como o pináculo da civilização humana

38 Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni (Caprese, 6 de março de 1475 — Roma, 18 de fevereiro de 1564)

39 O Index Librorum Prohibitorum, índice de literatura proibida pelo autoridade máxima da Igreja Católica Romana, https://www.britannica.com/topic/Index-Librorum-Prohibitorum , permaneceu sendo publicado até o ano de 1966

40 Diálogo sobre os dois principais sistemas do mundo

41 François-Marie Arouet.

42 Os Amigos de Voltaire. https://www.amazon.com.br/Friends-Voltaire-Evelyn-Beatrice-Hall/dp/198033255X

43 https://www.article19.org/gxr2020/

44 https://operamundi.uol.com.br/politica-e-economia/18943/redes-sociais-foram-o-combustivel-para-as-revolucoes-no-mundo-arabe

45 Arthur Schopenhauer (Danzig, 22 de fevereiro de 1788 — Frankfurt, 21 de setembro de 1860)

46 47 Tradução Livre do original: "No provider or user of an interactive computer service shall be treated as the publisher or speaker of any information provided by another information content provider."

48 Art. 19: Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.

49 https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/06/30/aprovado-projeto-de-combate-a-noticias-falsas

50 51 https://www.buzer.de/index.htm

52 https://www.spiegel.de/netzwelt/netzpolitik/heiko-maas-und-facebook-das-netzdg-ist-erst-der-anfang-die-analyse-a-1155222.html

53 https://medium.com/@isabelguigui/peering-into-the-void-on-the-power-of-politics-on-the-internet-and-the-urgency-of-creating-law-to-a9a6caef9781

54 XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito

55 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/TXT/PDF/?uri=CELEX:32000L0031&from=en

56 https://www.bbc.co.uk/bitesize/guides/zsrwjxs/revision/7

57 https://www.usatoday.com/story/news/2017/03/07/what-wikileaks/98853896/

58 https://www.bbc.com/news/world-us-canada-23123964

59 Children's Internet Protection Act (CHIPA)

60 Chaplinsky v New Hampshire, SCOTUS, 1942

61 Miller x California – Miller Test - , 1973

62 Mens rea

63 Artigo L. 163-2- I. Durante os três meses anteriores ao primeiro dia do mês das eleições gerais e até a data da votação em que são adquiridos, quando as alegações ou imputações imprecisas ou enganosas de um fato que pode alterar a sinceridade da próxima votação são disseminados de forma deliberada, artificial ou automatizada e massiva por meio de um serviço de comunicação online ao público, podendo o juiz sumário, a pedido do promotor público, qualquer candidato, partido ou grupo político ou qualquer interessado em agir, e sem prejuízo da indenização do dano sofrido, prescreve para pessoas físicas ou jurídicas 2 citado no 2º I do artigo 6º da lei n ° 2004- 575 de 21 de junho de 2004 para a confiança na economia digital ou, na sua falta, para qualquer pessoa mencionada em 1 do mesmo I todas as medidas proporcionais e necessárias para pare esta transmissão

64 Lei 13.441

65 Lei 12.850


Abstract: The paper aims to analyze freedom of expression from the perspective of at least three distinct systems, the North American, the European and the Brazilian, as well as the impact of these various ways of applying freedom of expression when conveyed in the novel digital technology called "social networks". We look for to contrast the various forms of application resulting from the three systems, seeking a way to better weigh and guarantee the fundamental right to free expression of thought as the purest form of nourishing the feeling of freedom inherent to democracy while legitimate form of government, considering the constitutional statement that all power comes from the people. In this matter, to allow a better contrast, the origins of this new form of communication are sought, delimiting full freedom of expression in its beginnings and the various attempts to amputate that same freedom, especially in the second decade of the 21st century. A parallel is also sought between what happened with the written press between its birth and maturity to contrast the innocuousness of limiting a fundamental right such as free expression of thought. In the end, it seeks to demonstrate the seriousness of such attacks against free thinking for the democratic system of government, considering, specially, the mitigation of the electoral discourse, and the attribution to the large technology companies of the right to mitigate ideas and speeches on their digital platforms, in what we call it the privatization of jurisdiction, fundamentally changing the concept of democracy and, hyperbolically, resulting in the effective deconstruction of the democratic regime inscribed in the Federal Constitution. The deductive method was the conductive line of this research, based on reading bibliographical, documentary, and legislative sources.

Key words: Freedom of expression. Privatization of jurisdiction. Fundamental rights. Democratic regime.


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