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O trabalho escravo contemporâneo no sudeste paraense: uma análise das sentenças criminais

O trabalho escravo contemporâneo no sudeste paraense: uma análise das sentenças criminais

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Principais aspectos relacionados ao trabalho escravo contemporâneo no sudeste paraense, a partir de dados fornecidos pela Subseção Judiciária de Marabá/PA, vinculada ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, entre 2013 e 2016.

O presente artigo analisa as sentenças que versam sobre trabalho escravo no período de 2013 a 2016, fornecidas pela Subseção Judiciária de Marabá/PA, vinculada ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Discute que o crime de trabalho escravo, previsto no artigo 149, do Código Penal brasileiro, é sobretudo um crime contra a humanidade, rechaçado pela comunidade internacional em virtude da grave violação à dignidade da pessoa humana. A pesquisa identificou a dificuldade dos magistrados em caracterizar o crime de trabalho escravo com base no fenômeno social que ocorre na região Amazônica, em especial, no sudeste paraense. Propõe que a máxima efetivação dos direitos humanos no estado brasileiro perpassa o enfrentamento das violações à dignidade da pessoa humana no âmbito criminal, principalmente em 1ª instância.

Introdução 

O Brasil é referência mundial no combate ao trabalho escravo, apesar de diversos problemas internos superados e desafios ainda a enfrentar. Em 2013, o Brasil aparece, ao lado das Filipinas, como um dos países referência em iniciativas em todo mundo, conforme o relatório “The Global Slavery Index”, da organização não governamental Walk Free, sediada na Inglaterra (3). As inciativas do estado brasileiro também são elogiadas pelas OIT- Organização Internacional do Trabalho, principalmente no tocante à ação dos grupos especiais de fiscalização

A estrutura de proteção criada pelo estado brasileiro, que o torna diferenciado de muitos países, é resultado de pressão interna, mas é também uma resposta à comunidade internacional. Na década de 90 do século XX, várias denúncias foram levadas ao exterior pela Comissão Pastoral da Terra-CPT e Ong´s Center for Justice and International Law (CEJIL –Centro pela Justiça e o Direito Internacional) e Human Rights Watch, produzindo repercussão no cenário internacional.

Em 2015, o Ministério do Trabalho e Emprego chegou ao expressivo número de quase 50 mil trabalhadores submetidos a condições de trabalho análogas à escravidão alcançados por suas fiscalizações (ao longo de 20 anos). Ao estabelecer novas condições institucionais para acolhê-los socialmente, amplia um processo de sensibilização social e incentivo a um ambiente institucional e cultural capaz de prevenir e constranger essas práticas, sobretudo pelo resgate da condição digna do trabalhador, retirando-o da invisibilidade e da vulnerabilidade que tantas vezes o sujeitam ou expõem a outras situações de exploração social ou trabalhista(4). Em contraponto com essa realidade, as condenações internas no âmbito criminal referente ao delito de “reduzir alguém à condição análoga de escravo” não correspondem ao mesmo volume de libertações.

Ainda são tímidas as condenações nesse âmbito no estado do Pará, principalmente no sudeste paraense, onde existe um grande foco de casos de exploração de trabalhadores.

O Pará figura entre os estados brasileiros com maior ocorrência de trabalho escravo contemporâneo no mapa da violência (5). Situa-se aqui uma grande quantidade de homicídios, principalmente envolvendo trabalhadores, o que tem gerado destaque nos tribunais internacionais, como a condenação ocorrida em 2016 pela Corte Interamericana de Direitos Humanos- CIDH, que responsabilizou internacionalmente o Estado brasileiro por não prevenir e não reprimir a prática de trabalho escravo moderno e de tráfico de pessoas. O processo envolvendo 128 trabalhadores da Fazenda Brasil Verde, situada em Sapucaia/PA, durou cerca de três anos. O Brasil é o primeiro país condenado pela OEA nessa matéria. Outro caso de repercussão na OEA foi a do trabalhador José Pereira, da Fazenda Espirito Santo, localizada em Sapucaia/Pará, levado a CIDH em 22.02.1994. 

Por meio da pesquisa, constatou-se que a concepção do delito de trabalho escravo e, consequentemente, a sua caracterização, é um dos fundamentos recorrentes nas absolvições. Ainda persiste a ideia de trabalho escravo ligado à restrição à liberdade, como na época da escravidão negra. Amparado nisso, muitos magistrados, quando se deparam com os relatórios dos auditores fiscais, identificam as situações ali descritas como mera infração trabalhista, sendo, portanto, desnecessária o reconhecimento da prática delituosa, afastando o tipo penal. Não se constata uma interpretação baseada no princípio da dignidade humana, tão elevado nos diplomas internacionais e também no ordenamento jurídico brasileiro, mas sem destaque nos tribunais criminais. Esse foi um dos pontos bastante abordado na sentença da CIDH que condenou o Brasil no caso da Fazenda Brasil verde. 

A pesquisa teve acesso a 41 sentenças de 1ª instância do âmbito criminal da subseção judiciária de Marabá, vinculadas ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região- TRF1, do período de 2013 a 2016. O método utilizado foi a combinação da pesquisa bibliográfica, pesquisa quantitativa e análise documental por amostragem.

O referido artigo se estruturou da seguinte forma: a seção 2 aborda o conceito de trabalho escravo na Amazônia, a seção 3 discute a caracterização do trabalho escravo a partir da lógica implementada pelos direitos humanos. A seção 4 traz uma análise das sentenças criminais e, por fim no item seguinte são presentadas as considerações finais.


2. A Escravidão contemporânea na Amazônia 

A utilização de mão-de-obra escrava na Amazônia remonta às primeiras atividades econômicas desenvolvidas. Seja pela exploração dos nativos (índios e caboclos) ou dos milhares de trabalhadores, principalmente oriundos do Nordeste e Centro-oeste, atraídos pelas promessas e perspectivas de vida melhor, sobretudo na época áurea da borracha, no final do século XIX. Nessa época, a Amazônia ostentava o status de uma das maiores exportadoras de látex para o mundo. Os seringueiros enfrentavam diariamente os percalços de adentrar na floresta para extração da borracha, vitimados pela malária e o endividamento permanente, sob a prática do aviamento (6) , submetiam-se à condição análoga a de escravo.

Consoante análise do professor José de Souza Martins, “o trabalho análogo nos dias atuais, deve ser apreendido a partir da década de 40, com a expansão da fronteira agrícola, quando a Amazônia transformou-se num imenso cenário de ocupação territorial massiva, violenta e rápida” (MARTINS, 2009:74).

O grande impulso a essa migração ocorreu a partir dos governos militares, com a transformação da Superintendência do Plano de Valorização da Amazônia (SPVEA) em Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM), a qual efetivou uma nova lógica de valorização da região (CHAVES, 2006).

A propaganda governamental vendia as “facilidades” de se conseguir emprego na Amazônia. O marketing militar exaltava a instalação de projetos agropecuários, e a colonização às margens da Transamazônica ecoou longinquamente (PEREIRA, 2015: 63). Com o advento do regime militar em 1964, o sentido dessa abertura da Amazônia toma uma nova dimensão, prioritariamente política -mais precisamente geopolítica, de integração nacional -. O desenvolvimento da Amazônia era visto sob o ângulo de diversos objetivos, com a elaboração de muitos planos para a consecução dos mesmos: desde a abertura da rodovia transamazônica, a política de incentivos fiscais aos interessados em “investir” na Amazônia, até mesmo a propaganda escancarada governamental de migração.

Segundo Airton Pereira (2015: 75), diversos autores (7) sustentam que a concessão de incentivos fiscais a grandes empresários e a implementação de grandes eixos rodoviários como as rodovias transamazônica (BR-230) e a Cuiabá-Santarém (BR-163) fizeram parte dos planos mais importantes do governo militar pós-64 para a exploração econômica e domínio territorial dos chamados “novos espaços” na Amazônia. Estrategicamente, o “vazio demográfico” deveria ser rapidamente ocupado. Se, por um lado, o governo incentivou a movimentação de trabalhadores rurais “sem trabalho” para as novas áreas de colonização ao longo das rodovias federais como a Transamazônica, com o discurso de “distensionar” os conflitos sociais no Nordeste e no Sudeste do Brasil, por outro, agiu contraditoriamente concedendo grandes extensões de terras e dinheiro farto a grupos econômicos para a instalação de suas fazendas na Amazônia (PEREIRA,2015). Na prática, ocorreu uma “transferência” de problemas sociais de outras regiões, acrescendo-se e miscigenando-se aos problemas locais, criando tipos próprios, genuinamente localizados no território amazônico.

Os grandes conglomerados econômicos nacionais e estrangeiros que se instalaram não precisaram fazer nenhum esforço para impor o domínio das terras. O próprio governo se encarregou de acomodá-los confortavelmente. Somada à grave exploração humana, estava também a grande destruição da floresta. Grupos como Volksvagem, Bamerindus e Bradesco que, além de praticarem no interior de seus empreendimentos o trabalho escravo, devastaram grandes extensões de terras cobertas por ricas florestas e transformaram em áreas pastoril para a criação de gado, desprezando a enorme disponibilidade de pastos e campos naturais. Enfim, promoveram grandes prejuízos ecológicos, desperdiçaram ou desviaram os recursos públicos colocados à sua disposição, criaram poucos empregos e não trouxeram o prometido desenvolvimento para a região. Eis o modelo a que foram moldadas as relações sociais e ambientais. Esse modelo permanece até os dias de hoje sem grandes modificações, com interferências do ponto de vista ambiental, econômico ou social: a construção da usina de Belo Monte é um exemplo claro e atual.

Como desmembramento da política de integração, na década de 70, o governo do General Medici decidiu tornar “transitável” a Amazônia, pretendendo instalar ao longo da Transamazônica 100 mil famílias até 1974 para oferecer “terras sem homens a homens sem terra” (MARTINS, 2009:77). Na prática, a distribuição de terras para os trabalhadores foi dificultada pela burocracia exercida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). A evidência obriga a reconhecer que a colonização oficial foi um projeto precipitado, mal planejado e sem adequação com a capacidade de gestão e de acompanhamento dos órgãos governamentais.

De fato, não se constatou, à época, uma atitude governamental que se atentasse para o extremo grau de vulnerabilidade a que estavam expostos os trabalhadores, merecedores, portanto, da proteção estatal. Pelo contrário, houve uma escusa de deveres, de forma a não atender as obrigações gerais de respeito, proteção e garantia dos direitos humanos. Os fatos demonstram a incitação de migrantes à região para, na prática, “entregá-los” aos grandes latifundiários/siderúrgicas, etc.. Essa digressão permite-nos realizar a correlação, o que no  linguajar popular local se diz: o primeiro a se comportar como “gato” foi o governo, aliciando os trabalhadores para a Amazônia. Posteriormente, de forma “natural” outros indivíduos se incumbiram dessa tarefa. Trocando em miúdos, se na década de 70, no início da colonização, o governo brasileiro era o maior propagador do deslocamento desses trabalhadores para a região amazônica, nos anos que se seguiram, o governo deixou de impulsionar, pois a migração já acontecia “espontaneamente” entrando em cena os “gatos (8) ” aliciadores. 

As denúncias dos conflitos e das violências praticadas pelas empresas agropecuárias foram, a partir daí, formuladas pela CPT e encaminhadas à imprensa e aos diversos órgãos do Estado. Os trabalhos pastorais realizados nas comunidades de posseiros fortaleceram a resistência desses trabalhadores em suas posses. Durante anos a CPT denunciou fazendas ligadas a empresas nacionais e multinacionais que cometiam o crime no sul do Pará.

Não por acaso, as décadas de 60 e 70 produziram a primeira leva de denúncias de trabalho escravo contemporâneo no Brasil, e coincidiram com um período de “crescimento econômico” e com a expansão da fronteira agrícola sul por Mato Grosso e Pará (SUTTON, 1994). Destaca-se como um dos percussores das denúncias de formas contemporâneas de escravidão no Brasil, Dom Pedro Casaldáliga, em 1971, defensor dos direitos humanos na Amazônia. Duas fontes de dados sobre o trabalho escravo constituem a principal forma de conhecimento e mensuração deste fenômeno no Brasil: a CPT e o MTE. A CPT foi impulsionadora do processo, pois desde a década de 1980 registra as denúncias de trabalho escravo, ignoradas pelo Estado até 1995, quando o MTE passou a inspecionar os casos denunciados (GIRARDI et al, 2014:6).

As tentativas de se fornecer dados significativos sobre o número de trabalhadores afetados pelo trabalho forçado no Brasil por muito tempo esbarraram inúmeras dificuldades. Muitas vezes, os casos só eram relatados se os trabalhadores conseguissem fugir, e depois, se sentir suficientemente confiantes para alertar as autoridades ou os organismos não-governamentais. Na verdade, os casos que chegaram a ser registrados representam uma pequena porção, ou seja, uma pequena amostra de um fenômeno muito mais generalizado.

A grande pomposidade ostentada pelos grandes projetos contrastam com as mais primitivas formas de exploração humana. No início dos anos 1980, começaram a surgir testemunhos da outra realidade da Fazenda Vale do Rio Cristalino. Pouco a pouco, apareceu o incrível paradoxo da convivência das mais modernas tecnologias agrícolas e de gestão do trabalho com formas arcaicas de exploração da mão de obra. Uma das empresas mais estimada no país, dispondo do total apoio das autoridades públicas brasileiras, envolvida em um empreendimento lucrativo e cheio de promessas, “numa zona já consagrada, como vocacionalmente ditada para implantação de um grande centro criatório” (SUDAM apud BUCLET, 2006), não evitou a exploração bárbara dos peões, aqueles empregados sob coerção para executar trabalhos de baixa qualificação.

A partir de 1980, muitas denúncias vieram à tona, coincidentemente paralelas ao regime de redemocratização que passava o país. Em 1983, vários relatos envolvendo a Vale do Rio Cristalino chegaram à CPT, reforçando, inclusive situações de violações pretéritas. De acordo com os registros de Pe. Ricardo Rezende Figueira, neste ano o jornal O Globo, do Rio de Janeiro, finalmente publicou uma notícia pequena sobre essas denúncias de trabalho escravo na fazenda da Volkswagen. Esta notícia ganhou notoriedade na imprensa internacional, que começou a solicitar informações mais detalhadas sobre estes acontecimentos. Este foi o ponto inicial de uma série de ações articuladas entre o nível local (a CPT, o Sindicato de Trabalhadores Rurais, a diocese), estadual (audiências com o governador), federal (intervenção de deputados federais) e internacional (imprensa, ONGs, sindicatos e partidos políticos) (BUCLET, 2006:7).

Apesar dos esforços conjuntos para extirpar essa prática violadora da dignidade dos trabalhadores, o reconhecimento do estado brasileiro da existência de escravidão contemporânea em seu território não se deu de forma a rápida e a contento. Foram necessários diversos constrangimentos promovidos por denúncias, articulações de organismos internacionais como a OIT, ONGS, movimentos sociais e vários outros grupos da sociedade civil organizada, para que, após a submissão vexatória do país à Corte Interamericana de Direitos Humanos, houvesse o reconhecimento da prática pelo governo brasileiro.


3.O Trabalho Escravo Contemporâneo sob a ótica dos Direitos Humanos

A luta contra o trabalho escravo e degradante é sobretudo uma luta da afirmação dos direitos humanos. Assim como as violações se transmutam no decorrer do tempo e espaço, os direitos humanos sofrem as ressignificações, a fim de identificar essas novas formas de violação e coibi-las. Daí, no dizer de Hanna Arendt, o “caráter de permanente construção e reconstrução dos direitos humanos” (ARENDT, 2013:9), na medida em que as relações sociais sofrem os dinamismos dos ciclos sociais (9) . Nesse contexto, os direitos humanos se inserem a favor do reconhecimento de que nenhum homem pode afirmar-se superior aos demais. E que, portanto, nenhum homem é legitimado a explorar o outro, elevando a máxima de que o todo indivíduo tem direito a não ser oprimido, preservar sua dignidade e de desfrutar autonomamente de suas liberdades individuais.

Realça Norberto Bobbio, que os direitos humanos são direitos históricos, ou seja, “nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas(10)” (BOBBIO, 2004: 8). Refletem uma monta de valores construída a partir de um espaço simbólico de luta e ação social. Os direitos humanos compõem uma racionalidade de resistência, na medida em que traduzem processos que abrem e consolidam espaços de luta pela dignidade humana. Invocam, neste sentido, uma plataforma emancipatória voltada à proteção da dignidade humana (FLORES, 2002:8). Para Carlos Santiago Niño, os direitos humanos são uma construção consciente vocacionada a assegurar a dignidade humana e a evitar sofrimentos, em face da persistente brutalidade humana (NIÑO apud PIOVESAN, 2006:153). A justificativa desse princípio repousa na ideia sistemática de que a essência do ser humano é a mesma e uma só, embora coexistam a multiplicidade de diferenças, individuais e sociais, biológicas e culturais, na humanidade.

A exigência de condições sociais aptas a propiciar a realização de todas as virtualidades do ser humano é, assim, intensificada no tempo, e traduz-se, necessariamente, pela formulação de novos direitos humanos (COMPARATO, 2010:36). Daí a necessidade da reformulação conceitual da exploração escravizadora. Assim como as práticas humanas exploradoras se assentam às novas realidades, formando “novos” fenômenos mesmo que sejam a partir de práticas primitivas, os novos direitos humanos também se insurgem como forma de contrapor essas violações.

Na linha do tempo da historicidade dos direitos, destaca-se o marco da concepção contemporânea de direitos humanos, vindo a ser introduzida pela Declaração Universal de 1948 e posteriormente reiterada pela Declaração e Programa de Ação de Viena de 1993.

Assim, os direitos humanos se colocam em oposição crítica e de repúdio à concepção positivista de um ordenamento jurídico indiferente a valores éticos, presos ao mero formalismo jurídico — vez que, como prova histórica, o nazismo e o fascismo ascenderam ao poder dentro dos ditames da legalidade e agiram com o respaldo da lei ao promover a barbárie humana. Há, portanto, uma releitura do pensamento filosófico kantiano, principalmente no que diz respeito às ideias de moralidade e dignidade.

A afirmação por Kant do valor relativo das coisas, em contraposição ao valor absoluto da dignidade humana, já prenunciava a quarta etapa histórica na elaboração do conceito de pessoa, a saber, a descoberta do mundo dos valores, com a consequente transformação dos fundamentos da ética. O homem é o único ser, no mundo, dotado de vontade, isto é, da capacidade de agir livremente, sem ser conduzido pela inelutabilidade do instinto. (COMPARATO, 2010: 37). Para Kant as pessoas e, em geral qualquer espécie racional, devem existir como um fim em si mesmo e jamais como um meio, a ser arbitrariamente usado para este ou aquele propósito. Os objetos têm, por sua vez, um valor condicional, enquanto irracionais, por isso, são chamados “coisas”, substituíveis que são por outras equivalentes. Os seres racionais, ao revés, são chamados “pessoas”, porque constituem um fim em si mesmo, têm um valor intrínseco absoluto, são insubstituíveis e únicos, não devendo ser tomados meramente como meios. As pessoas são dotadas de dignidade, na medida em que têm um valor intrínseco. Deste modo, ressalta Kant, trate a humanidade, na pessoa de cada ser, sempre com um fim mesmo, nunca como um meio. Adiciona Kant que a autonomia é a base da dignidade humana e de qualquer criatura racional. Lembra que a ideia de liberdade é intimamente conectada com a concepção de autonomia, por meio de um princípio universal da moralidade, que, idealmente, é o fundamento de todas as ações de seres racionais. Para Kant, o imperativo categórico universal dispõe: “Aja apenas de forma a que a sua máxima possa converter-se ao mesmo tempo em uma lei universal (PIOVESAN, 2006: 154)

Todo esse esforço de retorno da dignidade humana ao centro do cenário pós-guerra, reconfigurou o direito internacional dos direitos humanos influenciando um novo movimento constitucionalista em cadeia, plural, com abertura a princípios e a valores que respeitam a primazia da dignidade humana, como é o caso da constituição brasileira de 1988, que tem como fundamento da República Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa humana.

Como corolário do princípio da dignidade humana está a proibição ao trabalho escravo. Os diplomas internacionais de proteção dos direitos humanos são incisivos em afirmar o trabalho escravo e degradante como grave forma de violação de direitos humanos. A proibição da escravidão e de práticas similares forma parte do Direito Internacional consuetudinário e do jus cogens. A proteção contra a escravidão é uma obrigação erga omnes e de cumprimento obrigatório por parte dos Estados, a qual emana das normas internacionais de direitos humanos. Por se tratar de um crime “lesa-humanidade”, possui caráter imprescritível. 

O Brasil é signatário de vários instrumentos internacionais que tratam dos direitos humanos. Primeiramente, em 1926, no texto da Convenção sobre a Escravatura das Nações Unidas, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto Presidencial nº 58.563, de 1º de junho de 1966, já havia previsão de que os países signatários deveriam abolir completamente a escravidão sob todas as suas formas.

Em 1969, foi promulgada a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, mais conhecida como Pacto de São José da Costa Rica, sendo ratificada pelo Brasil, somente vinte e três anos mais tarde, por meio do Decreto nº 678, de 06 de novembro de 1992, e encampou-se o compromisso do estado brasileiro em erradicar a escravidão e a servidão em todas as suas formas.

O Brasil é um dos 187 membros da OIT. A OIT é responsável pela formulação e aplicação das normas internacionais do trabalho (convenções e recomendações). As convenções, uma vez ratificadas por decisão soberana de um país, passam a fazer parte de seu ordenamento jurídico. O Brasil está entre os membros fundadores da OIT e participa da Conferência Internacional do Trabalho desde sua primeira reunião.

Apenas no início dos anos 90, o Governo Brasileiro assumiu a existência do trabalho escravo no seu território, perante a comunidade internacional e a OIT. Tornou-se então uma das primeiras nações do mundo a reconhecer oficialmente a escravidão contemporânea. A partir de então, como uma resposta a esse reconhecimento, algumas importantes ações começaram a ser tomadas em 1995, com a edição em 27 de junho do Decreto n. 1.538, criando estruturas governamentais para o combate ao crime do trabalho escravo, com destaque para o Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado – GERTRAF e o Grupo Especial de Fiscalização Móvel – GEFM (11), coordenado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). O Grupo Especial de Fiscalização Móvel – GEFM, subordinado à Secretaria de Inspeção do Trabalho – SIT do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, foi criado e começou a atuar no resgate dos trabalhadores.

Em 2003, foi lançado o 1º Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, o qual previa a implementação de várias ações em conjunto com as instituições governamentais e as organizações sociais, como parte da implementação da chamada “política anti-escravidão”, tendo sua segunda edição lançada em 2008.


4. Análise do tipo penal previsto no artigo 149 do código penal e suas formas de caracterização 

A alteração pela Lei 10.803, de 11 de dezembro de 2003, promoveu mudança significativa na redação do artigo 149 do Código Penal, antes lacônico. A redação original do art. 149 levava a diversas interpretações e dificuldades para a verificação da tipicidade do fato.

Uma das interpretações exigia que o agente realizasse condutas que, em seu conjunto, impusessem à vítima a modificação de seu estado de liberdade, alterando seu estado de liberdade natural de ser humano livre, de modo que se assemelhasse ao estado de fato de um verdadeiro escravo nos moldes do regime, sem o poder de decidir sobre seu destino.

Esclarece Brito Filho (2013), amparado nas indicações de Bitencourt, que existe uma grande diferença entre o tipo penal do artigo 149 e o crime de plágio, dos romanos. Explica esse último delito da seguinte forma: quando o Direito Romano proibia a condução da vítima, indevidamente, ao estado de escravidão, cujo nomen iuris era plagium, o bem jurídico tutelado não era propriamente a liberdade do indivíduo, mas o direito de domínio que alguém poderia ter ou perder por meio dessa escravidão indevida (BITENCOURT apud BRITO FILHO, 2013). Ainda a respeito do plágio, Pierangeli afirma que “A palavra plagium, etimologicamente, vem do verbo plagiare, que na Roma antiga significava a compra de um homem livre sabendo que o era, e retê-lo em servidão ou utilizá-lo como próprio servo (PIRANGELI apud BRITO FILHO, 2013:38). Essa é a explicação etimológica que se casa com a escravidão contemporânea, onde os homens são “livres” e, ainda assim, sujeitos a condições análogas de escravidão, pois perderam a capacidade de dispor sobre a sua força de trabalho, e consequentemente sobre a sua própria existência.

Retomando à análise do tipo penal descrito no artigo 149, essa “nova velha” forma de interpretar o dispositivo, ampliada e considerando como bem jurídico maior a ser protegido a dignidade humana, não significa diminuir ou relativizar o conceito de liberdade, mas realocá- lo como uma espécie de violação desta, sem perder de vista que o próprio preceito primário é descritivo e cumula as outras formas de caracterização desse tipo penal, sendo a privação de liberdade uma das formas de caracterização do delito e não o núcleo essencial do tipo.

Dessa forma, a alteração feita é eloquente e deixa claro que não há o crime de redução à condição análoga à de escravo somente quando a liberdade da pessoa é, diretamente, estritamente suprimida. Pelo contrário, há hipóteses em que não se discute de forma direta, e talvez se deva dizer de forma principal a supressão da liberdade do ser humano, como na jornada exaustiva e nas condições degradantes de trabalho, pois há bem maior a proteger, nesses casos, que a liberdade.

A conduta descrita no tipo penal “fere, acima de tudo, o princípio da dignidade humana, despojando-o de todos os seus valores ético-sociais, transformando-o em res, no sentido concebido pelos romanos” (BITENCOURT apud BRITO FILHO, 2013:36). É o que temos defendido, desde há algum tempo, no sentido de que a alteração do artigo 149 do Código Penal produziu mudança significativa a respeito do bem jurídico principalmente protegido, que passou da liberdade para o atributo maior do homem, que é a sua dignidade, na versão contemporânea, e que é baseada na visão e fundamentação que lhe emprestou Kant(12) (BRITO FILHO, 2013:36).

4.1 Trabalho forçado 

A Organização Internacional do Trabalho, na convenção 29, ratificada pelo Brasil, denomina o trabalho forçado também de trabalho obrigatório. Portanto, “trabalho forçado ou obrigatório” designará todo trabalho ou serviço exigido de um indivíduo sob ameaça de qualquer penalidade e para o qual ele não se ofereceu de espontânea vontade. Aqui, a tônica é então, a liberdade, mas não exclusivamente a liberdade de locomoção.

A proteção se dirige à liberdade pessoal, na qual se inclui a liberdade de autodeterminação, em que a pessoa tem a faculdade de decidir o que fazer, como, quando e onde fazer (HADDAD, 2013: 83). Quando o trabalhador não pode decidir, espontaneamente, pela aceitação do trabalho, ou então, a qualquer tempo, em relação à sua permanência no trabalho, há trabalho forçado (BRITO FILHO, 2008:12).

No tocante à “ameaça de uma pena”, esta pode consistir, entre outros, na presença real e iminente de intimidação, que pode assumir formas e graduações heterogêneas, das quais as mais extremas são aquelas que representam coação, violência física, isolamento ou confinamento, bem como a ameaça de morte dirigida à vítima ou a seus familiares (…). Já no que se refere à “falta de vontade para realizar o trabalho ou serviço”, este consiste na ausência de consentimento ou de livre escolha no momento do começo ou continuidade da situação de trabalho forçado. Esta situação pode ocorrer por distintas causas, tais como a privação ilegal da liberdade, o engano ou a coação psicológica (CIDH, 2016: 77-78).

O trabalho forçado pode decorrer por coação moral, como anteriormente demonstrado, psicológica ou física. Acresce-se a isso o entendimento de que o fato de receber algum pagamento em troca dos serviços não impede que estes sejam qualificados como servidão ou trabalho forçado.

4.2 Sujeição alheia à jornada exaustiva 

A jornada exaustiva é considerada o período de trabalho diário que foge às regras da legislação trabalhista, exaurindo o trabalhador, independente do pagamento de horas extras ou qualquer outro tipo de compensação. A Constituição Federal brasileira prevê expressamente que a jornada diária se estenda, no máximo, por oito horas, e a semanal, por quarenta e quatro horas. Ao labor excedente à jornada indicada, a Constituição determina remuneração com, no mínimo, cinqüenta por cento de acréscimo.

A legislação infraconstitucional determina que, em qualquer hipótese, a jornada não exceda ao período de duas horas extras por dia, admitindo exceções previstas na CLT, intervalor inter e intrajornada e ainda sob extrema fiscalização. Acresce-se ainda que, jornada exaustiva, segundo Wilson Ramos Filho (2008) estaria configurada, não apenas em relação à carga horária de trabalho (quantitativa), mas também à intensidade (qualitativa) superiores a força humana a que são submetidos os trabalhadores(13).

Portanto, jornada exaustiva é a jornada de trabalho imposta a alguém, por outrem, em relação de trabalho, além dos limites legais extraordinários estabelecidos na legislação de regência, e/ou capaz de causar prejuízos à sua saúde física e mental, e decorrente de uma situação de sujeição que se estabelece entre ambos, de maneira forçada ou por circunstâncias que anulem a vontade do primeiro (BRITO FILHO, 2013: 44).

4.3 Trabalho em condições degradantes 

Luis Camargo (2003) conceitua como aquele em que se pode identificar péssimas condições de trabalho e de remuneração. Pode-se dizer que trabalho em condições degradantes é aquele em que há a falta de garantias mínimas de saúde e segurança, além da falta de condições mínimas de trabalho, de moradia, higiene, respeito e alimentação. Desse modo, tudo devendo ser garantido de forma conjunta. Havendo, em contrário, a falta de um desses elementos, impõese o reconhecimento do trabalho em condições degradantes.

Degradação significa rebaixamento, indignidade ou aviltamento de algo. O tipo penal é aberto e cabe ao magistrado aferir o que seriam condições degradantes de trabalho, é, pois, elemento normativo cheio de significados. O Norte mais seguro a ser seguido é o recurso a legislação trabalhista, que disciplina as condições mínimas apropriadas ao trabalho humano (HADDAD, 2013). A recorribilidade às normas trabalhistas mostra-se indispensável porque, Segundo Haddad (2013), o crime atenta também contra a organização do trabalho, genericamente considerada, a despeito de ser classificado entre aqueles que violam a liberdade individual (HADDAD, 2013: 86).

Cumpre esclarecer, não é qualquer constrangimento gerado por irregularidades nas relações laborais que determina a incidência do dispositivo. Por condições degradantes entendem-se as aviltantes ou humilhantes, não apenas em geral consideradas, mas também, em face das condições pessoais da vítima, que afrontem a sua dignidade. Trabalho degradante apresenta conceito negativo, pois é aquele a que faltam condições mínimas de saúde e segurança, moradia e higiene, respeito e alimentação, como já apresentado acima por Luis Camargo. Nessas circunstâncias, negam-se direitos básicos ao trabalhador, que é transformado em coisa e a quem se atribui preço, sempre o menor possível. Trabalho degradante é aquele que priva o trabalhador de dignidade, que o desconsidera como sujeito de direitos, que o rebaixa e prejudica, e, em face de condições adversas, deteriora sua saúde.

Assim, se o trabalhador presta serviços exposto à falta de segurança e com riscos à sua saúde, em jornada desarrazoada, que lhe ampute o descanso e o convívio social, há trabalho em condições degradantes. Se, para prestar o trabalho, o trabalhador tem limitações na sua alimentação, na sua higiene e/ou na sua moradia, caracteriza-se o trabalho em condições degradantes. Se o trabalhador não recebe o devido respeito que merece como ser humano, sendo, por exemplo, assediado moral ou sexualmente, também aí, está configurado o trabalho em condições degradantes (COELHO & SOUZA, 2016:21)

4.4 Restrição, por qualquer meio, da locomoção alheia em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto 

Esse dispositivo retrata de forma clara a escravidão por dívida. Primeiramente, a restrição em razão de dívidas, conduta conhecida como servidão por dívidas ou truck system, é uma das características do trabalho escravo contemporâneo no Brasil. É instituto há muito conhecido na história da humanidade e largamente utilizado nas diversas épocas da história do nosso país (COELHO & SOUZA, 2016: 24).

A legislação trabalhista, no art. 462, §§2º e 3º, da CLT, cuidou de proteger o trabalhador dessa prática, regulamentando e fazendo a previsão da proibição do empregador “que mantiver armazém para venda de mercadorias aos empregados ou serviços estimados a proporcionar-lhes prestações in natura, exercer qualquer coação ou induzimento no sentido de que os empregados se utilizem do armazém ou dos serviços”, além de prever que “a autoridade competente pode determinar o acesso dos empregados a armazéns ou serviços, não mantidos pelo empregador, a preços razoáveis, sem intuito de lucro e sempre em benefício dos empregados”.

No mesmo sentindo, o Precedente Normativo nº 68 do TST autoriza o chefe de família, se empregado rural, a faltar ao serviço um dia por mês ou meio dia por quinzena para efetuar compras, sem remuneração ou mediante compensação de horário, mas sem prejuízo do repouso. O referido precedente é uma medida de proteção ao salário e contribui para que o trabalhador não fique obrigado a fazer suas compras no próprio armazém do empregador.

Principalmente nesse ponto do preceito primário, o intérprete do dispositivo penal também deve se aprofundar na seara trabalhista, para que haja uma melhor contextualização do tipo penal, e mais ainda, entender o fenômeno sociológico que está posto. Não por acaso, destrinchamos no capitulo 2 como ocorre a manifestação de trabalho escravo na região amazônica, onde além da reunião de características já apontadas, uma das mais latentes é a servidão por dívida.

A servidão por dívida afronta várias normas de proteção ao trabalho, tais como a intangibilidade do salário (art. 462, caput, da CLT), da irredutibilidade do salário (art. 7º, inciso VI, da Constituição Federal) e, principalmente, a vedação à prática do truck system (§§ 2º e 3º do art. 462 da CLT) e a determinação do pagamento da prestação em espécie do salário em moeda corrente do país (art. 463 da CLT).

No caso específico da escravização no meio rural, há ainda violação aos dispositivos da Lei nº 5.889/73 (estatuto do trabalhador rural), que também reverberam, consagram os mesmos princípios da legislação consolidada. A conduta viola, ainda, os preceitos da Convenção nº 96 da OIT, sobre a proteção ao salário, ratificada pelo Brasil.

Não se admite mais a prisão por dívida em nosso ordenamento. Quanto mais a autorização do particular para exercer esse tipo de conduta contra outro particular. A servidão por dívida é um dos tipos de exploração mais arcaicos no mundo, e, por muito tempo, foi expurgada do nosso ordenamento. Além da servidão por dívidas, o termo “por qualquer outro meio” pode se desdobrar em várias outras hipóteses, a exemplo do isolamento geográfico do trabalhador, sem fornecimento de transporte público ou locomoção por parte do empregador, restringindo o ir e vir do obreiro.


 5. Apresentação dos dados e análise das sentenças

 5.1 Apresentação dos dados

 A pesquisa teve acesso a 47 sentenças, sendo 40 da 1ª vara e 7 da 2ª vara, da subseção judiciária de Marabá. Tal disparidade no número de sentenças por vara se explica porque a 2ª vara é especializada em agrário e ambiental, mas, ao mesmo tempo, tem competência geral sobre outras matérias. Como forma de compensar o sistema de justiça, ocorrem menos distribuições para a 2ª vara em matéria criminal. O período das sentenças é de 2013 a 2016. Abaixo segue gráfico contendo a quantidade de condenações e absolvições:

Fonte: elaborada pela autora

Como se pode constatar, há um enorme disparate entre o número de condenações e absolvições. De um total de 47 sentenças, apenas 8 foram condenatórias. Esse outro gráfico demonstra a quantidade de sentenças julgadas por ano:

Fonte: elaborada pela autora

Conforme os dados demonstrados, no período escolhido pela pesquisa no ano de 2016 houve mais julgamentos sobre o crime de trabalho escravo. O próximo gráfico revela a quantidade de processos/sentenças por município:

Note-se que o município de São Félix do Xingu é o que mais apresenta incidência de trabalho escravo em relação aos outros municípios no período analisado. Tal constatação revela a necessidade de uma melhor intervenção das instituições nesse município. Foram analisadas 10 sentenças (processos números: 2007.39.01.000538-4, 8483- 39.2010.4.01.3901, 2004.39.01.000549-0, 2008.39.01.001405-8, 2008.39.01.001483-2, 2009.39.01.000121-6, 2009.39.01.000519-0, 6190-96.2010.4.01.3901, 2008.39.01.001492-1, 6044-21.2011.4.01.3901), sendo 8 absolvições e 2 condenações, perfazendo um percentual de mais de 20% do total de condenações.

5.2 Análise das sentenças

Nas sentenças analisadas, os juízes reconhecem o desrespeito à legislação trabalhista, que as condições de trabalho não são adequadas. Todavia, quando ocorre a identificação da caracterização do crime trabalho escravo, esta é afastada sob o argumento de que não há cerceamento de liberdade ou faltam provas. Ocorre que, o trabalho escravo também é trabalho degradante, também é jornada exaustiva e também é servidão por dívida, como está descrito no próprio dispositivo do preceito primário do artigo 149 CP, de forma alternativa. A pesquisa identificou que um dos aspectos mais complexos de serem analisados pelos magistrados é o trabalho degradante. Sobrevive ainda a interpretação de que o trabalho degradante deve ferir também a liberdade do indivíduo. No excerto abaixo há uma confusão na conceituação do magistrado entre o que seja trabalho degradante e privação de liberdade.

Vejamos:

 (…) para a configuração do delito na modalidade relativa às condições degradante de trabalho, é necessário que estas se mostrem de tal maneira graves que impliquem em ofensa à liberdade e dignidade. O sujeito ativo, por meio de uma relação de emprego (formal ou informal), subjuga o sujeito passivo, vedando-lhe a liberdade de locomoção e/ou decisão, e tornando-o quase um objeto. É justamente sobre essa transmutação da pessoa como sujeito de direitos em mero objeto que se apoia o tipo penal. O agente impõe ao ofendido condições tão severas de trabalho que o liame entre ambos se torna mera submissão/exploração de uma pessoa por outra, como se a mão de obra fosse simples mercadoria e não houvesse portador de direitos. Grifo nosso. [Grifos nossos] (PARÁ, 2016A: 17).

Trabalho degradante é o que está descrito no relatório de fiscalização realizada na fazenda Carvalho, citado nas sentenças abaixo, e que foi tratado como mera infração trabalhista:

(…) o relatório de fiscalização do ministério do trabalho (fls. 25/38), adornado com fotografias, narra que as instalações onde ficavam os trabalhadores eram precárias, visto que não havia água tratada, os barracos eram cobertos com lona, sem proteção lateral; não havia banheiro; os alimentos estavam acondicionados em locais indevidos, etc… Entretanto é notório que tais deficiências logísticas representam muito mais um retrato do local de prestação de serviços (região amazônica) e tipo de trabalho realizado (roça de vegetação danosa aos pastos – juquiras), em que o empregador deixa de cumprir regras trabalhistas, do que o dolo de ter seres humanos subjugados ao seu poder econômico, então reduzidos à condição de escravos. [grifo nosso] (PARÁ, 2016A: 9) O deficiente acondicionamento dos alimentos, o fornecimento de água do córrego – geralmente sujeito ao uso de animais da região, e os alojamentos improvisados configuram, certamente, infrações trabalhistas cometidas pelo empregador, mas também espelham a presença da própria dificuldade logística encontrada no ambiente em que desenvolvida a prestação laboral. [grifo nosso] (PARÁ, 2016B: 10)

Não se equivoca o magistrado ao fazer um retrato da situação laboral nos rincões da Amazônia, onde essas práticas ainda são corriqueiras. O mesmo ilustra com detalhes as condições a que são submetidos os trabalhadores rurais em algumas fazendas do sudeste paraense. Afirma que “é inconteste que a deficiência estrutural então detectada, que prejudicava o trabalho dos obreiros, decorre também das condições físicas então existentes e não somente da desídia do empregador” sugere o magistrado que as “condições físicas da região” é que contribuem para a prática delituosa. Ao estabelecer essa relação do crime com o espaço geográfico, classificando-o como costume da região, o magistrado desonera o empregador de suas responsabilidades, já que o cenário natural bem aponta que os trabalhos eram executados em típica região de fronteira agrícola (PARÁ, 2016A:11).

Não deveriam os aspectos físicos da região amazônica, de expansão fronteira agrícola, como bem classificada pelo magistrado, ser o principal contribuidor para as condutas exploratórias contra os trabalhadores, pois é desse mesmo solo, ar, água e tudo de riqueza que o espaço amazônico proporciona, o motivo de grande atração para que os empreendimentos instalados aqui angariassem grandes lucros, basta que se acompanhe os grandes faturamentos que eles movimentam. Algumas das fazendas, inclusive pomposas, com altos lucros, raízes em multinacionais, como já descrito no capítulo 2, mas que conservam em seu interior as práticas mais desumanas, arcaicas e indignas de exploração. Inadmissível ainda em nosso século a exploração do homem pelo homem por conta do capital. O equívoco está na compreensão do magistrado que, atuando em nome do Estado, com base nas atribuições constitucionais que lhe foram conferidas, se comporta contrário a qual princípio elencado na mesma constituição, a qual ele tem o dever de salvaguardar, e que ora invoca-se para resguardar a dignidade da pessoa humana. Ao “naturalizar” a situação, há uma pretensão de torna-la aceitável aos nossos olhos, e utiliza-la como argumento a desfavor dos trabalhadores.

É indubitável que o dispêndio da força de trabalho dos obreiros reverte-se em prol do empregador, que de fato deve ser responsabilizado pelo que ocorre no local de trabalho. É ele quem se beneficia direta ou indiretamente pela produção devendo responder pelas obrigações decorrentes da sua prestação.

De fato, não se pode exigir do empregador uma infraestrutura tal qual a urbanizada, visto que isso é função do poder público, porém, a falta de estruturas mínimas não deve servir de artificio para que ele se utilize dessas falhas e submeta seus trabalhadores a condições indignas. Se o empregador latifundiário não tem condições de oferecer ambiente de trabalho digno aos seus empregados, o mesmo não deve se valer do recrutamento para submetê-los a situações subumanas e de constantes ameaças nas suas terras, ainda que os trabalhadores estivessem em situação de vulnerabilidade social ocasionada pela pobreza. O empregador não tem o condão de reverberar ainda mais essa vulnerabilidade no ambiente laboral, tolhendo a capacidade do indivíduo de se desfazer do estado de miserabilidade. Infelizmente, na sentença 2009.39.01.000519-0, o magistrado entende que “não se afigura razoável exigir do empregador a construção de alojamentos e instalações sanitárias no meio do mato, a fim de abrigar trabalhadores que ali permanecerão por um curto espaço de tempo” (PARÁ, 2014B:6).

Ressalte-se que o fato de cidadãos pobres e humildes aceitarem a indigna sujeição a tal tipo de condições – o que fazem em razão da absoluta falta de alternativa para garantia da própria subsistência – não autoriza a outrem, valendo-se da privilegiada posição de empregador e possuidor do poder econômico, literalmente lucrar com a miséria e desgraça alheias.

 Nos excertos extraídos da sentença 2008.39.01.001483-2, resta evidente que os empregadores se eximem da responsabilidade pelo ambiente de trabalho, logicamente que esse sentimento, advém da impunidade reprodutora do ciclo da escravidão. Nesse sentido, se torna oportuno transcrever os seguintes depoimentos:

Na casa foram encontradas armas e um caderninho de anotações com as dívidas que os trabalhadores faziam no sistema de barracão, que tinham alimentos e inclusive bebidas alcóolicas, mas depois nós ficamos sabendo que as bebidas alcóolicas eram fornecidas gratuitamente pelo proprietário da fazenda (…) eles tinham saído de lá (fazenda) porque tinha batido um vento muito forte e tinha desmanchado o barracão e aí teve outra frase que se tornou emblemática (…) quando o trabalhador foi lá com o proprietário da fazenda e ele lhe disse : “peão é igual a bicho do mato, e eu é que não vou dar hotel cinco estrelas para peão. [Grifo nosso] (PARÁ, 2013C: 4)

 O entendimento da que foi identificado no estudo detectou que há uma inclinação em não reconhecer e caracterizar o trabalho escravo. Essa é uma das causas, senão a principal causa, do grande número de absolvições no Sudeste do Pará. A compreensão de trabalho escravo pelos juízes federais ainda não superou a sua vinculação ao conceito de cerceamento de liberdade e também que basta a aplicação da sanção trabalhista para a conduta seja reprimida.

 Note-se que, no caso, não há como ignorar que a ausência de instalações adequadas para alguns dos trabalhadores retrata, na verdade e infelizmente, a realidade da região em que verificados os fatos, que pode ser encontrada também em muitas regiões interioranas do brasil e sancionáveis pelo direito trabalhista, mas que se mostra insuficiente para a ação do jus puniendi estatal. Eventuais excessos na forma de explorar o labor humano devem ser coibidos pelo sistema fiscalizatório trabalhista, sem, contudo, representar, imediata e cartesianamente, o tipo encravado no art, 149 da lei penal brasileira. Não basta a simples constatação das circunstâncias narradas para que sejam configuradas a existência de trabalho degradantes tipificado no CP como trabalho escravo, que exige mais, a ponto de se compreender que a vítima se assemelhou a escravo ou coisa [grifo nosso] (PARÁ, 2016B: 12).

Algumas sentenças tendem a negar a necessidade de intervenção do direito penal. São, portanto, contrárias à posição da efetivação dos direitos humanos, e, declaram uma posição retrógrada daquilo que foi proposto pelo legislador. A visão reducionista adotada é por diversas vezes reforçada, pormenorizada e fortalecida, tratando o crime de trabalho escravo apenas como uma situação de infração trabalhista, não sendo passível de ser considerado um delito que necessite do jus puniendi do Estado, ou seja, não sendo necessário recorrer a ultima ratio. Ocorre que, se o desrespeito ao bem jurídico a ser protegido pelo dispositivo do código penal, no caso a dignidade da pessoa humana, não fosse considerado uma conduta punível, não haveria necessidade de previsão no código penal; mais ainda, seria descartável a alteração ocorrida em 2013, que veio, justamente, para aclarar a interpretação do dispositivo e estimular a punição dessa conduta degradante.

 Enfatize-se mais uma vez que a proteção à dignidade da pessoa humana é fundamento da República Federativa do Brasil, com irradiação no ordenamento jurídico, e, no caso do trabalho escravo no âmbito trabalhista, criminal e administrativo. Dessa forma, a mesma conduta deve ser combatida nessas diversas esferas. O relatório realizado pelos auditores fiscais do trabalho desencadeia a proteção a dignidade da pessoa humana nas três esferas. Se o estado brasileiro, em consonância com os diplomas internacionais, Constituição do país e leis  infraconstitucionais, não tivesse se convencido de que o combate a essa chaga social deveria ser ampliado, não haveria necessidade de se recorrer à “mão pesada” do direito de punir do Estado, bastando que o fenômeno fosse contornado apenas na seara trabalhista, até porque a Justiça do Trabalho não possui competência para julgar ações penais, ainda que de natureza trabalhista (14).

Como bem trata o princípio da legalidade no direito penal: nullum crimen nulla poena sine previa lege, estampado no artigo 1º do código penalista, “não há crime sem lei anterior que a defina, nem há pena sem prévia cominação legal”. No caso em comento, as formalidades foram todas respeitadas: há previsão do tipo penal, descrição da conduta delituosa e definição de pena, porém a negação da aplicação do dispositivo reforça ainda mais a prática e impunidade, vitimando um sem número de trabalhadores.

Na Justiça do Trabalho o reconhecimento da infração trabalhista gera as devidas aplicações das sanções trabalhistas, dentro dos limites de sua jurisdição. O mesmo ocorre na seara penal, onde o intérprete deveria partir da ideia de que já houve a infração trabalhista, visto que o crime é realizado no âmbito laboral. Todavia, o objeto que está em discussão nesse âmbito é o bem jurídico relevante a ser protegido pela norma penal, dignidade da pessoa humana, e deve ser levado a punição em caso de transgressão, merecedora, portanto, de um outro olhar voltado para a repressão da conduta. A prática está sujeita ainda a sanção administrativa, passível de multas a serem aplicadas aos empregadores, e desapropriação da propriedade utilizada no crime para fins de reforma agrária ou habitação popular.

No entanto, ainda persiste a ideia de que “a atuação das normas trabalhistas se mostram suficiente para reequilibrar o meio social (… ) de forma que eventual ação punitiva, no campo criminal, revela-se desproporcional – verdadeira maximização da norma penal” (PARÁ, 2016C:6) . Defender esse posicionamento, significa desconstituir todo um sistema de garantias que caminha para a máxima efetivação dos direitos humanos e fundamentais, e que não sobrevive de retrocessos.

Em relação à caracterização da servidão por dívida, observa-se que nas sentenças 2007.39.01.000538-4, 8483-39.2010.4.01.3901, 2007.39.01.000538-4 , foi invocado o artigo 458 da CLT como fundamento para afastar a caracterização da servidão por dívida. No entanto, ao se reportar apenas a esse dispositivo isoladamente, sem considerar as repercussões e contexto a que ele se presta, principalmente no âmbito trabalhista, o magistrado cometeu o equívoco de tornar a fundamentação desconectada com os princípios do diploma laboral:

 Oportuno fazer constar que a Consolidação das Leis do Trabalho- CLT permite a cobrança pelo fornecimento de alimentação aos trabalhadores, desde que não se desenvolva sob preços abusivos, mas sim, justos e razoáveis. Art. 458 – Além do pagamento em dinheiro, compreende-se no salário, para todos os efeitos legais, a alimentação, habitação, vestuário ou outras prestações “in natura” que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado. Em caso algum será permitido o pagamento com bebidas alcóolicas ou drogas nocivas. § 1º os valores atribuídos às prestações “in natura” deverão ser justos e razoáveis, não podendo exceder, em cada caso, os dos percentuais das parcelas componente do salário-mínimo (arts. 81 e 82) (PARÁ, 2016B: 8)

O artigo 458 da CLT deve ser interpretado de modo sistemático, através de sua integração com os demais dispositivos de uma mesma lei (no caso os artigos 462 e 463 da CLT), pois o sistema de proteção salarial conferido pela ordem justrabalhista manifesta-se em garantias amplas fundadas nos princípios e normas que asseguram a indisponibilidade dos direitos trabalhistas e que vedam até mesmo transações, quando lesivas ao obreiro. Ao lado dessas, há outras garantias mais específicas, que dizem respeito à proteção do valor do salário; contra abusos do empregador, e mesmo contra as investidas de credores do empregador e do próprio empregado.

Como já frisado, um dos elementos que caracterizam a ocorrência do trabalho escravo contemporâneo é a vinculação do trabalhador rural ao sistema monopolista de venda de alimentos diversos de primeira necessidade por parte do proprietário rural. Este é o chamado sistema do truck system ou barracão, em que o empregador disponibiliza para venda ao obreiro diversos produtos úteis à sua sobrevivência e ao desempenho de suas atividades laborais. Os valores praticados pelo dono do armazém estão muito além do valor de mercado ou mesmo não atribui-se qualquer valor ao produto, de modo que o trabalhador ignora por completo quanto despende para adquirir determinado gênero, procedendo apenas à anotação em um caderno dos produtos adquiridos, conforme descrição do relatório de fiscalização na fazenda Boa Esperança, contido na sentença 2008.39.01.001405-8:

Eram descontados todos aqueles valores e os trabalhadores saiam sem nada, eles não recebiam salário durante um período que ficavam lá e foram dispensados sem nada, sem pagamento de verbas rescisórias, porque o caderninho, no final, eles somaram as dívidas, não tinham nada para receber. (PARÁ, 2013B:4)

Ao final do serviço, por exemplo, realiza-se o ajuste e o empregado sempre está devendo. Em tese, tal prática deveria servir como forma de facilitar o acesso a tais bens, especialmente nos casos, em que as propriedades rurais são distantes de centros urbanos. A legislação pátria veda a adoção dessa medida, quando impulsionada pelo uso da coação ou induzimento, ou quando objetiva ampliar os ganhos do empregador. Enfatize-se que não há de caracterizar, nesse caso, contraprestação salarial in natura, pois não é ato de comércio, como se observa na situação aventada. Ademais, a própria lei n. 5889/73 estabelece os parâmetros percentuais permitidos de serem feitos, os quais devem sempre ser precedidos de autorização, por escrito. Na região amazônica, tal prática é conhecida como contrato de aviamento:

 O mecanismo do aviamento pode ser resumido, considerando uma relação trilateral. De um lado, o mercado regional vende bens ao aviador, que é o dono do barracão (aviamento fixo) ou do regatão (aviamento itinerante), que os avia ao pequeno produtor, o aviado, sem qualquer formalidade ou solenidade, e, às vezes, no caso do barracão, adianta-lhe algum dinheiro. O pequeno produtor pagará as mercadorias e o eventual adiantamento ao fim da safra, com os produtos que colher. No entanto, a realidade é que a conta jamais é encerrada, transformando o pequeno produtor ou trabalhador do interior da Amazônia em um devedor eterno do comerciante, significando, então, uma espécie peculiar de trabalho forçado, à medida que o aviado é obrigado a trabalhar para, produzindo, transferir a totalidade do obtido para seu credor. O aviador recebe os produtos colhidos e os repassa ao mercado regional. (FILHO apud ALVES 2008:49)

Muitas vezes o pagamento de salário complessivo é verificado nos casos de redução do trabalhador à condição análoga de escravo. O salário complessivo caracteriza-se não discriminação das parcelas salariais devidas ao empregado no ato de pagamento. A vedação a tal prática, prevista no artigo 462, par. 2º da CLT, também se aplica ao rurícola, considerando a disposição do artigo 1º da lei do trabalhador rural.

 Como se pode observar, foram poucas as condenações no relatório do período pesquisado. E ainda, nos processos em que há condenação, chama-nos atenção o efeito atenuante atribuído pelos magistrados, com base no artigo 66 do CPB: “a pena poderá ser ainda atenuada em razão de circunstancia relevante, anterior ou posterior ao crime, embora não prevista expressamente em lei”. A circunstância relevante a que o magistrado faz menção é a condenação na justiça do trabalho: “considerando que se efetuou o pagamento das verbas rescisórias, reduzo a sanção em 1 (um) ano e 20 (vinte) dias- multa, por força da circunstancia atenuante estatuída no artigo 66 do código penal” (PARÁ, 2013C:7).

 Fica evidente, mais uma vez, o relevo que é dado à infração trabalhista. A noção de que o pagamento de verbas rescisórias perante a justiça do trabalho é o foco e, portanto, um elemento atenuante. O artigo 66 do CPB foi utilizado como fundamento para a amenização da pena. Segundo o penalista Nucci (2014), a atenuante do artigo 66 é inominada:

 Trata-se de circunstância legal extremamente aberta, sem qualquer apego à forma, permitindo ao juiz imenso arbítrio para analisa-la e aplica-la. Diz a lei constituir-se atenuante qualquer circunstância relevante ocorrida antes ou depois do crime, mesmo que não esteja expressamente prevista em lei. (NUCCI, 2014:476).

 O julgador não agiu arbitrariamente, porém, trata-se de uma discricionariedade a aplicação dessa atenuante. Nesse caso o juiz se valeu do resultado da condenação trabalhista para atenuar a condenação criminal. Embora o magistrado possa se valer desse argumento,  depreende-se que são esferas de condenações distintas, que possuem nuances específicas. O mesmo raciocínio poderia se aplicar ao crime de improbidade administrativa, por exemplo, que, por admitir julgamento nas três esferas (administrativas, civil e criminal), aplicar-se-á uma espécie de “compensação” de uma das esferas em outra.

Outro ponto que reclamou destaque em nossa pesquisa é o “julgamento em atacado”. É público e notório o grande número de processos que, a cada ano, surgem nas varas federais de Marabá. Não por acaso, o crescente número deve-se também à sensação de impunidade que essas decisões produzem no seio social, impulsionando a ação dos malfeitores que agem no maior desprezo à norma penal.

Destaca-se, no início da análise, a repetição dos mesmos argumentos em várias sentenças. Embora, por se tratar do mesmo crime, alguns pontos são comuns e podem ser repetidos no fundamento, o que chama atenção é que esse “julgamento em atacado” pode impedir o acesso a uma prestação jurisdicional efetiva. Nos processos da seara penal, assim como em outro âmbito do poder judiciário, cada caso possui nuances próprias, visto que os agentes envolvidos, apesar de apresentarem características sociais semelhantes, apresentam variáveis.

As sentenças 2004.39.01.000549-0, 2004.39.01.000907-9, 2008.39.01.000042-0, embora de épocas distintas, porém julgadas na mesma vara, possuem argumentos idênticos, ou seja, a tratativa é a mesma no decorrer dos anos, apesar do tipo penal e as discussões a respeito do tema terem sofridos sensíveis alterações. Esse julgamento similar reproduz mais ainda uma invisibilidade social dos trabalhadores, além de se tornar um atentado ao acesso à justiça.

Em sua maioria, as sentenças absolutórias declaram a ausência de prova, ainda que, como no fragmento abaixo, exista o reconhecimento de trabalho degradante:

Conquanto se constate que houve prática de trabalho em condições inadequadas, não se pode imputar a nenhum dos réus as sanções penais do artigo 149 do código penal, uma vez que não foi comprovado judicialmente qualquer tipo de cerceamento de liberdade. (…) A prova produzida não comprova a existência de restrição à liberdade de locomoção dos trabalhadores, por intimidação ou vigilância armada. Não foram encontradas armas de fogo, tampouco se demonstrou a prática de coação sobre os obreiros. (…) Dessa forma. Embora sujeitos os trabalhadores a condições degradantes de labor, a punição pelo plágio não se justifica porque não comprovada a privação da liberdade, que é a marca consagrada da escravidão. (PARÁ, 2014A: 6)

Portanto, verifica-se que não havia condições saudáveis de trabalho, e o motivo de pedir arquivamento não é a falta de provas, mas o fato de não caracterizar trabalho escravo. Notadamente, há um forte apego dos magistrados ao mero formalismo da lei, preocupando-se pouco em realizar uma interpretação que promova a justiça social. Dalmo de Abreu Dallari critica esse posicionamento formal dos juízes:

Não se percebe preocupação com os interesses e as angústias das pessoas que dependem das decisões e que muitas vezes já não têm mais condições de gozar dos benefícios de uma decisão favorável, porque esta chegou quando os interessados já tinham sido forçados a abrir mão se seus direitos, arrastados pelas circunstancias da vida ou da morte. (…) Ainda é comum ouvir-se um juiz afirmar com orgulho vizinho da arrogância, que é “escravo da lei”. E com isso fica em paz com sua consciência, como se tivesse atingido o cume da perfeição, e não assume responsabilidade pelas injustiças e pelos conflitos humanos e sociais que muitas vezes decorrem de suas decisões. Com alguma consciência esse juiz perceberia a contradição de um juizescravo e saberia que um julgador só poderá ser justo se for independente. Um juiz não pode ser escravo se ninguém nem de nada, nem mesmo da lei. (DALLARI, 2010: 84)

Observe-se que, diante de conteúdo fático e de provas similares (pois todos as denúncias contem relatório de fiscalização dos auditores fiscais do trabalho), em alguns processos há posicionamentos diferentes de diversos magistrados. No relatório analisado, houve 9 condenações ao se considerar o artigo 149 do Código Penal, e um dos fundamentos do magistrado é justamente considerar que já houve a infração trabalhista independente da violação à dignidade dos trabalhadores. O fragmento abaixo revela posturas tão dispares dos magistrados em contextos semelhantes:

Em todas as situações acima listadas, percebe-se um grande desequilíbrio de forças, que vai além da mera subordinação que estigmatiza a relação de emprego. Houve exploração abusiva da força de trabalho e, mais do que privação de liberdade de locomoção, foi ferida a liberdade de autodeterminação dos trabalhadores de poder colocar fim à exploração a que estavam submetidos. (PARÁ, 2013C: 5) A culpabilidade do agente gerou significativo grau de reprovação social, uma vez que, em pleno século XXI, adotou práticas de tratamento desumano a trabalhadores rurais. O réu é primário. Não existem informações depreciativas acerca de sua conduta social, embora manifeste personalidade truculenta. Os motivos do crime baseiam-se no desejo de obter o maior lucro possível em detrimento de trabalhadores pouco escolarizados e pobres. O réu não apenas submeteu os trabalhadores a condições indignas de labor, como também contribuiu para frustrar inúmeros direitos trabalhistas. Os trabalhadores, se contribuíram para a ocorrência do delito, fizeram por necessidade de subsistência. (IDEM, 2013C:7)

O direito Penal é a ultima ratio, isto é, a última cartada do sistema legislativo, quando se entende que outra sanção não pode haver senão a criação da lei penal incriminadora, impondo sanção penal ao infrator (Nucci, 2014). Possui como uma das funções a indispensável proteção de bens jurídicos essenciais, protegendo de modo legítimo e eficaz os bens jurídicos fundamentais do indivíduo e da sociedade. Embora o problema social do crime de trabalho escravo na Amazônia, e, em especial, no sudeste paraense, tenha sido gerado por problemáticas sociais, políticas e econômicas, conforme já esmiuçado no capítulo 2, as consequências desse problema mal resolvido bate na porta do judiciário à procura de uma resposta à qual a jurisdição não pode se esquivar. Por outro lado, ainda que não haja inércia na prestação jurisdicional, o simples julgamento do crime sem levar em consideração todo o contexto ao qual os agentes estão inseridos, gera o efeito igual, senão pior, contribuindo ainda mais com a impunidade. Certo que a justiça federal, agindo solitariamente, não vai resolver o problema social instalado, porém, a sua indiferença ao problema irá contribuir ainda mais problema persiste.


Considerações finais

 Diante dos dados analisados, há um estimulo à reflexão sobre o problema do trabalho escravo no sudeste paraense, conectado com o que ocorre no Brasil. O trabalho escravo contemporâneo é um problema mundial, que precisa ser combatido com a cooperação de vários países. E várias ações efetivas devem ser tomadas internamente. Nesse sentido, não há como negar que o Ministério do Trabalho e Emprego e a Justiça do Trabalho tem avançado muito.

Conforme explicitado, os números de operações têm aumentado, bem como as libertações de trabalhadores, concomitantemente ao número de condenações na esfera laboral. Porém, as condenações criminais não vêm crescendo na mesma proporção que as atuações das demais frentes de combate à erradicação do trabalho escravo. A impunidade pode ser um dos motivos que têm levado a permanência e reprodução dessa prática na Amazônia.

Na análise, ficou evidente que a postura dos magistrados em descaracterizar o trabalho escravo contemporâneo, seja no seu aspecto degradante, servidão por dívida, ou mesmo restrição à liberdade de locomoção, ainda se baseia na imputação de que essas infrações devem ser julgadas única e exclusivamente na justiça do trabalho, e, em sua maioria, consideram o trabalho escravo como um traço cultural da Amazônia, como a realidade da miséria replicada.

 Desconsideram os princípios dos direitos humanos que o estado brasileiro assumiu na Constituição da República Federativa do Brasil, o fenômeno social que aqui ocorre, e que possue nuances e feições próprias. Essas feições deveriam servir para afirmar ainda mais a presença do delito previsto no tipo penal, e não como motivos para afastá-lo, visto que a violação à dignidade da pessoa humana é a mesma em qualquer lugar do mundo, sendo inúmeras as formas como ela se apresenta, a depender do tempo e do espaço e lógico, dos fatores culturais. O posicionamento dos magistrados tem ignorado tanto os princípios universais de direitos humanos, quanto ao contexto do fenômeno social ao qual ele também está inserido. Por esse motivo, a pesquisa se dedicou, nas seções anteriores, a explanar esses dois parâmetros.

A máxima efetivação dos direitos humanos, e, consequentemente, dos direitos fundamentais, perpassa pelo reconhecimento do papel do estado na relação com os seus cidadãos e na regulação dos particulares com seus pares.

Não por acaso, o Brasil tem sido condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, justamente por permitir em seu território práticas tão primitivas de degradação do homem pelo homem. Dessa forma, caso o estado-juiz não intervenha efetivamente, ainda que seja com a mão pesada do direito penal, as agressões aos direitos continuarão a se perpetuar. Infelizmente, os tribunais criminais têm caminhado na contramão do que o próprio estado brasileiro se propõe a extirpar.

O trabalhador do campo não deve sofrer demérito por sua própria condição de ser do campo, ser pobre ou ter sido recrutado. Nenhum desses fatores autorizam a sua exploração. Ao contrário, o fato de ser homem e possuir dignidade desautoriza qualquer prática de exploração e coisificação.


Notas

(6) Franco Filho conceitua o mecanismo do aviamento como uma relação trilateral: de um lado, o mercado regional vende bens ao aviador, que é o dono do barracão (aviamento fixo) ou do regatão (aviamento itinerante), que os avia ao pequeno produtor, o aviado, sem qualquer formalidade ou solenidade, e as vezes, no caso do barracão, adianta-lhe algum dinheiro. O pequeno produtor pagará as mercadorias e o eventual adiantamento ao fim da safra, com os produtos que colher. No entanto, a realidade a conta jamais é encerrada, transformando o pequeno produtor ou trabalhador do interior da Amazônia em devedor eterno do comerciante, o que significa, então, uma espécie de trabalho forçado, na medida em que o aviado é obrigado a trabalhar para, produzindo, transferir a totalidade do obtido ao seu credor. O aviador recebe os produtos colhidos e os repassa ao mercado regional. (FRANCO FILHO, apud CHAVES, 2006:89) 

(7) OLIVEIRA (1987); HALL (1989); LOUREIRO (1992); SCHMINK (1992); MARTINS (1993).

(8) Conhecidos como recrutadores de mão-de-obra escrava, prometem bons salários, boas condições de trabalho, e em algumas situações até adiantam dinheiro à família do trabalhador, iniciando assim o ciclo da escravidão por dívida.

(9) No mesmo sentido essa declaração de Noberto Bobbio: “Quais são os limites dessa possível (e cada vez mais certa no futuro) manipulação? Mais uma prova, se isso ainda fosse necessário, de que os direitos não nascem todos de uma vez. Nascem quando devem ou podem nascer. Nascem quando o aumento do poder do homem sobre o homem — que acompanha inevitavelmente o progresso técnico, isto é, o progresso da capacidade do homem de dominar a natureza e os outros homens — ou cria novas ameaças à liberdade do indivíduo ou permite novos remédios para as suas indigências: ameaças que são enfrentadas através de demandas de limitações do poder; remédios que são providenciados através da exigência de que o mesmo poder intervenha de modo protetor” (BOBBIO, 2004: 8). 

(10)  Alguns doutrinadores, faz a divisão dos direitos humanos em gerações. Consideramos a divisão apenas para fins didáticos. Nesse trabalho não nos ateremos a aprofundar essa divisão.

(11) O Grupo Móvel, formado por Fiscais do Trabalho, Policiais Federais e Procuradores do Trabalho, coordenado pela própria Secretaria de Inspeção em Brasília, passou a atuar de maneira independente, atendendo às denúncias da CPT vindas de todos os lugares, principalmente no Sul do Pará, Norte de Mato Grosso, Maranhão, Tocantins e Bahia. Apesar do esforço individual daqueles agentes do Estado envolvidos na repressão ao problema e das milhares de pessoas que começaram a ser encontradas e resgatadas das perversas condições de aprisionamento por dívida e ameaças, nem sempre ao longo dos anos, essa estrutura oficial teve o suporte logístico, técnico e principalmente político. (AUDI, 2006:76)

(12) Kant, fazendo uma divisão entre os seres, em reino ideal por ele concebido, ao qual denomina “reino dos fins”, afirma: “No reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem preço, pode-se pôr em vez dela qualquer outra coisa como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e, portanto não permite equivalente, então ela tem dignidade” (BRITO FILHO, 2013:37).

(13) A questão adquire relevância quando se consideram as importantes alterações na maneira de se gerirem as empresas, experimentadas em nosso novo, e precário, mundo do trabalho (ALVES, 2000), identificadoras de um novo espírito do capitalismo (BOLTANSKI & CHIAPELO, 2002) no qual a intensidade do trabalho resta potencializada para ampliação crescente das margens de lucro (RAMOS FILHO, 2008: 19).

(14) Foi o que decidiu o STF, em 2007 na ADIN nº 3684-0 para atribuir interpretação conforme a CF ao inciso I do artigo 114, CF.


Referências 

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Processos com sentenças analisadas 

PARÁ. JUSTIÇA FEDERAL. Ação Penal nº 2007.39.01.000538-4. Ministério Público Federal/Antônio Carlos Carvalho da Silva. 1ª Vara. Juiz Marcelo Honorato, 11.11.2016 (A). PARÁ. JUSTIÇA FEDERAL. Ação Penal nº: 8483-39.2010.4.01.3901. Ministério Público Federal/Anomildo Pimenta e outras. 1ª Vara. Juiz Marcelo Honorato, 10.11.2016 (B).

PARÁ. JUSTIÇA FEDERAL. Ação Penal nº: 2004.39.01.000549-0. Ministério Público Federal/Celso Chuquia Mutran e outros. 1ª Vara. Ricardo Beckerath da Silva Leitão, 17.09.2013 (A).

PARÁ. JUSTIÇA FEDERAL. Ação Penal nº: 2008.39.01.001405-8. Ministério Público Federal/José Braz da Silva e outros. 1ª Vara. Ricardo Beckerath da Silva Leitão, 12.09.2013 (B).

PARÁ. JUSTIÇA FEDERAL. Ação Penal nº: 2008.39.01.001483-2. Ministério Público Federal/Luzmar Camilo da Silva e outros. 1ª Vara. Ricardo Beckerath da Silva Leitão, 17.10.2013 (C).

PARÁ. JUSTIÇA FEDERAL. Ação Penal nº: 2009.39.01.000121-6. Ministério Público Federal/Welson Moreira da Luz. 1ª Vara. Ricardo Beckerath da Silva Leitão, 06.10.2014 (A).

PARÁ. JUSTIÇA FEDERAL. Ação Penal nº: 2009.39.01.000519-0. Ministério Público Federal/João Oliveira Guimarães Neto. 1ª Vara. Ricardo Beckerath da Silva Leitão, 30.09.2014 (B).

PARÁ. JUSTIÇA FEDERAL. Ação Penal nº: 6190-96.2010.4.01.3901. Ministério Público Federal/Alsoni José Malinski e outros. 1ª Vara. Juiz Marcelo Honorato, 04.04.2016 (C).

PARÁ. JUSTIÇA FEDERAL. Ação Penal nº: 2008.39.01.001492-1. Ministério Público Federal/ Silvana Santana Dantas e outros. 1ª Vara. João Cesar Otoni de Matos, 23.04.2013 (D).

PARÁ. JUSTIÇA FEDERAL. Ação Penal nº: 6044-21.2011.4.01.3901. Ministério Público Federal/Luiz Otávio Fontes Junqueira e outros. 1ª Vara. Juiz Marcelo Honorato, 04.03.2016 (D).


Autor

  • Heide Patricia Nunes de Castro

    Graduação em Direito- Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará- UNIFESSPA. Gaduação em Letras- Universidade Federal do Pará- UFPA. Especialista em Gestão Publica- UFPA. Especialista em Direito do Trabalho - Instituto Pro-Minas

    Textos publicados pela autora


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTRO, Heide Patricia Nunes de. O trabalho escravo contemporâneo no sudeste paraense: uma análise das sentenças criminais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6569, 26 jun. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/91510. Acesso em: 8 maio 2024.