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Utilização das algemas pelos servidores da área de segurança pública

Utilização das algemas pelos servidores da área de segurança pública

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No Brasil, o uso das algemas pelos Servidores da Área de Segurança Pública está devidamente regulamentado constitucional e infraconstitucionalmente?

Resumo: O tema deste trabalho é a utilização das algemas no ordenamento jurídico. Diante disso, surgiu a seguinte pergunta: no Brasil, o uso das algemas pelos Servidores da Área de Segurança Pública está devidamente regulamentado constitucional e infraconstitucionalmente? Assim, esta monografia tem como objetivo geral analisar a utilização do uso das algemas pelos servidores da área de segurança pública sob o enfoque constitucional e infraconstitucional, sendo utilizada a pesquisa exploratória e tendo como referência levantamentos bibliográficos como forma de humanizá-los aos designíos de um Estado Democrático de Direito. Por fim, conclui-se, que deve haver uma reflexão entre os estudiosos do direito, bem como de toda sociedade civil organizada a respeito do uso das algemas, isenta de paixões ou parcialidades, em prol de uma sociedade mais justa e solidária na busca de se recuperar o senso ético e moral como fonte basilar de um Estado em que se tem o Princípio da Dignidade Humana como célula mater de todo o sistema jurídico.

Palavras-chave: Algemas. Servidores da Área de Segurança Pública. Dignidade da Pessoa Humana.

Sumário: 1. Considerações iniciais. 2. Conceito, histórico, fundamentação jurídica e servidores de segurança pública no âmbito das algemas. 2.1 Conceito etimológico da palavra “algemas”. 2.2 Evolução histórico-legislativo do uso das algemas no Brasil. 2.3 Fundamentação jurídica do uso das algemas. 2.3.1 Do poder de polícia. 2.3.2 Dos atributos do poder de polícia. 2.3.2.1 Da discricionariedade. 2.3.2.2 Da autoexecutoriedade. 2.3.2.3 Da coercibilidade. 2.4 Servidores de segurança pública no âmbito das algemas. 3 Princípios e direitos fundamentais intrínsecos ao uso das algemas. 3.1 Princípios intrínsecos ao uso das algemas. 3.1.1 Do princípio da legalidade. 3.1.2 Do princípio da dignidade da pessoa humana. 3.1.3 Do princípio da presunção de inocência (não culpabilidade). 3.1.4 Do princípio da razoabilidade e da proporcionalidade. 3.2 Direitos balizadores sobre a utilização das algemas. 3.2.1 Do direito de imagem. 3.2.2 Do direito à proibição datortura. 3.2.3 Do abuso de autoridade. 4. Disciplina normativa sobre o uso das algemas. 4.1 Da lei de execução penal. 4.2 Do código de processo penal. 4.3 Do Código de Processo Penal Militar. 4.4 Do Estatuto da Criança e do Adolescente. 4.5 Das leis de segurança da água e do ar. 4.6 Das normas do estado de São Paulo. 4.7 Das regras mínimas para o tratamento do preso no Brasil. 4.8 Da súmula vinculante nº 11, do supremo tribunal federal. 5 Considerações finais. Referências.


1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O presente trabalho monográfico analisa a utilização das algemas no ordenamento jurídico, uma vez que elas ainda são fontes de polêmica entre doutrinadores, juristas e sociedade em geral. Por isso, tem como problema: no Brasil, o uso das algemas pelos Servidores da Área de Segurança Pública está devidamente regulamentado constitucional e infraconstitucionalmente? .

Esse tema foi escolhido pelo fato de não existir uma lei específica regulamentando o uso das algemas no Brasil, entretanto existem algumas leis do ordenamento jurídico que podem nortear os servidores da área de segurança pública de forma a minimizar as incertezas, evitando-se, por conseguinte, abusos e arbitrariedades.

Nesse sentido, é de suma importância identificar quais situações poderiam ensejar um algemamento correto e que não ferissem princípios e direitos previstos na Constituição Federal de 1988 como, por exemplo, dignidade da pessoa humana ou mesmo a imagem das pessoas, uma vez que tudo é transmitido de forma simples e rápida pelos meios de comunicação social (facebook, whatsapp, instagram, jornais, revistas) facilitando a divulgação das ocorrências envolvendo servidores de segurança pública que utilizam as algemas durante seu dia-a-dia. Com isso, a sociedade poderia participar mais ativamente no intuito de evitar arbitrariedades, bem como auxiliar quando necessário.

Tudo isso, nos mostra que essa celeuma não se encontra pacificada, mas que podem gerar consequências desastrosas quando utilizadas erroneamente, haja vista que as algemas é um instrumento essencial ao serviço de segurança pública, bem como visa à garantia da lei e da ordem, inclusive prevenindo fugas ou reações durante o transporte, ou mesmo quando for conduzido até à autoridade policial.

Assim, o objetivo geral deste trabalho é voltado a analisar a utilização do uso das algemas pelos servidores da área de segurança pública sob o enfoque constitucional e infraconstitucional e como objetivos específicos apresentar os aspectos que envolvem a utilização das algemas, tendo por base o histórico-legislativo, a fundamentação jurídica e os servidores de segurança pública, bem como discorrer sobre a amplitude do uso das algemas sob o enfoque dos princípios Constitucionais e dos direitos fundamentais e identificar a disciplina jurídico-normativa sobre o uso das algemas no ordenamento jurídico brasileiro.

A metodologia utilizada será a pesquisa exploratória que segundo Gil (2009, p.41) tem o objetivo “proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito”, ou seja, sua finalidade é tornar mais fácil e prazeroso o aprimoramento das ideias ou o descobrimento de novos institutos que viabilize a pesquisa científica dos mais variados seguimentos.

Uma das formas de realizar essa pesquisa é tendo como base levantamentos bibliográficos, como bem afirma Lakatos e Marconi (2009, p.43) trata-se do “levantamento de toda bibliografia já publicada, em forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita”, isto é, informações pertinentes de autores renomados advindos de artigos científicos, livros, revistas, jornais entre outros a fim de facilitar a compreensão sobre o estudo das algemas no ordenamento jurídico.

Diante dessas considerações iniciais, insta salientar que será abordado no Capítulo II o conceito de algemas, sua evolução histórico legislativo, bem como os fundamentos jurídicos que sedimentam a sua essência e quais servidores de segurança pública estão imbuídos na missão de realizar a segurança pública no Brasil.

No Capítulo III, serão elencados os mais importantes princípios basilares que nortearão os servidores da área de segurança pública na prática policial como Legalidade, Dignidade da Pessoa Humana, Presunção de Inocência, Razoabilidade e Proporcionalidade, como também os direitos que poderão ser violados caso haja excesso na atuação desses servidores e, por fim, termina com as considerações finais.

Portanto, para que as algemas sejam utilizadas de forma eficaz, necessita-se que os servidores da área de segurança pública estejam capacitados, a fim de garantir e efetivar os princípios e direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988, bem como, atentos aos preceitos contidos na legislação infraconstitucional.


2. CONCEITO, HISTÓRICO, FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA E SERVIDORES DE SEGURANÇA PÚBLICA NO ÂMBITO DAS ALGEMAS

O presente tópico analisará, inicialmente, o conceito etimológico da palavra “algemas”. Logo após, será apresentado à evolução histórico-legislativa sobre as algemas no Brasil, a fundamentação jurídica que serve de alicerce e legitimação e, por fim, quais os servidores da área de segurança pública estarão realizando esse tipo de procedimento.

2.1 Conceito Etimológico da Palavra “Algemas”

O significado da palavra algemas, segundo Bueno (1963, p. 166) “vem do Árabe al-jemme ou al-jemma, que significa pulseira”, isto é, um par de argolas metálicas cada qual com sua fechadura ligada entre si a fim de reduzir as possibilidades de fuga ou remoção.

Daí pode-se perceber mais detalhadamente que algemas, de acordo com Camargo (2008, p. 6) são:

Normalmente fabricada com metal resistente, constituída de duas peças, unidas por uma corrente. Cada uma delas possui uma parte móvel, dentada, que ao ser introduzida no corpo da algema, passa por uma catraca que não permite que se abra, salvo por meio do uso de chave. Existem algemas de metal para dedos, pulsos e tornozelos, e há algumas delas descartáveis.

Diante disso, pode-se perceber que as algemas são geralmente fabricadas com um metal dotado de certa resistência e composto por duas peças móveis unidas por uma corrente, basicamente possui a finalidade de fazer com que o algemado não tenha condições de quebrá-la ou mesmo abri-la com facilidade, podendo ser utilizada tanto nos membros inferiores como superiores, ou ambos, por exemplo, pulsos, pés, inclusive dedos.

Vencido o conceito etimológico da palavra “algemas” da qual é possível depreender o seu verdadeiro sentido tão somente pelo seu significado, sendo de suma importância, nesse momento, compreender a evolução histórica legislativa do uso das algemas no território nacional.

2.2 Evolução Histórico-Legislativo do uso das Algemas no Brasil

É de grande relevância para o estudo sobre as algemas compreender a evolução histórico-legislativa, pois nela tem-se como descobrir, a princípio, sua real finalidade, mesmo sendo observada por muitos somente seu aspecto negativo, e compará-la com os princípios fundamentais da nossa Constituição Federal de 1988, mais conhecida por “Constituição Cidadã”.

No entender de Gomes (2012, p. 4) o uso das algemas no Brasil ocorreu no Século XVI onde:

Aplicava-se no Brasil o direito português, de tradição romano-germânica, em razão da colonização. Com a União Ibérica (o rei da Espanha era também rei de Portugal), vigoraram no Brasil as Ordenações Filipinas. Como a igualdade não era um princípio consagrado no início da idade Moderna, havia tratamento diferenciado para os filhos da nobreza ou para aqueles que ocupavam cargos importantes no Estado.

O Brasil no Século XVI era regido pelas Ordenações Filipinas, que teve o seu nascedouro no direito português porque nessa época era adotado o sistema de colônia hereditária. Assim, o poder estava centralizado na figura do rei, que também possuía a atribuição de inovar no ordenamento jurídico daquela época, não foi diferente quando ao uso das algemas, pois pessoas da alta nobreza como, por exemplo, filho do rei ou mesmo aqueles que ocupavam cargos importantes para o Estado não seriam algemados, enquanto outras pessoas poderia sofrer esta restrição sem ressalvas.

Cabe lembrar que antes das algemas propriamente dita existiam os grilhões, que à época, segundo Biderman (1998. p. 486) significa “corrente”. Ou seja, este instrumento servia para prender tantos os pulsos como os tornozelos, sendo ligada a barra metálica ou corrente, sendo sua finalidade primordial limitar o deslocamento ou a fuga, sendo esta prática assemelhada à tortura.

Nesse contexto, existia certa utilidade para os grilhões, pois eram mais difíceis de ser danificados ou removidos pelos escravos. Segundo Cerqueira (2011, p. 1) “os grilhões foram bem vindos, podiam ser usado nos pulsos e pés, e eram mais difíceis de serem removidos. Porém, tinham uma desvantagem, por não serem reguláveis, era preciso fabricar os grilhões de vários tamanhos”. Com isso, ficaria mais oneroso para o Estado ter que fabricar grilhões de todos os tipos, para se adequar as proporções corporais de cada pessoa.

Importante observação feita por Carnelutti (2013, p. 20) sobre a simbologia que representa as algemas para o direito, o qual define que:

As algemas são um símbolo do direito; quiçá, a pensar-se, o mais autêntico de seus símbolos, ainda mais expressivo que a balança e a espada. É necessário que o direito nos ate as mãos. E justamente as algemas servem para descobrir o valor do homem, que é, segundo um grande filósofo italiano, a razão e a função do direito.

O homem em um momento de inconsciência e fúria pode extrapolar os limites do senso comum, mas em alguns casos com a utilização das algemas pode o infrator da lei reaparecer saindo da escuridão e, tornando-se ao estado de consciência, pois a partir do momento em que o seu direito é cerceado e, que as atitudes nefastas desaparecem é justamente o ponto em que ocorre a mutação do horror, a compaixão.

No Brasil império sob a égide do Decreto nº 4.824 de 22 de novembro de 1871, que regulamentava a Lei nº 2.033 de 24 de setembro do mesmo ano, minorava o uso das algemas no Brasil, entretanto, não era levado em conta o patamar social que o agente infrator da norma estava inserido, inclusive era prevista multa que deveria ser pago à autoridade, caso o condutor não justificasse a utilização das algemas.

Nesse sentido, o artigo 28 do Decreto nº 4.824/71 (p. 8-9) previa o seguinte:

Art.28, in verbis - Além do que está disposto nos arts. 12 e 13 da Lei, a autoridade que ordenar ou requisitar a prisão e o executor dela observarão o seguinte:

O preso não será conduzido com ferros, algemas ou cordas, salvo o caso extremo de segurança, que deverá ser justificado pelo condutor; e quando não justifique, além das penas em que incorrer, será multado na quantia de 10$000 a 50$000 pela autoridade a quem fôr apresentado o mesmo preso.

Sobre o artigo supracitado cabe verificar que o uso das algemas sofreu certa limitação, mostrando uma evolução a fim de garantir direitos do cidadão, pois o seu uso exige agora uma circunstância extrema que a legitime, inclusive que esse ato seja justificado pelo condutor, caso não seja encontrado motivos que a legitimem restará o arbitramento de uma multa pela autoridade que for apresentado o preso.

Outra mudança significativa dessa época fez surgir, Segundo Gomes (2012, p. 5) a “construção de muros nas prisões, bem como da própria estrutura das celas, era desnecessário que o condenado fosse acorrentado dentro de um espaço mínimo, tendo em vista a condição de vida no cárcere”. Com isso, resta demonstrado que o Estado, paulatinamente, vem se preocupando com a humanização das penas também durante a fase de execução da pena, inclusive na ressocialização do apenado.

Após a regulamentação do Decreto nº 4.824/71 e da Constituição da República de 1891 o uso das algemas ficou bastante limitado, pois os fins do Estado não visava apenas punir, mas também humanizar a pena de forma a garantir o retorno do apenado ao convívio social, Herbella (2014, p. 25) salienta que:

As algemas foram evoluindo, em sua forma, e sendo cada vez mais utilizadas por diversas outras sociedades. Desses grilhões foi se aperfeiçoando o instrumento contentor das mãos até os presentes modelos, modernos e sofisticados, das algemas, que passaram a ser usadas por todas as outras sociedades e estão presentes até a atualidade, sem qualquer indício de abolição.

As algemas foram se aperfeiçoando, mesmo de forma tardia, com o decorrer dos anos, sendo cada vez mais menos utilizados, uma vez que direitos fundamentais foram sendo reconhecidos pelo Estado. Com a promulgação da Carta Magna de 1988, em que teve como ponto central o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, Presunção de Inocência, entre outros direitos que formam o sustentáculo de um Estado Democrático de Direito, como será visto mais adiante.

Antes disso, é bom ressaltar nesse momento sobre a fundamentação jurídica do uso das algemas, haja vista que é pressuposto para a sua legitimação e, que vincula, de certa forma, o ato praticado a possíveis abusos caso sejam desnecessários e reprováveis por parte do Estado.

2.3. Fundamentação Jurídica do uso das Algemas

Os fundamentos são a base que legítima o uso das algemas para que os servidores da área de segurança pública possam utilizá-la, conforme preconiza o mandamento legal. Tal atribuição tem o seu respaldo no Poder de Polícia e seus atributos.

Assim, será verificado o conceito de poder de polícia, bem como os seus atributos que são: discricionariedade, autoexecutoriedade e coercibilidade.

É de alto e bom tom que o uso das algemas não seja realizado de forma deliberada, devendo observância a determinados princípios e direitos que serão abordados em tópico separado.

2.3.1 Do Poder de Polícia

O Conceito de Poder de Polícia encontra-se positivado na Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), em seu artigo 78 (p. 16-17), a saber:

Art. 78. In verbis. Considera-se poder de polícia a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

Parágrafo único – Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

Como forma de garantir que os direitos sejam protegidos e, que se evitem irregularidades aos particulares é conferida ao Estado o poder de fiscalização e repressão de condutas que afrontem interesse coletivo seja limitando ou disciplinando bens jurídicos como higiene, ordem, costumes e outros a fim de manter a tranquilidade e a segurança jurídica entre os indivíduos. Adverte o dispositivo que o exercício do poder de polícia deve ser aplicado nos limites previstos pela norma, com observância do processo legal, sem abuso ou desvio de poder.

Nesse seguimento o conceito de poder de polícia adotado por Di Pietro (2012, p. 123) é considerado como a “atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público”. Ou seja, o poder de polícia serve para garantir que os indivíduos não atentem contra bens e interesses de caráter coletivo como, por exemplo, saúde, meio ambiente, propriedade, segurança a fim de manter a paz e a tranquilidade social.

Nesse mesmo sentido de forma complementar Alexandrino e Paulo (2013, p. 243) afirma que existem duas acepções de poder de polícia uma ampla e outra restrita, a saber:

Alguns autores adotam uma acepção ampla de poder de polícia, abrangendo não só as atividades, exercidas pela administração pública, de execução e de regulamentação das leis em que ele se fundamenta, mas também a própria atividade de edição das leis, desempenhada pelo Poder Legislativo.

Em sentido estrito, o poder de polícia não inclui a atividade legislativa, mas tão somente, as atividades administrativas de regulamentação e de execução das leis que estabelecem normas primárias de polícia.

Nesse sentido, pode-se dizer que existem duas vertentes quanto se trata de poder de polícia, uma ampla e outra mais restrita, sendo a primeira (ampla) abrangida pela atividade de execução e de regulamentação das leis e a atividade de edição das leis; e a segunda (estrito) abrangendo somente a atividade de execução das leis. Assim sendo, a posição mais acertada seria pela mais restrita, uma vez que o poder de polícia tem como pressuposto o princípio da legalidade que orienta o legislador a estrita observância desse seguimento para que, ao impor uma limitação ou proibição, deverá atender tal princípio.

O poder de polícia pode ser dividido em dois seguimentos como bem afirma Di Pietro (2012, p. 124) ao dizer que “a principal diferença que se costuma apontar entre as duas está no caráter preventivo da polícia administrativa e no repressivo da polícia judiciária”. Ou seja, a polícia administrativa tem o fim de impedir que o crime aconteça (prevenir a incidência de infração penal), e a segunda, punir àqueles que já incorreram no delito (infração consumada).

Cabe ressaltar um ponto importante dado por Herbella (2014, p.129) no qual aduz o seguinte:

Embora muitos confundam, o Poder de polícia não se refere só às polícias judiciárias e militares, mas a elas também é conferido, enquanto órgãos integrantes da Administração Pública. Não resta dúvida de que o agente de autoridade, independentemente de sua natureza, quando procede ao ato de algemar, está exercendo o poder de polícia a ele conferido. O ato será então lícito quando a necessidade se fizer, com base, também, no parágrafo único do artigo supra-referido, que observa o desvio e o abuso de poder.

Nesse sentido, o poder de polícia pode ser atribuído, dentro dos parâmetros legais, a outros órgãos da Administração Pública além das polícias militares e judiciárias como, por exemplo, um agente da vigilância sanitária que poderá, no uso de suas atribuições, utilizar-se desse poder para fechar um estabelecimento caso não observe as normas aplicadas àquele setor. Por isso, a amplitude do poder de polícia paira sobre todas as condutas ou situações particulares que possam, direta ou indiretamente, afetar o interesse público.

2.3.2 Dos Atributos do Poder de Polícia

Diante do conceito de poder de polícia já superado anteriormente, percebe-se que este poder apresenta algumas características peculiares ao seu exercício, dentre as quais se destacam: Discricionariedade, Autoexecutoriedade e Coercibilidade.

2.3.2.1 Da Discricionariedade

O atributo da discrionariedade é entendido, segundo Alexandrino e Paulo (2013, p.255 e 256) quanto à “administração, quanto aos atos a ele relacionados, regra geral, dispõe de uma razoável liberdade de atuação, podendo valorar a oportunidade e conveniência de sua prática”. Isso incorre no direito que o servidor da área de segurança pública dispõe para valorar, dependendo do caso concreto, a possibilidade ou não da utilização das algemas, pois o legislador ordinário não poderia elencar taxativamente as hipóteses em que se deva ou não utilizá-las diante da complexidade que a circunda.

Complementando este raciocínio Di Pietro (2012, p. 125) afirma que a Discricionariedade:

Embora esteja presente na maior parte das medidas de polícia, nem sempre isso ocorre. Às vezes, a lei deixa certa margem de liberdade de apreciação quanto a determinados elementos, como o motivo ou o objeto, mesmo porque ao legislador não é dado prever todas as hipóteses possíveis a exigir a atuação de polícia. Assim, em grande parte dos casos concretos, a Administração terá que decidir qual o melhor momento de agir, qual o meio de ação mais adequado, qual a sanção cabível diante das previstas na norma legal.

Diante disso, pode-se dizer que o ato que se funda o uso das algemas exige certa discricionariedade, pois as condições de tempo, lugar ou circunstância podem demonstrar a necessidade de sua utilização, isto é, como o legislador não tem o condão de prever todas as circunstâncias que podem ensejar o algemamento de qualquer pessoa, cabe sua valoração a depender do caso concreto a fim de melhor cumprir o mister.

2.3.2.2 Da Autoexecutoriedade

A autoexecutoriedade pode ser definida, segundo Meirelles (2011, p. 143) como a “faculdade de a Administração decidir e executar diretamente a sua decisão por seus próprios meios, sem intervenção do judiciário”. Nesse interregno, o atributo demonstra que não se exige autorização do Poder Judiciário para executar algum ato da Administração Pública, ou seja, não existe nesse caso a cláusula de reserva jurisdicional, isto é, que passe obrigatoriamente pelo crivo do poder judiciário para que o ato seja válido, bastando somente que o ato esteja conforme os ditames legais, tendo sempre a cautela de evitar excessos desnecessários.

Cabe a advertência de Herbella (2014, p.129) nesse sentido onde afirma que “para que seja coibido o abuso, por parte do poder estatal, exercido através das polícias, deverá haver um imenso aperfeiçoamento dos seus agentes, para que conheçam os limites da lei, a ser cumprida de forma consciente”. Dessa forma, fica claro que o Estado deverá agir contundentemente no aperfeiçoamento técnico e profissional para que os direitos e garantias não sejam violados evitando-se, por conseguinte, abusos imoderados por parte daqueles que atuam em nome do Estado.

No que tange a responsabilidade civil, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, §6 (p.31) afirma que:

Art. 37, § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

O artigo 37, §6 da Constituição da República atual fomenta que caso haja algum abuso por parte de qualquer servidor integrante dos órgãos públicos que acarretar em prejuízo a terceiros, o Estado será responsabilizado civilmente, sem prejuízo do direito de regresso aos responsáveis nas hipóteses de dolo ou culpa.

2.3.2.3 Da Coercibilidade

Para esse último atributo do Poder de Polícia cabe à definição dada por Alexandrino e Paulo (2013, p.258) no qual pontifica que o atributo da coercibilidade “traduz-se na possibilidade de as medidas adotadas pela administração pública serem impostas coativamente ao administrado, inclusive mediante o emprego da força”. Para um bom entendedor, esse atributo fortifica ainda mais a utilização das algemas nos casos em que o particular resista, desobedeça ou atente contra ato legal do Estado.

Esse atributo também não exige autorização prévia do judiciário, pois pode este órgão verificar sua legalidade após o ato, sendo entendido como contraditório diferido e, se for o caso, pode causar a anulação, reparação ou indenização, sempre que o particular comprove o desvio ou excesso de poder (ALEXANDRINO; PAULO, 2013, p. 258-259).

Para se buscar uma melhor abrangência do estudo a que se propõe esta monografia é importante frisar também quais são os servidores da área de segurança pública que estarão imbuídos na utilização das algemas no território nacional e que fazem desse instrumento acessório obrigatório no seu dia a dia.

2.4 Servidores de Segurança Pública no Âmbito das Algemas

Nesse item serão identificados quais os atores principais da segurança pública, que utilizam as algemas no território nacional, uma vez que é suma importância, nos tempos de hoje, onde se busca ainda mais a concretização dos direitos e garantias fundamentais como forma de mitigar arbitrariedades e injustiças a fim de salvaguardar o Estado Democrático de direito.

Para Carvalho Filho (2014, p. 641) agentes públicos tem sentido abrangente e significa:

O conjunto de pessoas que, a qualquer título, exercem uma função pública como prepostos do Estado. Essa função, é mister que se diga, pode ser remunerada ou gratuita, definitiva ou transitória, política ou jurídica.

Nesse mesmo sentido o artigo 2º da Lei 8.429, de 2 de junho de 2002 (p.1), Lei de Improbidade Administrativa, estabelece que agente público é:

Todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.

Assim, todo aquele que pratique atos como representante do Estado, nos termos da lei, será considerado agente público, sujeito as sanções de cunho administrativo, civil ou penal caso atue com abuso de poder.

Para Mazza (2013, p.406) agentes públicos é gênero pelos quais comportam as seguintes espécies:

  • a) agentes políticos;

  • b) ocupantes de cargos em comissão;

  • c) contratados temporários;

  • d) agentes militares;

  • e) servidores públicos estatutários;

  • f) empregados públicos;

  • g) particulares em colaboração com a Administração (agentes honoríficos).

O conceito de agentes públicos é um tanto quanto abrangente, não poderia ser diferente, pois o simples fato exercer uma função vinculada a qualquer ente estatal seja da administração direta, indireta ou fundacional em quaisquer modalidades temporária ou permanente faz com que o agente atue como se Estado fosse, pois este se manifesta por meio de pessoas físicas e que, caso cometam algum ilícito, a responsabilidade acaba desaguando ao próprio Estado, pois agem em seu nome deste.

Nesse sentido, buscando uma melhor interpretação voltada aos órgãos de segurança pública elencados no artigo 144, da Constituição de 1988, onde o mais adequado é o uso termo servidor público, pois é regido por um estatuto.

Com isso, no entender de Meirelles (2011, p.463) se trata de:

subespécie dos agentes públicos administrativos, categoria que abrange a grande massa de prestadores de serviços à Administração e a ela vinculados por relações profissionais, em razão de investidura em cargos e funções, a título de emprego e com retribuição pecuniária.

Não é objeto desse trabalho monográfico explicar todos os conceitos a respeito de agentes públicos, mas apenas dos servidores públicos estatutários que integram a frente voltada à segurança pública, uma vez que exercem um vínculo com o ente estatal de forma profissional, não eventual e remunerada, bem como atuam com o viés de manter a paz social e preservar a incolumidade física das pessoas.

A partir disso, o artigo 144, da Constituição Federal de 1988 (p. 87 - 88) contido no Título V que trata da Defesa do Estado e Das Instituições Democráticas, elenca quais os órgãos que exercem a função precípua de realizar a segurança pública, a saber:

Art. 144. Segurança pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;

II - polícia rodoviária federal;

III - polícia ferroviária federal;

IV - polícias civis;

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.

Em apertada síntese, pode-se entender que os servidores da área de segurança pública são pessoas físicas que exercem os fins do Estado de forma vinculada, haja vista uma necessidade de preservação a ordem pública, incolumidade das pessoas e do patrimônio público, sendo exercidas pelos órgãos da polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Ferroviária Federal, Polícias Civis, Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares. Umas exercendo o papel de polícia de segurança que tanto pode ser ostensiva (preventiva) que visa evitar o cometimento de infrações penais, por exemplo, Polícia Militar, e outras na forma de Polícia Judiciária (repressiva) atuando na investigação e apuração de infrações penais, por exemplo, a Polícia Civil.

Segundo Bulos (2014, p.1454) a segurança pública seria praticamente a “manutenção da ordem pública interna do Estado. A ordem pública interna é o inverso da desordem, do caos, da desarmonia social, porque visa preservar a incolumidade da pessoa e do patrimônio”. Ou seja, a segurança pública visa manter a uma sensação tranquilidade e paz social entre as pessoas, proporcionando uma convivência tranquila e harmônica. Noutro giro, pode-se dizer também que está intrínseca a característica de reprimir a prática de delitos, uma vez que é comum a incidência de pessoas desvirtuadas que buscam burlar o sistema normativo.

Os parágrafos do artigo 144 da Constituição Federal de 1988 (p.88) indicam que:

§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:

I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;

II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência;

III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras;

IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.

§ 2º A polícia rodoviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das rodovias federais.

§ 3º A polícia ferroviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais.

§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

§ 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.

§ 6º As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

§ 7º A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.

§ 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.

§ 9º A remuneração dos servidores policiais integrantes dos órgãos relacionados neste artigo será fixada na forma do § 4º do art. 39.

§ 10. A segurança viária, exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do seu patrimônio nas vias públicas:

I - compreende a educação, engenharia e fiscalização de trânsito, além de outras atividades previstas em lei, que assegurem ao cidadão o direito à mobilidade urbana eficiente; e

II - compete, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aos respectivos órgãos ou entidades executivos e seus agentes de trânsito, estruturados em Carreira, na forma da lei.

Pode-se dizer que a Polícia Federal órgão permanente assume atribuição importante no combate e repressão aos crimes que afrontem os interesses, serviços, bens ou entidades autárquicas, inclusive empresas públicas pertencentes à União, bem como outras infrações previstas em lei como, por exemplo, nos dias atuais, os crimes de corrupção, lavagem de capitais entre outros no cenário político brasileiro.

A Polícia Rodoviária Federal (§2º) é órgão permanente e mantido pela União e estruturado em carreira, tem a finalidade de exercer o patrulhamento ostensivo nas rodovias federais do Brasil. Essa função encontra respaldo na Lei nº 9.654, de 2 de junho de 1998.

A Polícia Ferroviária Federal (§3º) também é órgão permanente e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais, na forma da lei. Entretanto, não existe de fato este modelo de polícia, pois não há um órgão fisicamente formado e não existe quadro de funcionários. Segundo o precedente do STF, por meio do MI 627, Rei. Min. Ellen Gracie, DJ de 7-2-2003, a previsão constitucional de uma Polícia Ferroviária Federal, por si só, não legitima a investidura nos cargos referentes a tal carreira; é necessário que ela seja primeiro, estruturada (BULOS, 2014, p.1455).

O §4º, por sua vez, informa que às Polícias Civis deverão ser geridas por “delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto das infrações militares”. Assim, a polícia civil compete à atribuição de apurar as infrações de forma residual, uma vez que não incidindo a competência da União nem da alçada dos militares, resta a Polícia Civil a função precípua de realizar a devida investigação a fim de subsidiar a opinião do titular da ação penal.

No que tange a Polícia Militar cabe à missão de realizar o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública, ao passo que aos Corpos de Bombeiros Militares incumbem o exercício da atividade de defesa civil, sendo estes órgãos, mais a Polícia Civil, subordinadas aos Governadores de Estado, Distrito Federal e dos Territórios.

Conforme o entendimento de Cunha Junior e Novelino (2013, p.651) “as guardas municipais, conquanto referidas no art. 144 (§8), não são órgãos de segurança pública”, uma vez que se trata de órgão administrativo facultado ao município a sua criação a fim de proteger seus bens, instalações e serviços, conforme os preceitos legais. Com isso, pode-se dizer que o artigo 144, da Constituição Federal de 1988 demonstra que seu rol é taxativo quando elenca quais os órgãos imbuídos em realizar a segurança pública no país.

Por fim, é de salutar importância que se entenda que segurança pública não é só questão de polícia, sendo una e exclusivamente exercida pelos órgãos ora elencados, mas também por toda a sociedade que assume a responsabilidade de forma conjunta com o fito de preservar direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição.

Sabendo quais os servidores públicos e os seus respectivos órgãos, serão estudados no próximo capítulo os princípios e direitos fundamentais mais importantes que norteiam a utilização das algemas no ordenamento jurídico.


3. PRINCÍPIOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS INTRÍNSECOS AO USO DAS ALGEMAS

É notório que os Servidores da Área de Segurança Pública quando necessitarem utilizar as algemas de forma eficaz e proporcional sejam norteados por alguns princípios e direitos fundamentais, os quais servem como barreira a fim de se evitar excessos desnecessários. Dentre tantos fatores relevantes, destacam-se os seguintes princípios: Legalidade, Dignidade da Pessoa Humana, Presunção de Inocência, Razoabilidade e Proporcionalidade.

Nessa esteira, também serão dispostos alguns direitos que podem ser violados quando o uso das algemas se torna arbitrário e ilegal, dentre os quais se destacam: Direito de Imagem, Tortura e o Abuso de Autoridade.

3.1 Princípios Intrínsecos ao uso das Algemas

No que concerne aos Princípios Intrínsecos que norteiam o uso das algemas cabe, inicialmente, dispor que, segundo Alexandrino e Paulo (2013, p.181) os princípios são “ideias centrais de um sistema, estabelecendo suas diretrizes e conferindo a ele um sentido lógico, harmonioso e racional o que possibilita uma adequada compreensão de sua estrutura”. Isto é, o princípios servem de base para que todo e qualquer agente público possa pautar-se em perfeita harmonia aos preceitos contidos na lei.

No mesmo sentido Greco (2016, p. 61) afirma que os “princípios são considerados, na ciência jurídica, como as normas gerais mais abstratas, que servem de norte e de observação obrigatória para a criação do sistema normativo”. Isto é, o legislador infraconstitucional ao inovar no ordenamento jurídico deve ter como base fundamental os princípios, pois, são estes que norteiam a formação de um Estado Democrático de Direito.

Complementa Carvalho (2015, p.56) dizendo que os “princípios devem ser encarados como normas gerais coercitivas que orientam a atuação do indivíduo, definindo valores a serem observados nas condutas por ele praticadas”. Assim, o princípio sendo visto como norma geral serve de base, alicerce, fundamento de toda e qualquer conduta do indivíduo.

Adverte Alexy (2015, p. 150) que caso haja uma colisão “o princípio, que no caso concreto tem o peso maior, deve ser aplicado sem que o princípio retrocedente, com isso, torne-se inválido”. Disso, pode-se perceber que os princípios não podem ser excluídos ou invalidados, mas sim ponderados no caso concreto, prevalecendo aquele que melhor se adeque ao caso.

Sabendo-se dessas considerações iniciais a respeito dos princípios, cabe agora o estudo de cada um deles como forma de guiar a conduta dos servidores da área de segurança publica no uso das algemas.

3.1.1 Do Princípio da Legalidade

O Princípio da Legalidade constitui uma das principais garantias do cidadão contra as arbitrariedades do Estado, uma vez que seu standard é a limitação de direitos e garantias individuais em prol da coletividade (DI PIETRO, 2012).

Para Carvalho (2015, p.61) o princípio da legalidade na órbita jurídica decorre da “existência do Estado de Direito, como uma Pessoa Jurídica responsável por criar direito, no entanto, submissa ao ordenamento jurídico por ela mesmo criado e aplicável a todos os cidadãos”. Ou seja, o princípio além de vincular o particular, também vincula o próprio Estado, uma vez que este só atua pautado na lei.

Com isso, vale os dizeres de Greco (2016, p.28, grifo do autor) sobre o Estado de Direito:

É aquele que se submete ao império da lei. A lei, portanto, como enunciação da vontade geral, para nos valermos da expressão cunhada por Rousseau, e adotada pelo art. 6º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, deve ser aplicada a todos, indistintamente. Segundo o pensamento ilustrado, o ‘governo das leis’ aparece como um ideal em face do ‘governo dos homens’.

Sabe-se que o princípio da legalidade atua conforme o interesse público e que, por sua vez, é impulsionado pelo povo, por meio de seus representantes legitimamente escolhidos através do voto popular a fim de que sejam responsáveis pela elaboração das leis. Assim, ao Estado lhe é atribuído o dever de cuidado para com a sociedade, com base nos postulados legais impostos pelo próprio povo (CARVALHO, 2015).

Segundo Mazza (2013, p.75) o princípio da legalidade se divide em duas dimensões fundamentais, quais sejam: primazia da lei e reserva legal, assim:

O princípio da primazia da lei, ou legalidade em sentido negativo, enuncia que os atos administrativos não podem contrariar a lei. Trata-se de uma consequência da posição de superioridade que, no ordenamento, a lei ocupa em relação ao ato administrativo. Quanto ao princípio da reserva legal, ou legalidade em sentido positivo, preceitua que os atos administrativos só podem ser praticados mediante autorização legal, disciplinando temas anteriormente regulados pelo legislador. Não basta não contradizer a lei. O ato administrativo deve ser expedido secundum legem. A reserva legal reforça o entendimento de que somente a lei pode inovar originariamente na ordem jurídica. O ato administrativo não tem o poder jurídico de estabelecer deveres e proibições a particulares, cabendo-lhe o singelo papel de instrumento de aplicação da lei no caso.

Esse sentido negativo da legalidade é justamente a indicação hierárquica superior que a norma ocupa em relação aos atos administrativos evitando-se, por conseguinte, que o Estado realize um ato sem o qual não esteja amparado por lei. Por outro lado, a reserva legal atua positivamente, uma vez que o Estado só poderá agir quando a lei assim autorizar. Portanto, o ato administrativo não tem o condão de limitar ou restringir direitos e garantias do particular, pois seria um precedente a favor de condutas arbitrárias e desumanas, vedadas no ordenamento jurídico.

Diante desse postulado, reforça o entendimento Di Peitro (2012, p.65) no sentido que:

No direito positivo brasileiro, esse postulado, além de referido no artigo 37, está contido no artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal que, repetindo preceito das constituições anteriores, estabelece que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei”. Em decorrência disso, a Administração Pública não pode, por simples ato administrativo, conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor vedações aos administrados.

O direito brasileiro abarca no artigo 37, caput, e artigo 5º, inciso II, ambos da Carta Magna de 1988 o princípio da legalidade, o qual informa que existem características implícitas a esse mandamento, sendo elas a generalidade e a abstração. A primeira é direcionada a todos os integrantes da sociedade e a, segunda, faz com que a lei não seja dirigida a pessoas determinadas. Com isso, evita-se que o Estado privilegie alguns em detrimentos de outros.

3.1.2. Do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana está elencado no artigo 1º, inciso III, da Constituição da República de 1988, sendo base fundamental de um Estado Democrático de Direito que trouxe com mais ênfase essa vertente em que o homem não é um fim em si mesmo, mas um meio para que todos os direitos e garantias sejam exercidos de forma justa e igualitária (GARCIA; LAZARI, 2014).

Para que se possa chegar a esse standard, Greco (2016, p.70) afirma que a “dignidade da pessoa humana, entendida como uma qualidade que integra a própria condição humana, sendo, em muitas situações, considerado, ainda, como irrenunciável e inalienável”. Nesse sentido, pode-se dizer que a dignidade humana é algo que faz parte do ser humano como integrante de uma sociedade civilizada, onde há prevalência dos direitos e garantias fundamentais, sendo até aquele indivíduo considerado criminoso portador desse valor.

Continua Garcia e Lazari (2014, p.75-76) ao mencionar que conceito de Dignidade da Pessoa Humana não é tarefa das mais fáceis quando afirma:

Estabelecer um conceito para a dignidade da pessoa humana é uma tarefa complicada, notadamente face à altíssima densidade normativa inerente a este fundamento. Sem pretender estabelecer uma definição fechada ou plena, é possível conceituar dignidade da pessoa humana como o principal valor do ordenamento ético - e, por consequência, jurídico – que pretende colocar a pessoa humana como um sujeito pleno de direitos e obrigações na ordem internacional e nacional, cujo desrespeito acarreta a própria exclusão de sua personalidade. Pela própria impossibilidade de se estabelecer um conceito fechado, a doutrina se limita a relatar a importância da dignidade da pessoa humana, buscando enquadrá-la em termos históricos e filosóficos, com as devidas correlações quanto à universalidade e à validade dos direitos humanos.

No mesmo sentido, Greco (2016, p.69) informa que:

Conceituar dignidade da pessoa humana continua a ser um enorme desafio. Isto porque tal conceito encontra-se no rol daqueles considerados vagos e imprecisos. É um conceito, na verdade, que, desde a sua origem, encontra-se em um processo contínuo de construção. Não podemos, de modo algum, edificar um muro com a finalidade de dar contornos precisos a ele, justamente por ser um conceito aberto.

Pela dificuldade peculiar em conceituar dignidade da pessoa humana de forma precisa, mais importante se torna a figura do julgador ao analisar o caso concreto, pois é dada a ele a nobre missão de realizar tal valoração, dando contornos éticos e jurídicos a fim de colocar o ser humano como sujeito de direitos. Por isso, se torna difícil uma definição fechada, pois, ao passo que a sociedade evolui, o princípio se torna mais abrangente e complexo. Não se pode deixar de observar também o contexto histórico-cultural em que o indivíduo está inserido, pois uma conduta pode ser tida como repugnante em uma dada localidade, e ser a mesma conduta aceitável em outros como, por exemplo, a pena de morte aplicada pela maioria dos Estados norte-americanos.

Na visão de Moraes (2014, p. 18) a dignidade da pessoa humana traduz-se no seguinte:

Concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades humanas. Esse fundamento afasta a ideia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais.

Por isso, que o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana é considerado um superprincípio do ordenamento jurídico, uma vez que age como norte para todos os dispositivos normativos, a fim de manter uma convivência harmônica entre o Estado e o cidadão, bem como entre as relações particulares. Assim, é núcleo essencial inerente a personalidade humana dotado de valor espiritual e moral constituindo, por conseguinte, no mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar.

Nesse sentido, adverte Greco (2016, p.75) ao ressaltar que:

Uma coisa é permitir que alguém, que praticou uma infração penal de natureza grave, se veja privado da sua liberdade pelo próprio Estado, encarregado de proteger, em última instância, os bens jurídicos; outra coisa é permitir que esse mesmo condenado a uma privação de liberdade cumpra sua pena em local degradante de sua personalidade; que seja torturado por agentes do governo com a finalidade de arrancar-lhe alguma confissão; que seus parentes sejam impedidos de visitar-lhe; que não tenha uma ocupação ressocializante no cárcere etc. A sua dignidade deverá ser preservada, pois que ao Estado foi permitido somente privar-lhe da liberdade, ficando resguardados, entretanto, os demais direitos que dizem respeito diretamente à sua dignidade como pessoa.

Visto que, ao Estado lhe é dado o poder de restringir o direito de ir e vir, em proteção a bens jurídicos relevantes previstos em lei, não seria diferente quanto ao uso das algemas, pois ao violar esses bens o Estado estaria legitimado a privar a liberdade como forma de garantir a persecução penal. Nesse caso, o uso das algemas seria valorado no caso concreto a fim de evitar fuga, agressões ou resistência, porém o objetivo é apenas uma restrição temporária da liberdade, não excluindo todos os outros direitos a ele conferidos. Noutro giro, seria o excesso decorrente dessa privação da liberdade como, por exemplo, a realização de tortura a fim de obter alguma confissão, situação vedada pelo ordenamento jurídico.

Nesse mesmo sentido, Herbella (2014, p.134) afirma que:

A finalidade precípua da adoção das algemas não deve ser a de atentar contra a dignidade da pessoa humana. O uso devido, legítimo e necessário de algemas não avilta esta dignidade, mas o excesso, bem como a sua injusta colocação, inegavelmente sim. A exposição desnecessária e exagerada à mídia, com o uso de algemas, inegavelmente atenta contra tal direito fundamental. Lembre-se que as algemas são meramente instrumentais, não tendo o escopo de pena, castigo ou fonte de humilhação.

Assim, a utilização das algemas, de certa forma, não afronta o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana devido ao seu caráter preventivo, levando a efeito a ponderação de bens ou interesses. Porém, o uso demasiado, apenas com o fito de denegrir a imagem ou humilhar poderá acarretar uma violação a tal princípio, pois o objetivo máximo é apenas mitigar as possibilidades do agente infrator escapar, ou mesmo atentar contra a sua própria integridade física ou de outrem.

3.1.3 Do Princípio da Presunção de Inocência (Não Culpabilidade)

O Princípio da Presunção de Inocência ou Não Culpabilidade está esculpido no art. 5º, LVII da Constituição Federal de 1988 (p.6) em que afirma: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, ou seja, ninguém será considerado culpado até que ocorra o trânsito em julgado da sentença penal condenatória até a última instância.

Assim, Paulo e Alexandrino (2011, p.193) sedimentam o entendimento dizendo que:

Essa garantia processual penal tem por fim tutelar a liberdade do indivíduo, que é presumido inocente, cabendo ao Estado comprovar a sua culpabilidade. Dela decorre, também, o princípio de interpretação das leis penais conhecido como in dubio pro reu, segundo o qual, existindo dúvida na interpretação da lei ou na capitulação do fato, adota-se aquela que for mais favorável ao réu.

Nesse interim, pode-se dizer que este princípio visa não antecipar os efeitos, sem antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, o qual não tem o condão de antecipar qualquer tipo pena, diante do seu caráter instrumental. Ou seja, o indivíduo tem uma presunção intrínseca de que é inocente, porém o uso das algemas não tem o condão de ferir essa presunção porque se trata de uma garantia processual com vistas a resguardar o indivíduo.

Nessa mesma linha de pensamento Lima (2014, p.49-50) adverte sobre a terminologia deste princípio comparando com os tratados internacionais e a Constituição Federal, a saber:

Comparando-se a forma como referido princípio foi previsto nos tratados Internacionais e na Constituição Federal, percebe-se, naqueles, costuma-se referir à presunção de inocência, ao passo que a Constituição Federal em momento algum utiliza a expressão inocente, dizendo, na verdade, que ninguém será considerado culpado. Por conta dessa diversidade terminológica, o preceito inserido na Carta Magna passou a ser denominado de presunção de não culpabilidade.

Nessa sistemática seria mais adequado o princípio ser chamado de não culpabilidade, pois a Constituição federal de 1988 não presume a inocência, mas, sim, que ninguém será considerado culpado antes da sentença condenatória transitada em julgado.

Não sem razão, Távora e Alencar (2015, p.51) afirmam com maestria que “presunção de inocência, presunção de não culpabilidade e estado de inocência são denominações tratadas como sinônimas pela mais recente doutrina. Não há utilidade prática na distinção”. Ou seja, as distinções conceituais sobre os desdobramentos do princípio da presunção de inocência aparecem com fins meramente acadêmicos, nada influenciando na prática forense.

Na sapiência de Beccaria (2011, p.45) este princípio indica que:

Um homem não pode ser considerado culpado antes da sentença do juiz e a sociedade só lhe pode retirar a proteção pública depois que seja decidido ter ele violado as condições com as quais tal proteção lhe foi concedida.

Neste caso, já é consolidado esse posicionamento, desde outras épocas, no qual não se pode culpar alguém, sem a observância de todo um procedimento probatório, justo e necessário, garantindo-lhe o contraditório e a ampla defesa. No entanto, o princípio não se reveste de caráter absoluto, mas sim relativo ou limitado. Portanto, quando o ato for eminentemente acolhido pelo ordenamento jurídico, o uso das algemas não ferirá tal presunção. Isto é, sua finalidade precípua é assegurar o escopo processual, sem que o indiciado, acusado ou réu possa ser considerado culpado antes da sentença final.

Do Princípio da Presunção de Inocência ou Não Culpabilidade pode-se observar duas regras importantes, uma probatória (ou de juízo) e outra de tratamento. No primeiro caso, a parte acusadora tem o dever de demonstrar a culpabilidade do acusado, isto é, quem acusa tem o ônus de demonstrar que o acusado praticou a infração penal. A segunda, de tratamento, repousa na privação cautelar da liberdade, sempre tratada como excepcionalidade, justificando-se o cárcere no momento em que existir respaldo legal. Isto demonstra a vedação de prisões processuais automáticas ou execução provisória da pena (LIMA, 2014). No dia 17 de fevereiro de 2016 foi posto em julgamento o HC 126.292/SP, que teve como relator o Ministro Teori Zavascki, o qual modificou o entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal sobre Princípio da Presunção de Inocência firmando-se uma nova visão sobre a execução provisória da pena após a confirmação de condenação em segunda instância, como bem informa Sannini Neto (2016, p1).

O Supremo Tribunal Federal modificou sua jurisprudência e firmou o entendimento no sentido de permitir a execução provisória da pena após a confirmação de condenações criminais em segunda instância, vale dizer, pelos Tribunais de Justiça. A decisão se deu por maioria de sete a quatro, sendo vencidos os ministros Rosa Weber, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ricardo Lewandowsk. No seu voto, o relator destacou, em outras palavras, que é no âmbito das instâncias ordinárias que se exaure a possibilidade de exame de fatos e provas e, demais disso, a própria fixação da responsabilidade criminal do acusado. Para o Ministro Zavascki, os recursos de natureza extraordinária não seriam desdobramento do duplo grau de jurisdição, uma vez que não são recursos de ampla devolutiva, pois não servem ao debate da matéria fática probatória.

Desse julgado, pode-se dizer que causou grande impacto no âmbito jurídico, mídia e outros seguimentos. Porém, essa decisão aparenta ter mais o cunho eminentemente político, pois em tempos de “operação lava-jato” e o cometimento vários crimes envolvendo corrupção entre políticos e pessoas da alta sociedade, o Supremo Tribunal Federal viu-se obrigado a mudar entendimentos que até o momento já estavam consolidados.

Assim, nada obsta a utilização das algemas pelos servidores da área de segurança pública, desde que observe tal princípio norteador em toda sua prática policial e que não esteja maculado a fim de menosprezar ou humilhar o indiciado ou denunciado ou réu. O objetivo maior deste princípio é permitir que não se antecipasse à condenação do acusado antes do trânsito em julgado. Finalidade essa que não se coaduna com o uso das algemas.

3.1.4 Do Princípio da Razoabilidade e da Proporcionalidade

O Princípio da Razoabilidade tem o condão de impedir a atuação excessiva do Estado na vida do cidadão, como bem afirma Carvalho (2015, p.84) que “o agente não pode se valer de seu cargo ou função, com a falsa intenção de cumprir a lei, para agir de forma ilegal e arbitrária fora dos padrões éticos e adequados ao senso comum”, visto que ao agente público lhe é conferido “poderes” a fim de agir em benefício da coletividade. Por isso, este princípio age como um limitador da discricionariedade do servidor de segurança pública a fim de evitar excessos que podem gerar danos aos particulares.

Sobre o princípio da Razoabilidade afirma Carvalho Filho (2014, p.91) que é a “qualidade do que é razoável, ou seja, aquilo que se situa dentro de limites aceitáveis, ainda que os juízos de valor que provocaram a conduta possam dispor-se de forma um pouco diversa”. Esse é o espírito em que os servidores da área de segurança pública devem se pautar, agindo em consonância aos ditames legais, bem como ao que o senso comum agiria no caso concreto.

Sobre o princípio da proporcionalidade, afirma Mazza (2013, p.103) que é entendido como “um aspecto da razoabilidade voltado à aferição da justa medida da reação administrativa diante da situação concreta. Em outras palavras, constitui proibição de exageros no exercício da função administrativa”. No que toca a esse aspecto, pode-se dizer que a proporcionalidade é o equilíbrio entre os motivos que deram guarida à prática do ato e a consequência jurídica da conduta.

Assim, na visão de Alexandrino e Paulo (2013, p.209) é muito comum “trazerem razoabilidade e proporcionalidade como único e mesmo princípio jurídico, empregando esses termos como sinônimos”, posto que entre os doutrinadores, jurisprudência, sobretudo na seara do direito constitucional, uma vez que a diferença entre os princípios é peculiar. Por isso, doutrina e jurisprudência são majoritárias em dar preferência ao princípio da proporcionalidade.

Partindo deste pressuposto, não seria diferente quando ao uso das algemas, uma vez que nesse contexto é de suma importância uma ponderação entre os rigores que a lei impera e, o contexto social e cultural de cada localidade, a fim de favorecer a melhor aplicabilidade da norma.

Afirma Lenza (2013, p.162) a seguinte observação acerca dessa sistemática:

O princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade, em essência, consubstancia uma pauta de natureza axiológica que emana diretamente das ideias de justiça, equidade, bom-senso, prudência, moderação, justa medida, proibição de excesso, direito justo e valores afins.

Nesse diapasão, o Princípio da Proporcionalidade comunga na busca do bom senso, prudência e moderação, pois a depender do caso concreto surge a necessidade precípua, de se fazer a devida ponderação quando for utilizar as algemas, em qualquer pessoa que, por ventura, venha a ferir o ordenamento jurídico. Assim, além da atividade policial mostrar-se dinâmica dentro de um contexto social e cultural e que, numa primeira avaliação, necessita-se analisar o caso fatídico, para que o uso desse instrumento seja, além de legal, adequado e eficaz.

Assim, têm-se como parâmetro três importantes elementos para poder agir adequadamente quanto ao uso das algemas: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Nesse sentido afirma Lima (2014, p.93-94):

O primeiro requisito intrínseco ao princípio da proporcionalidade em sentido amplo é o da adequação, também denominado de princípio da idoneidade ou da conformidade. Por força da adequação, a medida restritiva será considerada adequada quando for apta a atingir o fim proposto. Não se deve permitir, portanto, o ataque a um direito fundamental se o meio adotado não se mostrar apropriado à consecução do resultado pretendido [...]. O segundo requisito ou subprincípio da proporcionalidade é o da necessidade ou da exigibilidade, também conhecido como princípio da intervenção mínima, da menor ingerência possível, da alternativa menos gravosa, da subsidiariedade, da escolha do meio mais suave, ou da proibição de excesso [...]. O terceiro subprincípio – proporcionalidade em sentido estrito – impõe um juízo de ponderação entre o ônus imposto e o benefício trazido, a fim de se constatar se se justifica a interferência na esfera dos direitos dos cidadãos. É a verificação da relação de custo-benefício da medida, ou seja, da ponderação entre os danos causados e os resultados a serem obtidos [...].

Para que os atos dos servidores da área de segurança pública sejam eivados de legalidade devem ser cumpridos os três elementos fundamentais em conjunto: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. O primeiro elemento informa que o meio escolhido seja eficaz a fim de obter êxito. O segundo significa que só é legítima caso seja indispensável na situação concreta e que seja a escolha mais suave com vistas a proibir o excesso. E o terceiro, está ligado à proporção adequada entre os meios utilizados e os fins desejados pelo Estado. Esses requisitos servem para que sejam mitigados os riscos a ingerência de tratamentos desumanos e ilegais por parte dos órgãos de segurança pública.

Por fim, como forma de atender aos princípios da razoabilidade e o da proporcionalidade, a Lei 13.060, de 22 de dezembro de 2014 (p.1) regulamenta o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública em todo território nacional.

Com isso, o artigo 4º, desta lei (p.1), conceitua instrumentos de menor potencial ofensivo como “aqueles projetados especificamente para, com baixa probabilidade de causar mortes ou lesões permanentes, conter, debilitar ou incapacitar temporariamente pessoas”. Isto é, para que se possa utilizar a arma de fogo como recurso cabe, primeiramente, se valer dos meios de baixa lesividade como, por exemplo, “spray” de pimenta, algemas, armamentos com projéteis de borracha, tasers, tonfas ou bastão retrátil, a fim de minorar a incidência de algum ato que possa vir a causar morte de inocentes.

Portanto, ao se verificar os princípios intrínsecos referentes ao uso das algemas é de suma importância que seja dada uma atenção especial aos direitos, que podem ser violados, quando os servidores da área de segurança pública atuam com excesso. Por isso, no próximo tópico serão elencados alguns direitos que podem incidir quando o uso das algemas se torna desnecessário.

3.2 Direitos Balizadores sobre a Utilização das Algemas

Serão indicados, logo abaixo, alguns direitos que podem ser causados da conduta excessiva dos servidores da área de segurança pública no momento de utilização das algemas, tendo em vista o seu caráter excepcional e, muitas vezes, violador de princípios éticos e morais durante esta prática cotidiana.

3.2.1 Do Direito de Imagem

O Direito de Imagem faz parte de um rol de direitos e garantias fundamentais, que estão intrínsecos ao uso das algemas. Assim, a Constituição Federal de 1988 em seu Art. 5º, X (p.3), aduz que: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. Ou seja, a Carta Magna de 1988 trata da inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, uma vez que é inerente a condição do ser humano. Na hipótese de violação de algum desses postulados resultará indenização de forma proporcional ao dano seja ele moral ou material.

Entretanto, tratar-se-á apenas do direito de imagem, uma vez que é de suma importância ao estudo do uso das algemas pelos servidores da área de segurança pública.

Nesse sentido, aponta Herbella (2014, p.99) que o direito à imagem:

A constituição resguardou os direitos da personalidade em local especial, dando-lhes destaque e os petrificou. Se assim estão locados, o fazem por merecer. Direitos especiais, inerentes à própria personalidade da pessoa, tão especiais que influenciam diretamente o seu íntimo, o seu psicológico, indo muito além das lesões a bens patrimoniais, pois são de difícil reparação.

O direito de imagem, direito especial, inerente à pessoa humana, sendo considerado pela própria Carta Política de 1988 como cláusula pétrea fazendo com que o seu mandamento seja respeitado na sua acepção mais ampla possível. Ou seja, faz parte do direito da personalidade de toda e qualquer pessoa.

Na atualidade, a propagação da notícia se tornou mais célere decorrente dos avanços tecnológicos. Afirma D’Azevedo (2001, p.3) que:

O direito de imagem assumiu uma posição de destaque no contexto dos direitos da personalidade, devido ao extraordinário progresso tecnológico dos meios de comunicação, tanto no desenvolvimento da facilidade de captação da imagem, quanto a de sua reprodução. Hoje, é possível a captação mais fácil à distância e a reprodução para todo o mundo em segundos, o que têm alterado a preocupação na proteção ao direito à imagem, já que esta se torna mais árdua de se realizar.

Sendo assim, a imagem pode ser repassada por vários meios de comunicação de forma muito rápida. A violação desse direito pode ser irreparável e tomar de proporções enormes. Ocorre que os direitos da personalidade são de caráter indisponível, porém o direito de imagem pode ser disponível, sendo necessária a autorização expressa do seu titular (HERBELLA, 2014).

Fato público e notório, por exemplo, ocorreu em 9 de julho de 2008, onde o ex-prefeito do Estado de São Paulo, Celso Pitta, tentou esconder as algemas com uma blusa de lã para que outras pessoas não a vissem, no momento em que fora preso pela Polícia Federal. Do mesmo modo, ocorreu com as prisões do ex-senador Luiz Estevão e do ex-juiz do trabalho, Nicolau dos Santos Neto, que foram presos e algemados pela Polícia Federal onde tiveram suas imagens amplamente divulgadas na mídia nacional (BROD, 2009).

Segundo Paulo e Alexandrino (2011, p.135) a indenização em caso de violação do direito de imagem:

Poderá ser cumulada, vale dizer, poderá ser reconhecido o direito à indenização pelo dano material e moral, simultaneamente, se a situação ensejar. O Estado também responde pelos atos ofensivos (morais) praticados pelos agentes públicos, inclusive por autoridade judiciária, no exercício de suas funções, assegurado ao Estado o direito de regresso contra o agente nas hipóteses de este haver atuado com dolo ou culpa.

Dessa visão, tem-se que a indenização poderá ser material e moral, a depender do caso concreto, como também essa responsabilidade pode ser atribuída ao Estado em casos em que seus servidores incorram com dolo ou culpa, nos casos de exposição vexatória em público, pois uma atitude que exceda os limites legais no uso das algemas poderá causar danos irreparáveis e irreversíveis.

3.2.2 Do Direito à Proibição da Tortura

Em um Estado Democrático de Direito em que os direitos e garantias fundamentais irradiam em todo o ordenamento jurídico, sob o manto do supraprincípio da Dignidade da Pessoa Humana não se poderia permitir que a tortura pudesse se perpetuar e fosse praticada deliberadamente por qualquer pessoa, inclusive por aqueles que realizaram o juramento de defender a sociedade mesmo com o risco da própria vida.

Por isso, a fim de repudiar essa conduta que foi tão utilizada nos tempos do Regime Ditatorial, a Constituição Federal de 1988 (p.2 - 5) em seu artigo 5º, III e XLIII previu que:

Artigo 5º, in verbis:

[...]

III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;

[...]

XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem.

A tortura consta na Carta Magna de 1988, como sendo inafiançável e insuscetível de graça ou anistia. O legislador originário buscou reprimir com maior ênfase os crimes mais repugnantes que existem na sociedade, uma vez que causam uma maior comoção. Entretanto, a Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei dos Crimes Hediondos) complementou o artigo 5º, XLIII, da Constituição e equiparou o crime de tortura a hediondo.

Como bem afirma Lima (2016, p.57):

A justificativa para o constituinte originário ter separado os crimes hediondos dos equiparados a hediondos está diretamente relacionado à necessidade de assegurar maior estabilidade na consideração destes últimos como crimes mais severamente punidos.

A Constituição de 1988 ao separar os crimes hediondos dos equiparados demonstrou que uma lei ordinária poderá elencar quais os crimes serão considerados hediondos, porém, aos crimes equiparados não deixou qualquer margem de escolha para o legislador ordinário, pois a própria Carta política já impõe um tratamento mais severo à tortura, ao tráfico de drogas e ao terrorismo.

A fim de promover uma maior efetividade no que tange a vedação da tortura no território brasileiro foi editada a Lei nº 9.455, de 7 de abril de 1997 o qual define quais as condutas ensejariam o crime de tortura, bem como atribui uma pena de reclusão que varia entre 2 a 8 anos e elenca hipóteses em que essa pena poderá ser agravada.

Assim, o artigo 1º, inciso I, da Lei 9.455/97 (p.1) define o crime de tortura como:

Artigo 1º:

I - constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental:

a) com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa.

Do conceito de tortura fornecido pela Lei, pode-se dizer que a tortura é forçar alguém a realizar algo que não deseja, ou mesmo tolher seus movimentos para que não faça algo, utilizando-se, para isso, da violência física ou da grave ameaça com o fim específico de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de outra pessoa. Nota-se, também, que o dispositivo não atribui essa conduta a uma pessoa específica, portanto, o crime de tortura pode ser cometido por qualquer pessoa.

No que toca aos servidores da área de segurança pública, a Lei dispõe em seu artigo 1º, §4º (p.1) uma causa de aumento de pena que varia entre um sexto a um terço se o crime for cometido por agente público, ou seja, caso o agente pratique o crime de tortura a fim de obter alguma das finalidades que a lei informa, o servidor estará incidindo nessa causa de aumento de pena, bem como acarretará na perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para o seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.

Assim sendo, a Lei de tortura consagra o princípio da segurança jurídica, onde se tem elencado na carta magna o repúdio a práticas desumanas que afrontam o princípio basilar da dignidade da pessoa humana.

3.2.3 Do Abuso de Autoridade

O Abuso de Autoridade é regulado pela Lei nº 4.898 de 9 de dezembro de 1965, sendo um importante mecanismo de defesa a fim de mitigar as arbitrariedades cometidas pelos servidores de segurança pública cuja imposição de algemas sem devida fundamentação pudesse acarretar.

Assim, para fins legais o artigo 5º, da Lei 4.898/65 (p. 2) tratou de conceituar autoridade como todo aquele que “exerce cargo, emprego ou função pública, de natureza civil, ou militar, ainda que transitoriamente e sem remuneração”, isto é, todo aquele que de qualquer forma mantenha vinculo profissional com o Estado estará abarcado pelos dispositivos contidos na Lei de Abuso de Autoridade.

Sendo assim, afirma Herbella (2014, p.119) que:

Um particular, que faz o uso de algemas, sem ter para tanto o poder de polícia que o legitime para tal, cometerá outros crimes, tais como tortura, maus tratos, lesão corporal e outros, dependendo da análise factual. Raro, porém, encontrar um caso de abuso de autoridade pelo uso indevido das algemas por funcionário estatal, que não integrante de qualquer das forças policiais, tendo-se em vista que o uso das algemas é inerente ao desempenho de suas funções.

Assim sendo, percebe-se o caráter peculiar para a utilização das algemas o qual se restringe as pessoas que fazem às vezes do Estado, mesmo que temporariamente, com ou sem remuneração, utilizando-se desse poder para restringir o particular quando estritamente necessário para o bom andamento das funções estatais. Por isso, vem à luz o Princípio da legalidade atribuído à Administração Pública onde se pode atuar somente segundo os dizeres da lei, isto é, a lei é quem regula os passos dos agentes sob sua supervisão, e qualquer conduta que desvie o que a lei regula acarretará sanções, conforme o grau de lesividade cometido.

Segundo Brod (2009, p.18) adverte que:

Como as algemas não são restritas aos agentes estatais, ao contrário, são de livre comercialização e podem ser encontradas em casas de esportes, ferramentas, armas e até em sex shops, é possível que um particular se utilize desse instrumento para a prática de tortura e maus tratos, dentre outros fins. Entretanto, não havendo vínculo profissional da pessoa que fez o mau uso das algemas com o Estado, esta poderá responder por outros crimes, como o de constrangimento ilegal, mas não por abuso de autoridade.

Assim, as algemas podem ser vendidas em qualquer lugar, pois não existe uma restrição imposta pela lei. Por isso, é possível a sua utilização por qualquer pessoa, podendo ser utilizada para a prática de outros crimes, entretanto para que se configure o crime de abuso de autoridade exige-se esse vínculo profissional com o Estado.

No que tange a ação penal, conforme aduz o artigo 12, da lei de abuso de autoridade (p.3) será “instruída com a representação da vítima do abuso”. Sendo assim, surge a seguinte questão: será necessária a representação da vítima para que se promova a investigação criminal? Para que se chegue à resposta com a máxima tranquilidade, deve-se recorrer ao artigo 1º, da Lei nº 5.249, de 9 de fevereiro de 1967 (p.1), em que afirma que “a falta de representação do ofendido, nos casos de abusos previstos na Lei nº 4.898, de 9 de dezembro de 1965, não obsta a iniciativa ou o curso de ação pública”. Ou seja, transformou os crimes de abuso de autoridade em infrações de ação pública incondicionada, portanto, não sujeita a representação.

O crime de abuso de autoridade tem o condão de absorver os demais crimes no contexto do ato arbitrário? Entende-se que não, pois como bem ensina Costa e Silva (2014, p.222) ao afirmar que:

A Lei de Abuso de autoridade visa proteger um bem jurídico muito específico, que seja o padrão de conduta esperado dos agentes do Estado (ações probas e fundadas em lei). De posse de tais informações fica evidente que a referida legislação, apesar de fazer menção em seus tipos penais a algumas violações de direitos individuais do cidadão (inviolabilidade de domicílio, patrimônio, honra, etc), não almeja incriminar diretamente esses atos atentatórios.

Tendo por base esse entendimento, pode-se dizer que as infrações cometidas que violem a lei de abuso de autoridade, uma vez que protege bem jurídico específico, isto é, lisura do exercício estatal, podendo ser cumuladas com outras infrações, resultando na regra do concurso material, pois não há conflito aparente de normas para que seja aplicado o princípio da especialidade.

Dessa forma, para que o servidor da área de segurança pública possa mitigar os abusos que por ventura possam acontecer durante a prática policial, exige-se capacitação profissional adequada como forma de conhecer e aprender as leis que regulam direitos e obrigações sobre os particulares e da própria administração como um todo. Sem embargo, o Estado deve procurar disponibilizar cursos periódicos como forma de manter sempre os seus servidores atualizados a fim de evitar erros reiterados.

Vencida essa etapa dos princípios e direitos que influenciam na atuação policial, é de suma importância identificar no próximo capítulo quais as principais legislações sobre a utilização das algemas no ordenamento jurídico.


4. DISCIPLINA NORMATIVA SOBRE O USO DAS ALGEMAS

Nesse tópico, será analisada a disciplina normativa sobre o uso das algemas no ordenamento jurídico brasileiro. Assim, serão fornecidos breves comentários sobre Lei de Execução Penal, Código de Processo Penal, Código de Processo Penal Militar, Estatuto da Criança e do Adolescente, Leis de Segurança da Água e do Ar, Normas do Estado de São Paulo, Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil e, por fim, a Súmula Vinculante nº 11, do Supremo Tribunal Federal. Todos esses dispositivos são referenciais para toda e qualquer atividade policial.

4.1 Da Lei de Execução Penal

A Lei de Execução Penal (LEP), instituído pela Lei nº 7.210, de julho de 1984 (p.40), em seu artigo 199 dispõe da seguinte redação: “o emprego de algemas será disciplinado por decreto federal”. Assim, como dito pelo referido artigo, a regulamentação para o uso das algemas depende de uma manifestação do chefe do Poder Executivo, por meio de decreto, elencando as hipóteses em que o uso das algemas deve ser utilizado.

No Brasil, embora seja dada à matéria pouca atenção, ao longo de 32 (trinta e dois) anos nunca teve uma legislação própria sobre o uso das algemas que disciplinasse vastamente a matéria, especialmente pelas forças policiais, embora contendo mandamento cogente sobre a devida regulamentação do uso das algemas por ato privativo do presidente da república (NUNES, 2013).

Desde 1984, após edição da Lei de Execuções Penais, apenas em 1986 começou a se pensar em um projeto de lei a fim de regulamentar o dito artigo 199 da LEP. Assim, foi elaborado o primeiro Projeto de Lei no Senado sobre a matéria, de nº 241/86, de autoria do ex-senador Jamil Haddad, entretanto foi arquivado no fim da sua legislatura. Como Deputado Federal propôs novamente, através do PL nº 1.918/91, porém ficou durante oito anos em tramitação, sendo arquivado em 1999 (HERBELLA, 2014).

Dado o passo inicial pela regulamentação do artigo 199 da LEP, foram ao longo dos anos propostos outros Projetos de Lei, sendo 14 projetos apensados com o tema algemas tramitando em conjunto e aguardam votação na Câmara dos Deputados e Senado Federal, são eles: PL nº 2.753/2000, PL nº 3.287/2000, PL nº 4.537/2005, PL nº 5.494/2005, PL nº 5.858/2005, PL 3.506/2008, PL 3.746/2008, PL nº 3.785/2008, PL 3.888/2008, PL nº 3.889/2008, PL nº 3.938/2008, PDC nº 853/2008 e PL nº 1.164/2015. Por fim, no Senado Federal tramita o PLS nº 75/2012.

Dos projetos de lei elencados acima, cabe uma atenção especial ao PL nº 5.858/2005 que regula o emprego de algemas pelas forças de segurança pública, de autoria do ex-deputado federal do Estado de São Paulo, Luiz Antônio Fleury Filho. Este projeto, apesar de ter sido proposto no ano de 2005, apresenta uma louvável técnica jurídica, bem como demonstra uma aproximação da realidade policial nos dias atuais. O referido projeto não tem o condão de regulamentar o artigo 199 da LEP, mas sim revogá-lo para que seja elaborada uma lei própria a fim de regular o uso das algemas (HERBELLA, 2014).

Segundo o PL nº 5.858/2005 (p.1-2) em seus artigos 1º ao 5º dispõe da seguinte redação:

Art. 1º O emprego de algemas pelas forças policiais, civis e militares, far-se-á nos termos da presente lei.

Parágrafo único. Para os efeitos desta lei é considerado assemelhado a algemas qualquer meio material utilizado para a contenção de pessoas que seja aplicado nas extremidades dos membros superiores ou inferiores do corpo humano.

Art. 2º A utilização de algemas é permitida, respeitadas as seguintes normas gerais:

I – na condução de preso que possa oferecer algum tipo de risco aos seus condutores ou em relação a quem haja elementos suficientes para que se presuma que se possa evadir;

II – na contenção de grupo de pessoas em que o efetivo policial seja quantitativamente menor;

III – na condução de pessoa acometida de transtorno emocional ou que tenha feito uso de substâncias químicas que possam alterar seu comportamento e cujas reações possam oferecer risco aos seus condutores, a si própria ou aos circundantes;

§ 1º A autoridade imediatamente responsável pela ação policial deverá decidir sobre a utilização das algemas, obrigando-se a preservar o preso da execração pública, bem como de quaisquer agressões físicas ou morais.

§ 2º Em nenhuma hipótese o preso será exposto à imprensa com suas mãos algemadas antes do término da lavratura do auto de flagrante delito. Art. 3 o Comete crime de abuso de autoridade quem conduzir ou autorizar a condução de pessoas com o emprego de algemas em desacordo com o previsto nesta Lei.

Art. 4º Acrescente-se ao texto do art. 3º, da Lei nº 4.898, de 9 de dezembro de 1965, a seguinte alínea

l): “Art. 3º .............

“l) à liberdade de ação, pela contenção com o emprego de algemas, em desacordo com o previsto em Lei.”

Art. 5º Fica revogado o art. 199 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984.

O que se pode perceber do referido projeto é que contem as hipóteses pelas quais os servidores da área de segurança pública podem realizar a contenção por meio das algemas, como também demonstrou que esse ato é discricionário da autoridade imediatamente responsável obrigando-se, por conseguinte, a preservar a imagem do preso e que se evite qualquer tipo de agressão física ou moral contra ele. Por fim, a autoridade que agir em desacordo com os dispositivos legais responderá pelo crime de abuso de autoridade.

Desse modo, a elaboração de uma lei específica que discipline o uso das algemas pelos servidores e segurança pública é de suma importância, uma vez que não sendo regulado traz certa insegurança jurídica tanto para a sociedade, sobretudo para aqueles que atuam diariamente com esse instrumento de contenção.

No próximo tópico, serão analisados os pontos principais do Código de Processo Penal a respeito do uso das algemas.

4.2 Do Código de Processo Penal

Apesar de não existir norma regulamentando a matéria do uso das algemas de forma específica dentro do ordenamento jurídico. O Código de Processo Penal (CPP), instituído pelo Decreto-Lei nº 3.689 de 03 de outubro de 1941 (p.48), especificamente em seu artigo 284 diz que “não será permitido o uso de força, salvo a indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso”. Assim, como regra, no sistema jurídico não é permitida o uso da força, salvo em caso de resistência ou de tentativa de fuga.

Afirma Távora e Alencar (2015, p.825) que:

O uso da força deve ser evitado, salvo quando indispensável no caso de resistência ou tentativa de fuga do preso (art. 284, CPP). O uso desnecessário da força, ou os excessos, podem caracterizar abuso de autoridade, lesões corporais, homicídio etc. Já quanto ao preso, pode incorrer em resistência (art. 329, CP), desobediência (art. 330, CP) ou até mesmo evasão mediante violência contra a pessoa (art. 352, CP).

Destarte, os casos em que o servidor de segurança pública encontra respaldado quanto ao uso das algemas restringem-se a esses dois seguimentos, qual sejam: resistência e tentativa de fuga do preso. Visto que o legislador ordinário demonstrou que essas duas hipóteses são de extrema relevância e vislumbra tanto proteger o preso, como também os agentes em apreço.

Nessa esteira, cabe o ensinamento de Tourinho Filho (2009, p.440) que diferencia resistência passiva da ativa e a tentativa de fuga do preso:

A resistência distingue-se em passiva e ativa. Na primeira hipótese há, como diz Hungria, tão-somente uma oposição ghândica, uma oposição branca, simples manifestação oral de um propósito de recalcitrância, [...]. Traduzindo, apenas, um gesto instintivo de autodefesa, sem intenção positiva de ofender, não constitui a vis característica da resistência. A resistência ativa é aquela na qual existe um manifesto animus oppugnandi.

Em qualquer das hipóteses, admite-se o emprego da força, dentro dos limites indispensáveis para vencer a oposição.

E prossegue

Outra hipótese em que poderá ser usada a força se verifica quando ocorre a fuga do preso. Não se trata, como poderá parecer, apenas da hipótese de alguém que estava legalmente preso. Assim, se a polícia vai prender alguém e este corre, para evitar a prisão, pode o executor, inclusive, usar da força necessária para evitar a fuga [...].

No que tange a resistência por parte do preso, Nucci (2012, p. 620 - 621) afirma também que se divide em resistência ativa e passiva, assim:

No primeiro caso, o preso investe contra o executor da ordem de prisão, autorizando que este não somente use a força necessária para vencer a resistência, como também se defenda. Há, nessa situação, autêntica legítima defesa, [...]. Por outro lado, a resistência pode ser passiva, com o preso debatendo-se, para não colocar algemas, não ingressar na viatura ou não ir ao distrito policial. Nessa hipótese, a violência caracteriza, por parte do executor, o estrito cumprimento do dever legal. Qualquer abuso no emprego da legítima defesa ou do estrito cumprimento do dever legal caracteriza o excesso, pelo qual é responsável o executor da prisão. Note-se, por derradeiro, que o delito previsto no art. 329 do código penal (resistência) somente se perfaz na modalidade de resistência ativa.

Nesse interim, pode-se dizer que a resistência é gênero e que suas espécies pode ser ativa e passiva. A primeira, quando o agente infrator da lei tem o intuito de ofender, agredir, impedir de forma positiva. Nesse caso, configuraria o crime de Resistência, previsto no artigo 329 do CP. A segunda, quando não se tem a intenção (animus) de ofender de forma positiva a integridade física do executor, mas sim causar embaraços durante a sua condução, sendo, por conseguinte, configurado apenas o crime de desobediência, previsto no artigo 330 do CP, salvo outras hipóteses legais.

Outro dispositivo que merece atenção é a resistência oferecida por parte de terceiros em que o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão se utilizar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, conforme o previsto no artigo 292 do Código de Processo Penal (p.50).

Art. 292 se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.

Nesse caso, o servidor de segurança pública pode aplicar a força adequada para defender-se ou para vencer a resistência perpetrada por terceiros, tendo por base o princípio da proporcionalidade, uma vez que a lei não delimitou a sua abrangência, entretanto caso venha a extrapolar esses mecanismos estará sujeito ao postulado da lei de abuso de autoridade, bem como outras infrações em cúmulo material.

Por fim, no ano de 2008, foi realizada uma atualização legislativa por meio da Lei nº 11.689, de 09 de junho de 2008, em que a palavra “algemas” foi introduzida ao Código de Processo Penal (p.83 - 84), especificamente nos artigo 474, §3º e 478, I, a saber:

Artigo 474, in verbis:

[...]

§ 3º não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à integridade física dos presentes;

[...]

Artigo 478 - Durante os debates as partes não poderão, sob pena de nulidade, fazer referências:

I - à decisão de pronúncia, às decisões posteriores que julgaram admissível a acusação ou à determinação do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado.

Assim, ficou sedimentado que o uso das algemas no Tribunal do Júri não é permitida, como regra, durante a permanência do réu no plenário, porém, excepcionalmente, poderá ser utilizado esse instrumento quando absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à integridade física dos presentes, bem como, sob pena de nulidade, as partes durante os debates não poderão fazer referências à determinação do uso das algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o réu.

Nesse ponto, a Jurisprudência do STF e do STJ é no sentido de que a utilização das algemas no plenário do júri é permitida, em caso excepcional, desde que devidamente justificada de maneira clara e objetiva pelo Presidente do Tribunal respectivo.

Assim, conforme o Agravo Regimental julgado pelo STF, proveniente da Reclamação nº 8.628 do Estado de São Paulo ocorrido no ano de 2013 e, o Habeas Corpus nº 9.7049 do Estado do Espírito Santo julgado pelo STJ que ocorreu no ano de 2014, ambos fomentam que a utilização das algemas no plenário do Tribunal do Júri deve ser de caráter excepcional e justificada:

RECLAMAÇÃO - PRETENDIDA ANULAÇÃO DO JULGAMENTO PROFERIDO PELO TRIBUNAL DO JÚRI EM DECORRÊNCIA DE DETERMINAÇÃO JUDICIAL DO USO DE ALGEMAS PELO RÉU DURANTE A SESSÃO PLENÁRIA - ALEGADO DESRESPEITO AO ENUNCIADO CONSTANTE DA SÚMULA VINCULANTE Nº 11/STF - INOCORRÊNCIA QUANDO O ATO RECLAMADO JUSTIFICAR, ADEQUADAMENTE, A NECESSIDADE DA UTILIZAÇÃO DE ALGEMAS - INVIABILIDADE DO ACESSO À VIA RECLAMATÓRIA - PRECEDENTES - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - Inexiste desrespeito ao enunciado da Súmula Vinculante nº 11/STF (que permite, excepcionalmente, o uso de algemas) quando a autoridade judiciária reclamada indicar, de maneira clara e objetiva, as razões justificadoras da necessidade da utilização de algemas.

STF - AG.REG. NA RECLAMAÇÃO Rcl 8.628 SP, Data de publicação: 23/08/2013

PENAL. HABEAS CORPUS. TRIBUNAL DO JÚRI. EMPREGO DE ALGEMAS. SESSÃO DE JULGAMENTO. FUNDAMENTAÇÃO DO RISCO. NULIDADE NÃO RECONHECIDA. 1. Fundada a decisão em condições fáticas de segurança do fórum, na sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri, tem-se condição de legalidade - risco concreto demonstrado - e a revisão da efetiva existência de risco se torna descabida incursão em matéria controvertida de fatos, descabida na via do habeas corpus. 2. A possibilidade de terem os jurados sido influenciados pela condição de acusado algemado é mera probabilidade, sem fundamento probatório certo. Prejuízo direto à defesa, tampouco decorre desta condição. 3. Habeas Corpus não conhecido.

STJ - HABEAS CORPUS HC 9.7049 ES 2007/0301429-2, Data de publicação: 20/06/2014

Pode-se perceber que a regra no ordenamento jurídico é a não utilização do uso das algemas, porém de forma excepcional seu uso será permitido, desde que, seja fundamentado de maneira expressa pelo juiz presidente do tribunal do júri, observando, nesses casos, os regramentos mínimos necessários para se garantir à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas, bem como a integridade física dos presentes.

Vencido os dispositivos que tratam das algemas no Código de Processo Penal passa-se a analisar, logo em seguida, o Código de Processo Penal Militar, como sendo um dos que, também, norteiam o uso das algemas no Brasil.

4.3 Do Código de Processo Penal Militar

O Código de Processo Penal Militar (CPPM) regulado pelo Decreto-Lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969 dispõe em seu artigo 234, e §1º, sobre o uso das algemas, seguindo a mesma linha de raciocínio do Código de Processo Penal, porém dando contornos diferenciados para determinadas pessoas.

Assim, a Lei 1.002/69 (p.53) em seu artigo 234, caput, sedimenta o seguinte posicionamento:

Artigo 234 O emprego da força só é permitido quando indispensável, no caso de desobediência, resistência ou tentativa de fuga. Se houver resistência da parte de terceiros, poderão ser usados os meios necessários par vencê-la ou para defesa do executor e auxiliares seus, inclusive a prisão do ofensor. De tudo se lavrará auto, subscrito pelo executor e pelas testemunhas.

O caput do artigo 234, do CPPM, pode ser visto como um desdobramento lógico do Código de Processo Penal, tendo em vista os elementos que são empregados como, por exemplo, desobediência, resistência, tentativa de fuga e resistência por parte de terceiros. Sendo, nesses casos, permitida a utilização das algemas quando estritamente necessária.

O seu parágrafo primeiro elenca outras hipóteses em que o emprego das algemas deve ser utilizado, bem como adverte sobre a impossibilidade de sua utilização nas pessoas por ela elencadas.

Conforme o §1º, do artigo 234, do CPPM (1969, p.53):

§ 1º O emprego de algemas deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de agressão da parte do preso, e de modo algum será permitido, nos presos a que se refere o art. 242.

Nesse caso, observa-se que caso haja perigo de fuga ou agressão por parte do preso, legitima-se ao servidor de segurança pública a utilização das algemas com a finalidade de realizar a contenção, entretanto, na parte final do dispositivo adverte que de modo algum será permitida a utilização das algemas nas pessoas elencadas no artigo 242, do código de Processo Penal Militar (1969, p.54 -55). Por isso, o mandamento legal dispõe da seguinte redação:

Art. 242 Serão recolhidos a quartel ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão, antes de condenação irrecorrível:

a) os ministros de Estado;

b) os governadores ou interventores de Estados, ou Territórios, o prefeito do Distrito Federal, seus respectivos secretários e chefes de Polícia;

c) os membros do Congresso Nacional, dos Conselhos da União e das Assembleias Legislativas dos Estados;

d) os cidadãos inscritos no Livro de Mérito das ordens militares ou civis reconhecidas em

e) os magistrados;

f) os oficiais das Forças Armadas, das Polícias e dos Corpos de Bombeiros, Militares, inclusive os da reserva, remunerada ou não, e os reformados;

g) os oficiais da Marinha Mercante Nacional;

h) os diplomados por faculdade ou instituto superior de ensino nacional;

i) os ministros do Tribunal de Contas;

j) os ministros de confissão religiosa.

Sobre esse dispositivo cabe à crítica de Távora e Alencar (2015, p.826) que:

Ao vedar o uso de algemas em determinadas autoridades e portadores de diploma em curso superior, afigura-se anti-isonômica, por não se compatibilizar com o sistema constitucional. Todavia, a primeira parte do texto normativo indica os limites para o uso das algemas e se ajusta aos ditames da constituição do Brasil.

Nesse sentido, o artigo 242, do CPPM mostra-se destoado do postulado jurídico da igualdade previsto na constituição Federal de 1988, de forma a trazer um tratamento diferenciado a aqueles que se encontrarem nas mesmas condições jurídicas, ou seja, existe um privilégio que a lei não contempla, ferindo, consequentemente, o princípio da igualdade contemplado pela Carta Política de 1988.

Ao revés, não sem razão, entende Tourinho Filho (2012, p.660) que:

Em rigor a prisão especial deveria ser estendida a todas as pessoas que fossem presas provisoriamente. Ante a impossibilidade, por falta de recursos e estrutura, limitou-se o legislador a distinguir certas pessoas em vista da sua escolaridade e das funções que exercem no meio social. Não se trata de privilégio, como se propaga na imprensa, mas de uma homenagem em razão das funções que certas pessoas desempenham no cenário político-jurídico da nossa terra, inclusive o grau de escolaridade.

Assim, hodiernamente, essa celeuma a respeito da prisão especial encontra-se sedimentada no sentido de que as pessoas elencadas no artigo 242, do CPPM não se trata de um privilégio, mas sim utiliza-se de certo critério escolar, bem como uma homenagem aos que exercem certa função estatal no meio político-jurídico, desempenhando, portanto, uma posição diferenciada no meio social.

Após a análise do Código de Processo Penal Militar, será disposto no próximo tópico o Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo, também, de suma importância para o estudo das algemas.

4.4 Do Estatuto da Criança e do Adolescente

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) encontra-se regulamentado pela Lei nº 8.069, de 13, de julho de 1990, no qual não proíbe expressamente a utilização das algemas em menores em conflito com a lei, porém há de se observar o preceito contido no artigo 178 (p.57), deste diploma que norteia algumas peculiaridades, a saber:

Artigo 178 O adolescente, a quem lhe atribua autoria de ato infracional não poderá ser conduzido ou transportado em compartimento fechado de veículo policial, em condições atentatórias à sua dignidade, ou que lhe impliquem risco à sua integridade física ou mental, sob pena de responsabilidade.

O referido dispositivo norteia no sentido de que o adolescente, em que fora atribuída a autoria de ato infracional, não poderá ser conduzido ou transportado em compartimento fechado de veículo policial. Nesse sentido, deve-se observar que a palavra “adolescente” foi utilizada de maneira genérica, abarcando também o termo criança. Outro ponto é que não se trata de um dispositivo absoluto, pois, o termo “poderá” demonstra essa flexibilidade. Assim, caso as condições sejam favoráveis e as circunstâncias do caso concreto autorizem o mandamento contido no artigo 178 deve ser obedecido, sob pena de responsabilidade.

Assim, seguem as considerações de Brene e Lépore (2015, p.219) sobre a responsabilização do menor em conflito com a lei pela prática de ato infracional em que afirma:

É preciso identificar se a data do fato (artigo 104, ECA) o menor de 18 anos era criança ou adolescente. O artigo 2º, do ECA aduz que considera-se criança toda pessoa com até 12 anos incompletos e adolescentes quem tem entre 12 anos completos e 18 anos incompletos.

Nesse sentido deve ser observada no momento da apreensão do menor infrator, qual a situação jurídica, sendo criança ou adolescente, pois, exigirão tratamentos conforme as peculiaridades do caso, a fim de evitar risco a sua integridade física ou mental, bem como condições atentatórias a sua dignidade humana.

No que toca a utilização das algemas em menores em conflito com a lei, bem como a observância aos preceitos contido na Súmula Vinculante nº 11 do STF, Greco (2011, p.39) não sem razão, afirma:

De acordo com Estatuto da Criança e do Adolescente, esses adolescentes podem praticar atos infracionais que permitem a sua internação. Muitos deles, inclusive, são mais perigosos do que aqueles que já atingiram a maioridade penal, possuindo estatura e força de pessoas adultas. Nesses casos, presentes os requisitos da Súmula Vinculante nº 11 seria possível algemar um adolescente infrator? A resposta só pode ser positiva. Não podemos agir da ingenuidade nessas situações, argumentando simplesmente com a menoridade daquele que praticou uma conduta considerada gravíssima, com risco, inclusive, para a própria integridade física ou a vida dos policiais que participaram da diligência que culminou na prisão.

Portanto, pode-se dizer que a utilização das algemas em menores infratores requer uma cautela maior, pois, a depender do caso concreto a utilização estará sim legitimada, uma vez que os requisitos autorizativos constantes na Súmula Vinculante nº 11, como resistência, fundado receio de fuga, perigo a integridade física própria ou alheia, desde que justificada a excepcionalidade por escrito.

Analisado o que dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente, passa-se no próximo tópico o disposto nas Leis de Segurança da Água e do Ar.

4.5 Das Leis de Segurança da Água e do Ar

A segurança do tráfego aquaviário em águas sob a jurisdição nacional encontra-se regulamentada pela Lei nº 9.537, de 11 de dezembro de 1997 (p.1), no qual dispõe em seu artigo 10, inciso III, sobre a utilização das algemas pelo comandante no exercício das suas funções e com o fito de salvaguardar as pessoas, a embarcação e a carga transportada, veja o dispositivo:

Art. 10. O Comandante, no exercício de suas funções e para garantia da segurança das pessoas, da embarcação e da carga transportada, pode:

[...]

III - ordenar a detenção de pessoa em camarote ou alojamento, se necessário com algemas, quando imprescindível para a manutenção da integridade física de terceiros, da embarcação ou da carga;

Assim, pode-se perceber o caráter excepcional disposto no referido artigo, tendo em vista que o uso das algemas requer uma circunstância necessária e justa para que o seu ato seja validado, ou seja, não é um simples ato que ensejaria a utilização das algemas pelo comandante da embarcação, mas sim é condição sine qua non que seja imprescindível a proteção à integridade das pessoas, da embarcação, ou mesmo da carga que esteja sendo transportada.

Outro regramento que se refere ao uso das algemas é o Código brasileiro da Aeronáutica regulamentado pela Lei nº 7.565, de 19 de dezembro de 1986, que em seu artigo 168 (p.37) também ressalta a utilização das algemas em situações que tivesse pondo em risco a proteção da aeronave, pessoas e bens transportados.

Art. 168 Durante o período de tempo previsto no artigo 167, o Comandante exerce autoridade sobre as pessoas e coisas que se encontrem a bordo da aeronave e poderá:

[...]

II - tomar as medidas necessárias à proteção da aeronave e das pessoas ou bens transportados;

Segundo o artigo 167, caput, da Lei nº 7.565/86 (p.37) ressalta que o “comandante exerce autoridade inerente à função desde o momento que se apresenta para o voo até o momento em que entrega a aeronave, concluída a viagem”. Assim sendo, pode-se perceber que o legislador procurou manter um lapso temporal de início e término do exercício da autoridade como comandante da aeronave, ou seja, para qualquer tipo de responsabilidade (administrativa, civil ou penal) o dispositivo informa que o momento inicial é aquele em que o comandante se apresenta para o voo e, o término, quando há entrega da aeronave ao final da viagem.

Portanto, por meio dessas leis que conferem o poder de polícia aos comandantes tanto na água como no ar, indicam que o algemamento de alguém que venha a por em risco a segurança desses meios de transporte é legal do ponto de vista jurídico.

Outro dispositivo importante e pioneiro no Brasil são as Normas do Estado de São Paulo sobre o uso das algemas, sendo explanado no próximo tópico.

4.6 Das Normas do Estado de São Paulo

Ante a ausência de regulamentação legal sobre o uso das algemas em âmbito nacional, o Estado de São Paulo foi o precursor por meio de um Projeto de Lei nº 443/2007, de autoria do Deputado Baleia Rossi – PMDB, que foi, posteriormente, convertida na Lei Nº 12.906, de 14 de abril de 2008 que estabelece normas suplementares de direito penitenciário e regula a vigilância eletrônica.

Não se trata de uma norma de natureza penal, tendo em vista a vedação contida no Artigo 22, I, da Constituição Federal de 1988 (p.18), mas sim de natureza penitenciário. Nesse caso, o Estado membro pode legislar sobre a utilização das algemas em âmbito local. Caso sobrevenha lei Federal dispondo sobre a matéria, ficará suspensa a eficácia dos dispositivos que forem contrários ao mandamento legislativo federal.

Pertinente é o posicionamento de Herbella (2014, p.92) sobre o regramento utilizado pelo Estado de São Paulo:

Louvável é, a nosso ver, o uso de equipamentos eletrônicos para o monitoramento dos presos. Para que ele seja adequadamente usado e se harmonize com o nosso ordenamento jurídico, contudo, deve-se substituir o bracelete por tornozeleira, que também é prevista na lei específica. Definitivamente, uma tornozeleira pode, com mais facilidade, ser utilizada de forma discreta e sem expor o submetido a constrangimento perante toda sociedade, causando-lhe desnecessária e desmedida execração.

O principal objetivo da lei estadual foi, justamente, regulamentar o uso de algemas e tornozeleiras eletrônicas com o fito de melhor fiscalizar os presos que se encontram no regime aberto e semiaberto, fazendo com que se evite que o detento não retorne quando em livramento condicional, indulto ou saída temporária, bem como redução dos custos para o Estado.

Interessante ressaltar que a utilização correta deste regramento colabora com a redução da violência, evita que o detento durante esse período de liberdade provisória possa vir a fugir, bem como age em consonância com os princípios fundamentais do ordenamento jurídico, uma vez que o Estado age como um colaborador na ressocialização dos apenados.

Terminada essa explanação sobre As Normas do Estado de São Paulo, o próximo típico será sobre as Regras Mínimas para Tratamento de Presos no Brasil.

4.7 Das Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil

Sobre as Regras Mínimas para Tratamento do Preso no Brasil, que foi aprovado por unanimidade, pelo o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), em sessão de 17 de outubro de 1994, bem como foi considerada a recomendação do Comitê Permanente de Prevenção ao Crime e Justiça Penal das Nações Unidas, realizada em 26 de abril a 6 de maio de 1994, do qual o Brasil é Membro e o disposto na Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal) , o qual resultou na edição, pelo CNPCP, a Resolução nº 14, de 11 de novembro de 1994 (p.4-5) que em seus artigos 25 e 29 ressaltou sobre a utilização das algemas em âmbito federal nas seguintes hipóteses:

Art. 25. Não serão utilizados como instrumento de punição: correntes, algemas e camisas-de- força.

[...]

Art. 29. Os meios de coerção, tais como algemas, e camisas-de-força, só poderão ser utilizados nos seguintes casos:

I – como medida de precaução contra fuga, durante o deslocamento do preso, devendo ser retirados quando do comparecimento em audiência perante autoridade judiciária ou administrativa;

II – por motivo de saúde, segundo recomendação médica;

III – em circunstâncias excepcionais, quando for indispensável utiliza-los em razão de perigo eminente para a vida do preso, de servidor, ou de terceiros.

Insta salientar que os referidos artigos demonstram uma preocupação que se amolda aos preceitos de justiça e razoabilidade, tendo em vista o standard da dignidade da pessoa humana, pois utilizar as algemas como forma de punição afronta sobremaneira o Estado Democrático de Direito.

Assim, as algemas servem para uma contenção momentânea para que se evite um mal maior como, por exemplo, fuga, deslocamentos para fora do estabelecimento prisional e outras situações excepcionais, pois o rol é meramente exemplificativo.

Por fim, serão dispostos no item abaixo os ensinamentos da Súmula Vinculante nº 11, que veio como forma de solucionar os problemas que cercam o uso das algemas no Brasil.

4.8 Da Súmula Vinculante nº 11, do Supremo Tribunal Federal

Como forma de buscar o melhor entendimento sobre a Súmula Vinculante nº 11, do Supremo Tribunal Federal sobre o uso das algemas é importante que, primeiramente, se faça uma explanação da origem deste instituto na órbita jurídica brasileira.

A Súmula Vinculante como bem afirma Bulos (2014, p.1334) pode ser conceituada como o “instrumento que permite ao Supremo Tribunal Federal padronizar a exegese de uma norma jurídica controvertida, evitando insegurança e disparidade de entendimento em questões idênticas”, ou seja, a súmula é o mecanismo pelo qual se busca evitar controvérsias a respeito de determinada matéria a fim de promover a segurança jurídica do ordenamento jurídico.

No mesmo sentido Moraes (2014. p.815-816) informa que:

As súmulas vinculantes surgem a partir da necessidade de reforço à ideia de uma única interpretação jurídica para o mesmo texto constitucional ou legal, de maneira a assegurar-se a segurança jurídica e o princípio da igualdade, pois os órgãos do Poder Judiciário não devem aplicar as leis e atos normativos aos casos concretos de forma a criar ou aumentar desigualdades arbitrárias, devendo, pois, utilizar-se de todos os mecanismos constitucionais no sentido de conceder às normas jurídicas uma interpretação única e igualitária.

Assim, a súmula tem a finalidade de reforçar uma ideia seja do ponto jurídico constitucional ou infralegal, como forma de garantir uma interpretação única e igualitária dentro do território nacional, proporcionando, por conseguinte, ao aplicador da lei a segurança jurídica necessária sobre determinada matéria polêmica e reiterada no âmbito dos tribunais.

A disciplina sobre a Súmula Vinculante encontra-se previsto no artigo 103-A, da Constituição Federal de 1988 (p.67), sendo introduzida pela Emenda Constitucional nº45, de 30 de dezembro de 2004, cujo dispositivo aduz o seguinte:

Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.

§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.

§ 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.

§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.

A edição da Súmula Vinculante é de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal (STF), podendo ser realizada de ofício ou por provocação, exigindo-se a decisão de dois terços dos seus membros, depois de reiteradas decisões polêmicas controvertidas sobre matéria constitucional. Isto é, determinações sobre a interpretação das leis de forma geral e irrestrita, devendo ser obedecida pelos órgãos do judiciário e da administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como sua revisão ou cancelamento devem ser feito pelo próprio Supremo.

O §1º demonstra o objetivo da Súmula Vinculante que é a busca da validade, interpretação e a eficácia das normas, sobre o qual recai controvérsia atual seja entre os órgãos do judiciário seja entre esses e a administração pública que ensejem grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. Segundo Gomes (2012, p.17) o objetivo da súmula foi a “diminuição no número de processos, visto que, como a determinação do Supremo deve ser seguida pelos demais órgãos do Poder Judiciário”. Ou seja, não haveria, em tese, divergência porque a matéria já estaria pacificada.

O §2º indica quais as pessoas estariam legitimadas a provocar o STF para que a súmula seja aprovada, revisada ou cancelada, isto é, a legitimidade repousa naqueles que podem propor ação direta de inconstitucionalidade, conforme artigo 103, da Constituição Federal de 1988.

Por fim, o §3º ressalta que o ato administrativo ou decisão judicial que contrariar o entendimento da Súmula Vinculante ou que indevidamente seja aplicada, caberá reclamação ao STF que, sendo julgada procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial, determinando que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. Isso demonstra que a aplicação da súmula vinculante deve ser aplicada de forma cogente pela administração pública direta e indireta, bem como a todos os órgãos do judiciário.

Feitas essas considerações preliminares acerca da súmula vinculante, importante se faz nesse momento a análise da Súmula Vinculante nº 11, do STF que em seu teor aduz:

Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

Assim, o uso das algemas passou de regra à exceção, restringindo-se as hipóteses de casos de resistência, fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, exigindo-se em qualquer caso a sua justificação por escrito, sob pena de nulidade da prisão ou do ato processual, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado, bem como a responsabilização administrativa, civil ou penal pela quais incorrerem o servidor de segurança pública ou autoridade policial.

Segundo Herbella (2014, p.93) a inspiração para que fosse editada a Súmula Vinculante nº 11, pelo STF se deram no “julgamento do HC nº 91952 – SP, que discutia o fato do réu ter permanecido algemado durante sessão do tribunal do júri, reconhecendo a necessidade de editar uma súmula vinculante a tal respeito”. Nesse julgado, ocorrido no dia 7 de agosto de 2008, o STF anulou o julgamento de um pedreiro que permaneceu algemado durante toda a sessão do tribunal do júri, pois nesse caso entendeu-se que não havia necessidade e, por conseguinte, influenciou os jurados na decisão final.

No intuito de pacificar a celeuma no que tange ao uso das algemas, o STF acabou criando uma nova polêmica que, segundo Capez (2013, p.323):

Vale, primeiramente, deixar consignado que a mencionada Súmula longe está de resolver os problemas relacionados aos critérios para o uso de algemas, na medida em que a sua primeira parte constitui mero reflexo dos dispositivos já existentes em nossa legislação, deixando apenas claro que o emprego desse instrumento não é um consectário natural obrigatório que integra o procedimento de toda e qualquer prisão, configurando, na verdade, um artefato acessório a ser utilizado quando justificado.

Do preceptivo pode-se abstrair que a Súmula apenas realizou um recorte de outras hipóteses já mencionadas em outros dispositivos legislativos, deixando apenas expresso que o ato de algemar uma pessoa não é procedimento obrigatório e necessário em todos os casos, mas sim de forma excepcional, tanto é que a súmula ressalta a necessidade de sua justificação.

Segundo Távora e Alencar (2015, p.827) para que sejam utilizadas as algemas:

A necessidade de justificação passa a ser da essência do ato, cabendo ao próprio magistrado, quando já identificada a periculosidade do indivíduo, fazer constar no mandado de prisão a necessidade do uso das algemas. Nada impede que delegue à autoridade policial executora da medida tal análise. Na ausência de manifestação judicial, ou nas hipóteses de flagrante ou de mero deslocamento de presos nos atos de rotina, como ida ao fórum, condução ao IML para a realização do exame de corpo de delito, dentre outros, caberá ao condutor justificar o emprego das algemas.

Essa justificação passando a ser essência do ato como bem preceitua a Súmula Vinculante, para que se possa analisar posteriormente a necessidade ou não da utilização das algemas, conforme o caso concreto. Não pode interpretar a Súmula como obstáculo a efetivação do ato, pois o sentido norteador comunga no sentido de que a utilização desse instrumento de contenção seja utilizada quando estritamente ligado às hipóteses por ela disciplinado, como forma de minimizar os excessos.

Adverte Capez (2013, p.323) que:

Muito embora a edição da Súmula vise garantir a excepcionalidade da utilização de algemas, na prática, dificilmente, lograr-se-á a segurança jurídica almejada, pois as situações nelas descritas conferem uma certa margem de discricionariedade à autoridade policial, a fim de que esta avalie nas condições concretas a necessidade de seu emprego.

Diante das hipóteses elencadas pela Súmula pode-se perceber certo grau de subjetividade, pois numa avaliação pormenorizada dos elementos fáticos que ocorrem no caso concreto, o servidor da área de segurança pública estaria autorizado a utilizar as algemas. Importante também, que não seria possível uma lei ou mesmo uma Súmula Vinculante prever todos os casos que ensejariam a utilização das algemas. Por isso, faz-se necessária esse grau de discricionariedade como, válvula de escape, para que a norma se amolde ao fato concreto.

Com precisão Herbella (2014, p.98) afirma que deve haver um meio termo no que tange a proteção dos direitos e garantias individuais do cidadão e o interesse social, pois:

Alguns só defendem os direitos e garantias individuais, olvidando-se de que também merece guarida o interesse social. Mas outros, dizendo atuar em nome desse ultimo, relegam aqueles a segundo plano, o que é inconcebível num Estado Democrático de direito. A referida Súmula primou, sem dúvida, pela proteção aos interesses individuais de quem está sendo submetido à privação estatal da liberdade. Mas atende também ao interesse de todos os outros membros da sociedade (policiais, juízes, promotores, advogados, funcionários e demais frequentadores de delegacias, fórum e tribunais), que têm o direito de ir e vir sem o latente risco de que, numa tentativa de fuga ou resgate, um preso ofenda a sua integridade física? Será que, na verdade, não se está confundindo a divulgação da imagem da pessoa algemada com o próprio ato de algemas em si?

Assim, há entendimentos que os direitos e garantias fundamentais do preso ou detido devem ser respeitados sobre qualquer pressuposto, enquanto outros advogam sob o manto do interesse social. Nesse ponto, a professora Herbella se filia a um meio termo, no qual se deve atender tanto aos direitos e garantias fundamentais do preso, como daqueles que executam os dispositivos legais em prol do Estado como, por exemplo, os policiais que diuturnamente realizam prisões, conduções, custódia em hospitais entre outros. O que a Súmula esqueceu foi de proteger também os direitos dos servidores da área de segurança pública e outras autoridades que podem vir a ter a sua integridade física violada, pois muitas vezes confunde-se a divulgação da imagem da pessoa algemada com o próprio ato.

A súmula traz algumas consequências provenientes do descumprimento das formalidades do ato, quanto pela ausência de justificação como pela fundamentação inconsistente que ensejam a responsabilidade administrativa, civil e criminal, a depender do caso, pode caracterizar também o abuso de autoridade, como pela necessidade de indenizar diante dos danos materiais ou morais, principalmente pela exposição do preso em público diante da imprensa ou outra forma degradante similar. (TÁVORA; ALENCAR, 2015).

Portanto, os servidores da área de segurança pública, bem como os magistrados devem fundamentar a utilização das algemas. Que, segundo Capez (2013, p.324) “não há outra formula a não ser o bom senso e a razoabilidade”. Nesse sentido, pode-se afirmar que a súmula não visou resolver todos os problemas que decorrem do uso das algemas, mas sim que o uso desse instrumento não seja uma regra utilizada por todos, mas somente nos casos em que haja a real necessidade como forma de se evitar excessos que possam vir a denegrir a imagem do preso, ferindo direitos protegidos na Constituição.


5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme exposto no decorrer do estudo sobre a utilização das algemas pelos Servidores da Área de Segurança Pública, no ordenamento jurídico brasileiro sob o enfoque constitucional e infraconstitucional, pode-se perceber que até hoje não existe regulamentação do artigo 199, da Lei de Execuções Penais. Ante essa omissão, cabe a análise de outros dispositivos jurídicos, bem como a interpretação doutrinária a respeito dessa temática ainda tão presente nos dias atuais.

Não se pode perder de vista, que mesmo não se tendo uma regulamentação específica que o discipline, é possível obter algumas regras de conduta para que os servidores da área de segurança pública, integrante de cada órgão, possam exercer o seu ofício e, utilizar este instrumento de forma adequada e atual à luz dos princípios que norteiam o Estado Democrático de Direito, sobretudo sob o manto dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, uma vez que seu uso encontra respaldo em algumas leis infraconstitucionais como, por exemplo, no Código de Processo Penal. Código este que sofreu uma alteração através da Lei nº 11.689, de 9 de junho de 2008 que inovou no ordenamento pátrio para regulamentar o uso das algemas no Tribunal do júri.

É inegável que a utilização das algemas precisa estar em consonância com princípios como, legalidade, dignidade da pessoa humana, entre outros. Entretanto, é no princípio da proporcionalidade que repousa o recurso hábil a resolver a celeuma que o cerca, pois cada caso concreto vai exigir uma forma diferente de encarar o problema.

A finalidade que se depreende da utilização desse instrumento é no intuito de realizar a contenção, sobretudo garantindo que não seja violado o direito de imagem do preso/detido ou como forma de humilhação, castigo ou tortura. Isso demonstra que os direitos e garantias protegidos pela Constituição Federal de 1988 são aplicados indistintamente até para aqueles que violam o ordenamento jurídico.

De todos os regramentos jurídicos que, direta ou indiretamente, norteiam a utilização das algemas pelos servidores da área de segurança pública cabe destacar a Súmula Vinculante nº 11 que buscou por fim a casuística, mas não se teve o sucesso esperado, pois, ao invés de resolver acabou por provocar outros, uma vez que legitimou o uso das algemas nos casos de resistência, fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros. Com isso, a Súmula Vinculante exigiu que o uso das algemas seja fundamentado por escrito, sob pena de responsabilidade e (ou) de nulidade da prisão.

Após a edição da Súmula, pode-se perceber que seu objetivo foi mitigar as arbitrariedades cometidas por agentes de segurança pública, bem como evitar a análise de recursos sobre a matéria perante o próprio Supremo.

Assim, surgiu a seguinte indagação para que esse estudo se tornasse promissor: no Brasil, o uso das algemas pelos servidores da área de segurança pública está devidamente regulamentado constitucional e infraconstitucionalmente? Pelo que foi exposto, fica claro que o uso das algemas não está amplamente regulamentado, mesmo com a edição da Vinculante nº 11, pois não se coaduna com o espírito dos tempos de hoje no combate à criminalidade que só tende a crescer. Entretanto, há de se concordar que o uso das algemas no Tribunal do júri já se encontra regulamentado.

Ademais, o uso das algemas mesmo não estando devidamente disciplinado não abre azo a práticas desumanas ou degradantes, devendo-se prevalecer o bom senso, a prudência, o equilíbrio e a moderação desse instrumento tão importante tanto para a sociedade, sobretudo para os policiais que estão no fronte para salvaguardar os bens mais importantes, mesmo com o risco da própria vida.

Cabe, por fim, a reflexão entre os estudiosos do direito, bem como de toda sociedade civil organizada a respeito do uso das algemas, isenta de paixões ou parcialidades, em prol de uma sociedade mais justa e solidária na busca de se recuperar o senso ético e moral como fonte basilar de um Estado Democrático de Direito em que os direitos e garantias fundamentais o qual se tem o Princípio da dignidade Humana como célula mater de todo o sistema jurídico.


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