O conceito de Direito interpretado pela Filosofia Jurídica

Leia nesta página:

Para comentarmos sobre o surgimento do conceito de Direito dentro da filosofia jurídica, é necessário discorrer sobre Direito e a moral e sobre alguns acontecimentos importantes da história da filosofia.

 

 

Fato, valor e norma na história da filosofia

Na Idade Antiga, os povos orientais identificavam como poder a religião. Somente na Grécia, em suas cidades-estado, que esse pensamento foi alterado. Os gregos tentavam separar a mitologia do poder político. A partir disso, Sócrates defendeu a ideia de que a virtude leva à justiça e a moral, aqui temos a primeira relação entre o Direito (ainda que não concretizado) e a moral. 

Foi no Helenismo que temos o que chamamos de escolas morais. Nelas, a moral é mais importante que a política. Existem duas vertentes: o epicurismo- culto ao prazer- e o estoicismo- anulação dos desejos. Em meio a essas escolas, temos Cícero, que acreditava que existia uma lei natural que regia o universo- essa lei seria responsável pela igualdade entre os homens. Assim, partimos para a necessidade de uma legislação única (constituição). 

Na Idade Média, Santo Agostinho acreditava que os cristãos deveriam obedecer às leis como forma de devoção à Deus, é com esse pensamento que criou o pensamento de que a justiça verdadeira é de ordem cristã e sobrenatural. Já São Tomás de Aquino pensava que o homem é um animal político e social- assim como desenvolvido por Aristóteles anteriormente- e que as leis possuíam uma hierarquia, sendo a Lei Eterna a mais importante. 

Foi na Idade Moderna que Maquiavel separou a política da ética. Kant, pelo contrário, voltou a fazer esta associação. Surge, então, o direito- associado à liberdade externa- e a ética- associado à liberdade interna. Nesta época ocorreu diversos posicionamentos sobre o Estado de Direito, onde Hegel, Marx e Comte divergiam em suas constatações do ideal. Comte foi importante para o desenvolvimento da prática do direito, pois desenvolveu o Positivismo. Nele, acreditava que são as ideias que moldam as sociedades. 

Quando falamos de juspositivismo, Norberto Bobbio é referência. Acreditava que o fundamento do direito é a lei e que a Declaração Universal dos Direitos Humanos é uma prova de um consenso universal. Para ele, a função do Direito é defender o homem dos diferentes tipos de poder, mesmo que por resistência da norma. 

No Brasil, Miguel Reale trouxe a teoria tridimensional do direito, considerando uma ordenação heterônoma, dinâmica e mutável de acordo com o tempo e o espaço na qual a norma está inserida. Nessa teoria, está presente a dialética da complementaridade, pautada nos conceitos de fato, valor e norma. Temos também outras teorias, como o Positivismo Jurídico- preservação do processo legislativo e respeito aos princípios constitucionais (Nader, p. 178)-, o Realismo Jurídico- Jurisprudência como única fonte do direito- e o Pós-positivismo- busca na equidade; neoconstitucionalismo.

Partindo para a axiologia, percebe-se que o Estado não é o único criador da norma jurídica, temos também a ordem religiosa, a ordem moral e a ordem de trato social.

O Direito e a moral se aproximam pois são eles que disciplinam a relação entre os homens através da norma, ambos podem se modificar e são vistos como uma necessidade para proporcionar a coesão de uma sociedade. Por outro lado, apresentam diferenças quanto às reações e as consequências. Enquanto a moral terá reação interior, da consciência e autônomas , o Direito terá consequências externas, heterônomas.

Podemos também relacionar esses dois conceitos com a Teoria do Mínimo Ético. O filósofo Jeremy Bentham propôs o pensamento dos círculos concêntricos. Desta forma, o direito ideal representa o mínimo de moral para que a sociedade possa sobreviver. Assim, todo o direito teria dentro de si, a moral, mas toda a moral não está presente no direito. Acreditava que desta maneira a moral seria cumprida de modo instantâneo- como objetivo da paz social. 

É claro que, sendo um modelo ideal, não é este que será possível para a sociedade. O que vimos são os círculos secantes, onde o Direito possui parte da moral e também possui partes que não estão associadas a ela. Esta teoria é a que expõe nossa realidade. 


O direito e a moral

Os grupos sociais são frutos das normas, desta forma, cada grupo social tem suas regras, indo além das jurídicas. Temos: Ordem moral, Ordem religiosa, Ordem de trato social e a Ordem jurídica. Todas essas possuem conceitos, sanções e normas diferentes, variando conforme o grupo no qual estão inseridas. 

A moral se difere do Direito, possuindo porém uma série de características que as tornam semelhantes de algum modo. Eles também se distinguem pela forma na qual reagem à um descumprimento:

  • Direito: Consciência; Sanção; Coerção.

  • Moral: incompatível com a força.

Para o Direito acontecer, torna-se necessário uma organização de poder, para que desta forma seus preceitos sejam efetivados. Miguel Reale afirma Como as normas jurídicas visam a preservar o que há de essencial na convivência humana, elas não podem ficar à mercê da simples e boa vontade, da adesão espontânea dos obrigados. É necessário preservar-se a possibilidade do seu cumprimento obrigatório.

O Poder possui relação com o controle social. O exercício desse mecanismo significa influenciar o comportamento das pessoas. Nesse viés, acaba criando uma desigualdade que impõe a vontade para alguém que se submete a isso. Quanto maior o poder, maior as formas de coerção. 

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Cada forma de Poder possui uma fonte de legitimidade, vejamos:

  • Sociedades Modernas: Poder adquirido através da legalidade; Constitucionalizado;

  • O Direito colabora para a legitimação do poder.

 

Legitimidade do Poder

É quando uma sociedade determina se a conduta é justa ou não. Um amplo consenso, reconhecimento de que a autoridade está agindo corretamente, tornando-o assim líder legítimo. O Direito é instrumento de legitimidade porque mostra a ligação entre sistema jurídico e justiça e qual sensação de segurança que elas oferecem ao cidadão.

Quando nos referimos à legitimidade do poder, falamos de poder político, da forma na qual um Estado utiliza esse instrumento e de que forma o mesmo poderá ser melhor aproveitado. Para ser legítimo, deverá agir conforme as exigências da comunidade na qual está inserido. 

Existem dois tipos de legitimidade:

  1. Legitimidade Legal: necessária no capitalismo; submissão somente de ordens vindas de normas jurídicas expressas na Constituição; legalidade como um elemento crucial para um bom funcionamento da gestão; segurança jurídica; consenso.

  2. Legitimidade Material: justiça; conforme as ideias de liberdade, igualdade e solidariedade.

Reconhecer a legitimidade, no entanto, não significa apoiar todos os atos do Governo. Assim, a oposição e tentativas de alteração de algumas decisões continuam existindo, promovendo o exercício da liberdade política.

A legitimidade pode trazer consigo crises e mudanças sociais, aumentando a tensão entre os habitantes e podendo destruir a ordem. Como diz Sabadell:

Os sistemas políticos sem consenso não dispõem dos meios necessários para coordenar e impor suas decisões. Por tal motivo, empregam a coerção como meio para enfrentar a resistência que lhes é oposta. Isto, porém, somente agrava a crise de legitimidade do poder.

Desta forma, o direito é um meio de legitimação, de pacificação de uma sociedade e de consenso, evitando, assim, a sensação de insegurança.

Sobre os autores
Isabela Maria de Resende Cavalcante

Graduanda em Direito da Universidade Católica de Santos, estagiária na Secretaria de Assuntos Jurídicos da Prefeitura de Cubatão, fundadora do GirlUp na Baixada Santista e com artigos aprovados no CIDH Coimbra e na Conferência Euro americana de Direitos Humanos.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos