Privacidade e direito a intimidade no ambiente de trabalho: O limite entre o pessoal e o corporativo.

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A Privacidade é um direito garantido, mas por vezes estes direito conflitam. Sem esgotar o tema, a LGPD dentro dentro de um ambiente corporativo, como separar o pessoal do profissional?

Introdução

Sabemos que em tempos e condições normais, uma pessoa em idade laboral passa mais tempo com seus colegas de trabalho do que com sua própria família. Em regra geral, são mais de 9 horas diárias, incluso o tempo de almoço e possíveis descansos compartilhando informação com colegas, muitas delas entendidas como de natureza “intima”. Desta feita, muitos de nossos segredos e intimidades são propagadas com colegas de trabalho, que ao longo do tempo muito sabem de nossas idiossincrasias.

Mas qual é o limite desta privacidade? Ate onde a empresa pode ir ou ser responsabilizada por possíveis ‘invasões” ou “vazamentos” de nossa intimidade.

Íntimo e privativo é aquilo que é muito particular da pessoa. Como ponto de partida, a própria Constituição Federal traz, em seu artigo 5º, inciso X, que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. A luz do diploma da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD)[2], em seu artigo 2º, inciso I, versa imperativamente sobre o respeito à privacidade.

Ainda que não diretamente ligada ao ambiente laboral, a consagração do direito à privacidade é percebida em sentido amplo e pode abranger todas as manifestações da esfera íntima, privada e da personalidade das pessoas, seja dentro ou fora do contexto laboral.

Mas então qual é a postura esperada por profissionais em ambientes corporativos e como se pode diferenciar o que é tema privado do interesse empresarial?

Quando falamos em invasão de privacidade dentro do ambiente corporativo devemos agir com prudência e cautela para diferenciar o que é ser invasivo e como se deu um dado fato.

É entendido uniforme pelo S.T.F.[3] que não existe direito absoluto e que em certos casos pode haver conflitos entre estes direitos, assim faz-se necessário analisar o caso concreto em particular, para quando possível, evitar maior dano ou exposição a intimidade da pessoa. Os princípios da proporcionalidade e razoabilidade devem sempre pautar-se com ponderação os tramites processuais.

Intimidade no Ambiente Corporativo.

O ambiente corporativo é recheado de ferramentais que expõe a intimidade. Serviços eletrônicos de e-mail, mensageria instantânea, redes sociais, CFTV[4], coletas de biométrica para controles de acesso, prontuários cadastrais, etc. são alguns exemplos de como a empresa tem, em larga escala, acesso a nossas informações, ora classificadas como privativas, além de claro, saber nosso perfil de produtividade, ou o quanto somos eficientes para a corporação. Sabem que hora chegamos, saímos, quantos e-mails mandamos ou respondemos, quanto gastamos em redes sósias e que sabe, nosso perfil de consumo ou tendências apologéticas[5]

Isto requer, impreterivelmente que a empresa tenha políticas claras de comportamento para definir o que é ou não aceitável dentro da corporação, ainda com suporte aos princípios da finalidade e transparência, ambas ditadas pela própria LGPD. Ou seja, a empresa pode realizar o tratamento para propósitos legítimos, específicos, explícitos e informados ao titular (empregado), sem possibilidade de tratamento posterior de forma incompatível com essas finalidades; garantindo a seus empregados, informações claras, precisas e facilmente acessíveis sobre a realização do tratamento destes dados, que podem ser comparados a dados sensíveis, segundo esta lei.

Não encontramos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)[6] leis especificas sobre a privacidade no ambiente de trabalho. Assim, como já dito é altamente recomendado que as empresas tenham um código de conduta e ética acessível e atualizado para todos os colaboradores que atuam em seus espaços corporativos.

A sociedade é dinâmica, e o Direito deve poder acompanha-la. Segundo Daniel Cristofi (2019)[7]Uma comunicação clara com os funcionários pode evitar que assuntos internos acabem tendo de ser tratados na esfera legal. Dentro deste código, é fundamental deixar claro as situações em que os colaboradores podem ser monitorados, como no uso de redes sociais, do e-mail ou mesmo da internet durante o horário de trabalho.”

Por isto é preciso que o funcionário que julgou se sentir prejudicado de alguma forma, tenha conhecimento do código de ética da organização. Possuir essa informação é importante para distinguir o que é ou não é um comportamento incorreto ou mesmo ilegal e ter base para sustentar uma possível demanda trabalhista.

Conclusão

A privacidade é tema pouco recente no Direito não encontra guarida na CLT, sendo apreciado pelo Juízo por uso do direito comparado. Para casos em que houve violação da intimidade por conduta dolosa de um empregado perante outro colega, ou nos casos extremos de compartilhamento de dados íntimos de outrem dentro do ambiente empresarial, deve a empresa tomar as medidas cabíveis, previstas pela normatização interna com suporte a C.L.T., artigo 482, alínea “a” e ou “h”, e verificar a necessidade, caso cabível, de reportar o vazamento a ANPD[8].

Lembrando que o bom-senso sempre é bem-vindo nas relações interpessoais, pois como falado, o empregado gasta mais tempo com colegas de trabalho do que na intimidade de sua própria família. Daí a mistura entre as intimidades se torna inevitável.


[1] Característica comportamental peculiar a um grupo ou a uma pessoa.

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[2] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm.

[3]  Habeas Corpus 93250 MS, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento 10/06/2008, 2º Turma.

[4] Circuito fechado ou circuito interno de televisão é um sistema de televisão que distribui sinais provenientes de câmeras localizadas em locais específicos, para um ou mais pontos de visualização.

[5] Que contém ou abarca apologia; que analisa, desenvolve e/ou defende um pensamento, uma teoria, uma ideia etc; laudatório. substantivo masculino [retórica] O discurso cujo propósito se concentra na defesa de algo ou alguém:

[6] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm.

[7] CRISTOI, Daniel (2019). Quais os limites da privacidade no trabalho? Disponível em https://administradores.com.br/noticias/quais-os-limites-da-privacidade-no-trabalho

[8] Autoridade Nacional de Proteção de Dados. https://www.gov.br/anpd/pt-br/assuntos/incidente-de-seguranca.

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Sobre os autores
Gleibe Pretti

Pós Doutorado na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina- nota 6 na CAPES), com término em 2023, com a pesquisa focada na Arbitragem nas relações trabalhistas (Sua aplicação como uma forma de dar maior celeridade na solução de conflitos com foco, já desenvolvido, na tese de doutorado, contrato procedimento - Vertragsverfahren) Doutor no Programa de pós-graduação em Direito da Universidade de Marília (UNIMAR- CAPES-nota 5), área de concentração Empreendimentos Econômicos, Desenvolvimento e Mudança Social, com a tese: APLICAÇÃO DA ARBITRAGEM NAS RELAÇÕES TRABALHISTAS, COMO UMA FORMA DE EFETIVIDADE DA JUSTIÇA (Concluído em 09/06/2022, aprovado com nota máxima). Mestre em Análise Geoambiental na Univeritas (UnG). Pós-graduado em Direito Constitucional e Direito e Processo do Trabalho na UNIFIA-UNISEPE (2015). Bacharel em Direito na Universidade São Francisco (2002), Licenciatura em Sociologia na Faculdade Paulista São José (2016), Licenciatura em história (2016) e Licenciatura em Pedagogia (2018) pela Uni Jales. Coordenador do programa de mestrado em direito da MUST University. Atualmente é Professor Universitário na Graduação nas seguintes faculdades: Centro Universitário Estácio São Paulo, Faculdades Campos Salles (FICS) e UniDrummond. UNITAU (Universidade de Taubaté), como professor da pós graduação em direito do trabalho, assim como arbitragem, Professor da Jus Expert, em perícia grafotécnica, documentoscopia, perícia, avaliador de bens móveis e investigador de usucapião. Professor do SEBRAE- para empreendedores. Membro e pesquisador do Grupo de pesquisa em Epistemologia da prática arbitral nacional e internacional, da Universidade de Marília (UNIMAR) com o endereço: dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/2781165061648836 em que o líder é o Prof. Dr. Elias Marques de Medeiros Neto. Avaliador de artigos da Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Editor Chefe Revista educação B1 (Ung) desde 2017. Atua como Advogado, Árbitro na Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada de São Paulo S.S. Ltda. Cames/SP e na Secretaria Nacional dos Direitos Autorais e Propriedade Intelectual (SNDAPI), da Secretaria Especial de Cultura (Secult), desde 2015. Especialista nas áreas de Direito e Processo do Trabalho, assim como em Arbitragem. Focado em novidades da área como: LGPD nas empresas, Empreendedorismo em face do desemprego, Direito do Trabalho Pós Pandemia, Marketing Jurídico, Direito do Trabalho e métodos de solução de conflito (Arbitragem), Meio ambiente do Trabalho e Sustentabilidade, Mindset 4.0 nas relações trabalhistas, Compliance Trabalhista, Direito do Trabalho numa sociedade líquida, dentre outros). Autor de mais de 100 livros na área trabalhista e perícia, dentre outros com mais de 370 artigos jurídicos (período de 2021 a 2023), em revistas e sites jurídicos, realizados individualmente ou em conjunto. Autor com mais produções no Centro Universitário Estácio, anos 2021 e 2022. Tel: 11 982073053 Email: [email protected] @professorgleibepretti

Ricardo Capozzi

Perito Judicial - Assistente Técnico em Computação Forense - Professor de Segurança da informação e Cyber Segurança - Bacharelando em Direto

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Artigo apresentado para a Disciplina de Processo do Trabalho - UniDrumond - Prof. Gleibe Pretti.

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