Análise dos princípios dos títulos de crédito e a relativizaçâo do princípio da cartularidade

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Com o crescente desenvolvimento tecnológico, as transações comerciais passaram a ser realizadas por meios eletrônicos, trazendo, nesse novo contexto, a necessidade de desmaterialização do título de crédito.

Os princípios são importantes para o Direito Empresarial, pois ajudam a nortear sua execução. Para que haja a concretização da função pecuniária, as espécies de títulos de créditos são regidas por requisitos e pelos princípios essenciais.

Os princípios gerais que norteiam os títulos de crédito são a cartularidade, a literalidade e a autonomia das obrigações cambiais. Estes princípios são a bases fundamentais, pois representam o regime cambial.

O princípio da cartularidade, também chamado de incorporação por alguns doutrinadores, significa que é indispensável ter a posse do documento original para o exercício do direito ao crédito, ou seja, é preciso a existência material do título. Com o avanço da tecnologia, este documento hoje não precisa necessariamente ser em papel, podendo ser também eletrônico, desde que contenha a data de emissão, indicação dos direitos que confere a assinatura eletrônica (que será certificada eletronicamente) e a identificação do credor (art. 889, CC, 2002). Nesse sentido, as duplicatas virtuais podem ser protestadas sem a apresentação do título para o ajuizamento da execução judicial (art. 15, Lei 5474/1968).

O princípio da literalidade rege que só poderá exigir o que estiver escrito no título, ou seja, só poderá ser cobrado o que estiver expressamente nele mencionado, em seus termos e limites. Vale ressaltar que deverá conter a assinatura do avalista para que o aval seja válido. A duplicata aqui também é uma exceção, uma vez que a quitação pode ser efetuada em documento separadamente (art. 9o, § 1o da Lei n. 5.474/68).

Por fim, o princípio da autonomia das obrigações cambiais diz que toda e qualquer relação havida entre os anteriores possuidores do título de crédito será desvinculada. Sendo assim, não é o direito abstrato no título que circula e sim o próprio título de crédito, onde lhe é atribuída a segurança jurídica. São relações jurídicas autônomas e independentes entre si e o vício em uma das relações não compromete as demais obrigações assumidas no título. Importante ressaltar que as obrigações consideradas nulas ou anuláveis, constantes no título, não implicarão em comprometimento na validade das outras obrigações. São subprincípios decorrentes da autonomia: subprincípio da abstração das obrigações cambiais, por meio do  qual os títulos, quando circulam, se desvinculam da relação que lhe deu origem e as obrigações mantêm-se independentes umas das outras quando o título é transferido para terceiro de boa-fé; e, o subprincípio da inoponibilidade das exceções pessoais (os devedores não podem alegar vícios e defeitos de suas relações jurídicas contra o portador de boa-fé que não participou do negócio jurídico do qual resultou a dívida que lhes é exigida).

A relativização do princípio da cartularidade

Dentre os princípios dos títulos de créditos, o princípio da cartularidade é o que mais confronta a aceitação do título de crédito eletrônico. A duplicata é dentre os títulos de crédito a que mais se contrapõem ao modelo eletrônico, visto que a sua essência é a cártula. Anteriormente à Lei n.º13.775/18, o protesto da duplicata eletrônica estava sendo feito com base no boleto bancário ou por protesto por indicação, e, segundo a jurisprudência, este deveria vir munido da comprovação da realização do negócio jurídico.

Com o crescente desenvolvimento tecnológico, as transações comerciais passaram a ser realizadas por meios eletrônicos, trazendo, nesse novo contexto, a necessidade de desmaterialização do título de crédito.

Esse fenômeno de desmaterialização do título iniciou-se na França, sendo implantada uma nova legislação para atender ao mercado financeiro. Foi implantada também em outros países europeus, bem como nos EUA e na Argentina. Parte da doutrina brasileira acredita que a execução desta modalidade de título de crédito encontra-se limitada por não existir a cártula, ferindo, assim, o princípio da cartularidade. 

A Lei nº.13.775/18 regulamentou a emissão de duplicata sob a forma escritural que, anteriormente, era chamada pela doutrina e pela jurisprudência de “duplicata eletrônica ou duplicata virtual”. As duplicatas são escritas na central nacional de registros de RTD, estando munidas de um certificado, o que dá total segurança ao título. Com isso, nenhum título de crédito pode ter sua validade, eficácia e execultoriedade contestada em juízo. A lei não traz prejuízos para a teoria geral dos títulos de créditos, nem para os seus princípios, pois nessa modalidade foi resguardada a manifestação da vontade requisito inerente dos títulos de créditos.  


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

COELHO, Fábio Ulhoa; LIMA, Tiago Asfor Rocha; NUNES, Marcelo Guedes. Reflexões sobre o Projeto de Código Comercial. São Paulo. Editora Saraiva. 2013.

https://jus.com.br/artigos/73350/os-principios-regulamentadores-no-direito-cambial-uma-analise-geral

NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Empresarial. 10ª edição. São Paulo. Saraiva Jur. 2020

VIDO, Elisabete. Curso de Direito Empresarial. 8ª edição. São Paulo. Saraiva Educação. 2019.

https://www.migalhas.com.br/depeso/303428/duplicatas-escriturais---lei-13-775-18--a-regulamentacao-do-registro-eletronico-de-duplicatas

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Sobre as autoras
Maely Passos Boeri Valadão

Advogada OAB/BA n. 80328 ( UCSAL), Engenheira Civil (UCSAL) , Professora, Graduanda em Direito de Família e Sucessões e Pós-graduanda em Educação Inclusiva, Curso de Analise de comportamento AMA-SP, Curso de Aperfeiçoamento em TEA

Rita Carneiro Agra

Graduada em Biologia pela UCSAL Graduanda em Direito pelo UNISBA

Carla Souza

Graduada em Administração de empresas pela UNEB Graduanda em Direito pelo UNISBA

Informações sobre o texto

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