Reforma ou deforma administrativa

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15/10/2020 às 18:11
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VII -    CONSIDERAÇÕES FINAIS

Analisando-se as propostas da Reforma Administrativa, após as exposições das monções relevantes apresentadas, chega-se à conclusão de que, na verdade, inúmeros direitos dos servidores públicos conquistados a partir do governo do então presidente Getúlio Vargas, hoje estão sujeitados a extinções, embora seja cediço que, em alguns casos ou classe de servidores, havia certa desorganização na gestão do serviço público.

Tem-se observado que, a partir do governo do então presidente João Batista Figueiredo, a classe dos servidores públicos passou a ser discriminada, a começar pela ânsia dos governos executivos em desrespeitar o que prevê a nossa Constituição Federal, no que tange à obediência aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, nos termos do caput  do artigo 37, inclusive do seu inciso X, infra:

“Art. 37. (...)”.

“(...)”.

“X – a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices”. (Grifei).

Observa-se, também, uma grande preocupação dos parlamentares no pertinente aos servidores de carreira típica de Estado, alegando que recebem um tratamento diferenciado e especial. Olvidam que são servidores que exercem atividades essenciais para o país, além de passarem por um rigoroso concurso público, no qual somente são aprovados aqueles que realmente estudaram demasiadamente, em uma jornada diuturna, inclusive assistidos por cursinhos preparatórios para o atingimento desse fim.

Ora, nada mais justo que os ocupantes das carreiras típicas de Estado percebam subsídios melhores, dentre as demais classes do Serviço Público.

Por outro lado, a classe parlamentar deveria, de sã consciência, observar que, em matéria de gastos públicos com o pessoal, os Poderes Legislativos e Judiciários são os que mais oneram as contas dos cofres da União, conforme alhures noticiado, onde a maioria é contratada, sem concurso público, para assessorar os parlamentares.

Nessa mesma inteligência, vislumbra-se os próprios parlamentares, que deveriam atuar respeitando a Constituição Federal vigente, no que pertine aos vultosos salários, além dos demais privilégios de caráter financeiro, que ferem a não mais poder a Carta Maior do Brasil, em seu texto avistável no § 4º, do artigo 39, abaixo:

“Art.39. (...)”.

“§ 4º. O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado, os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, incisos X e XI”. (Grifos nossos).

Nesse sentido, no âmbito dos benefícios coibidos, mas concedidos aos parlamentares brasileiros, com base em suas próprias legislações internas e administrativas, tem-se os seguintes:

1 – Auxílio Moradia e Imóvel Funcional: O Senado Federal administra 72 imóveis funcionais, que são concedidos aos parlamentares, quando no exercício do mandato, sendo destinado exclusivamente à estadia do parlamentar e de sua família, durante o seu mandato. Na hipótese da indisponibilidade de um dos imóveis funcionais ou não houver interesse em nele se hospedar, o senador tem o direito ao Auxílio-Moradia no valor de R$ 5.500,00 reais por mês. Para receber esse benefício, o parlamentar deve apresentar nota fiscal expedida pelo hotel, em que está hospedado ou o recibo de locação do imóvel residencial alugado.

2 – Cotas para o Exercício da Atividade Parlamentar (CEAP): Trata-se de um valor destinado a cobrir as despesas referentes ao exercício do mandato, tais como, passagens aéreas, serviços postais, manutenção de escritórios, hospedagens, combustíveis, contratação de serviços de segurança pessoal e consultoria, dentre outros. Cada congressista recebe, mensalmente, R$ 15.000,00 (quinze mil reais), mais o valor de 5 (cinco) passagens aéreas (ida e volta) ao Estado de origem de cada parlamentar.

3 – Gastos com o Pessoal: Não existem verbas destinadas, exclusivamente, para os gabinetes dos parlamentares. Porém, há uma limitação de 11 pessoas de sua escolha pessoal, para assumirem cargos comissionados. Contudo, em cada gabinete contém 6 (seis) funcionários efetivos. Quanto ao gasto mensal, há uma estimativa de que cada gabinete gasta em torno de R$ 82 mil reais, conforme noticiado pelas notícias do Congresso em Foco.

4 – Subsídios do Parlamentares: Além dos benefícios precitados, os parlamentares recebem uma verba equivalente ao valor do seu subsídio, logo no início e no final do mandato, para compensar os gastos com a mudança.

5 – Financiamento de Campanha: Com a proibição pela Justiça do financiamento de campanhas políticas por pessoas jurídicas de direito privado, foi criado o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), por meio das Leis nº 13.487, de 2017 e nº 13.488, de 2017, pelo Congresso Nacional, durante a Reforma Política de 2017. No pertinente as regras de gestão e distribuição estão previstas na Resolução nº 23.568, de 2018, criada e aprovada pelo Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), dispondo do montante de R$ 1.716.209.431,00, que deverá ser transferido aos diretórios nacionais dos 35 partidos registrados no TSE, de acordo com as regras previstas na resolução precitada do TSE. Vale salientar, que esse Fundo Especial está integralizado no Orçamento Geral da União, já disponibilizado ao TSE pelo Tesouro Nacional, desde junho de 2018, de acordo com a Lei nº 9.504, de 1997 (Lei das Eleições).

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Ressalte-se, no entanto, que, na data de 15/06/2018, a Justiça Eleitoral divulgou o valor de Fundo Especial para cada candidato político, onde os mais agraciados foram o PMDB, com R$ 234.232.915,58; o PT com R$ 212.244.045,52; o PSDB com R$ 155.868.511,77; e o PSL em 24º lugar recebeu R$ 9.203.060,51.

Na data de 08/06/2020, o TSE divulgou a divisão do Fundo Eleitoral no montante de R$ 2 bilhões de reais. Esse valor deverá abastecer as campanhas para prefeitos e vereadores nas eleições municipais de 2020. As maiores bancadas na Câmara, como o PT, PSL e PSD ficaram com as maiores parcelas nos valores de R$ 200 milhões, R$ 193 milhões e R$ 157 milhões de reais, respectivamente.

6 – Assistência a Saúde dos Parlamentares: Os parlamentares e seus dependentes têm direito a atendimento no Demed (Departamento Médico da Câmara), inclusive todos os ex-deputados podem continuar a utilizar os serviços do Demed. Na opção de utilizarem a rede médica privada, os parlamentares podem solicitar o reembolso de despesas médico-hospitalares e odontológicas, nos termos do Ato da Mesa nº 89, de 2013 (do presidente da Câmara). Ademais, esse benefício não é extensivo a dependentes, por conseguinte, o reembolso deferido para as despesas de saúde do próprio parlamentar. Com relação aos pedidos com o valor de até R$ 50.000,00, poderão ser objeto de deliberação por parte do segundo vice-presidente da Câmara.

No que pertine às despesas reembolsáveis estão: atendimento ambulatorial ou hospitalar, incluindo-se quimioterapia e radioterapia; exames complementares de diagnósticos; assistência domiciliar; assistência prestada por médicos, enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas, fonoaudiólogo, terapeutas ocupacionais, além de remoção para outro centro clínico, quando constatada a emergência ou a urgência e a inexistência de condições técnicas locais; órteses e próteses, e assistência odontológica.

Ademais, os parlamentares têm, também, à sua disposição, a opção de associar-se ao Pró-Saúde (Programa de Assistência à Saúde da Câmara dos Deputados), assim como aos servidores da Câmara, através da contribuição mensal de R$ 630,00 reais e da quota-participação de 25% (vinte e cinco por cento) sobre o valor de toda a despesa médica, nos termos da tabela adotada pelo convênio. O sistema Pró-Saúde é extensivo aos dependentes legais, nos termos dos Atos da Mesa nºs. 75, de 2006 e 71, de 2011.

Por outro lado, o deputado licenciado pode continuar contribuindo e utilizando-se do programa de saúde, assim como os deputados aposentados, assim como o suplente no exercício do mandato, tem esse direito a filiar-se ao Pró-Saúde, desde que contribua. Perderá esse direito quando não mais estiver no exercício do mandato, enquanto que os ex-deputados titulares podem permanecer participando do programa, mas pagando uma contribuição não subsidiada, no valor atual de R$ 3.187,51.

Ora, esses tipos de privilégios, embora proibidos, são disponibilizados aos parlamentares, ao alvedrio de suas próprias legislações interna corporis, instituídas e resolvidas internamente por cada poder, própria do regimento interno. Ressalte-se que, na hipótese da interna corporis exorbitar em sua limitação em que está vinculada, poderá ser objeto de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI).

Diante de todas essas extravagâncias com o dinheiro da Nação, já que os parlamentares, na realidade, são os empregados do povo que os elegeram, necessário se faz que exista uma norma que obrigue os parlamentares a dar satisfação à população toda vez que se utilizar da interna corporis para auferir benefícios financeiros em causa própria. Para tanto, criou-se um projeto de lei popular com esse propósito, obrigando-os ao uso do plebiscito ou referendo, para perquirir da sociedade sobre o acatamento, ou não, de projetos de lei ou de regulamentos internos criados para beneficia-los. Contudo, não houve progresso para essa empreitada, uma vez que nenhuma entidade de classe (associação, sindicato ou similar) demonstrou interesse de agilizar a ação popular perante à Câmara dos Deputados Federais, quiçá esteja na pretensão desses dirigentes de um dia disputar esse cargo parlamentar.

Por outra monta, para que haja o perfeito equilíbrio em todos os poderes da República, faz-se necessário, preliminarmente, que todas as reformas políticas respeitem todos os direitos e deveres individuais e coletivos, elencados no artigo 5º da Constituição Federal vigente, mormente a 1ª parte do caput do precitado dispositivo legal, tipificando que “Todos São Iguais Perante a Lei”. Por conseguinte, todos esses privilégios dirigidos ao Poder Legislativo, também podem ser concedidos aos outros Poderes, principalmente ao Poder Executivo, onde está inserido a Segurança Pública, cujos servidores são totalmente desprovido de uma assistência de saúde para si e para seus familiares, uma vez que são eles que, diuturnamente, estão enfrentando o perigo e sofrendo baixas.

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Sobre o autor
Jacinto Sousa Neto

Advogo nas área de direito civil, trabalhista e em procedimentos administrativos (sindicância e processo administrativo), além disso sou escritor e consultor jurídico.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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