O partido político e a reforma política

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08/06/2015 às 21:36
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Analisa-se se a forma como o partido político se insere no contexto jurídico-político apresenta ou não um déficit de legitimidade. Busca-se demonstrar, no contexto, seu tal déficit é moderno, ou existe desde que surgiram, em si, os partidos políticos.

I. Introdução

O modelo de democracia hodiernamente existente inviabiliza, não por uma escolha política propriamente dita, mas pelas circunstâncias histórico-fáticas atuais, a possibilidade de uma democracia direta, na qual os próprios cidadãos que se vincularem à determinada decisão serão capazes de, pessoalmente, deliberarem e se envolverem com esta escolha política.

E, considerando-se a atual necessidade de um anteparo entre os órgãos de decisão e o povo, decorrentes da democracia direta, é fato que os partidos políticos apresentam papel de protagonismo em nosso sistema político, cumprindo o papel de ligação entre os exercidores do poder e os indivíduos que os legitimam.

Contudo, parece evidente que os partidos encontram-se, atualmente, sem grande crédito junto à população, que vê cada vez menos os seus pleitos e necessidades sendo abarcados pelo discurso dos partidos políticos.

Neste sentido, a reforma política: torna-se imperioso implementar mudanças capazes de garantir maior legitimidade popular às decisões políticas tomadas pelos representantes, através da aproximação entre eleitores e eleitos, tornando mais democrático e legítimo o processo de autogoverno garantido pelo nossa Constituição.

II. Breve histórico acerca do processo de Reforma Política.

Considerando-se como marco normativo eleitoral a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, percebe-se que a Reforma Política deve ser considerada como um processo contínuo e não acabado: afinal, inúmeras mudanças no modelo político-institucional já foram implementadas desde então, e a discussão acerca das melhores práticas e de novas reformas jamais deixaram de existir.

Um primeiro aspecto a respeito do assunto diz respeito ao plebiscito constitucionalmente convocado. Ainda que, por meio do mesmo, não tenham existido quaisquer mudanças, haja vista a confirmação da predileção popular pelos modelos republicano e presidencialista, a mera existência da consulta popular caracteriza-se, por si, como um fruto das discussões acerca das possibilidades de reforma política.

Ainda em 1993, as emendas constitucionais de revisão[1] estabeleceram a responsabilidade política de Ministros de Estado (ECR2, alteradora do art. 50, caput, e § 2º da Constituição Federal); a ampliação das causas de inelegibilidade, a serem esmiuçadas por meio de lei complementar (ECR4, alteradora do artigo 14, § 9º do texto constitucional); mudança da duração do mandato de Presidente da República (ECR5, que alterou o artigo 82 da Lei Maior); bem como uma modificação no processo de cassação de parlamentares, segundo a qual a renúncia de parlamentar eleito não interrompe processo de cassação do mandato (ECR6, que acrescentou o § 4º no artigo 55 da Constituição da República).

Em 1.995, temos a aprovação da Lei dos Partidos políticos, regulamentadora dos arts. 14, § 3º, inciso V[2] e 17[3] da Constituição Federal.

Impende salientar que tanto a Constituição Federal quanto a lei de partidos não cria maiores embaraços à criação de novos partidos políticos, sendo certo que o formalismo para tanto é extremamente simplificado: basta o registro dos mesmos em cartório, obedecendo-se exigências simples, para que se constitua o partido como Pessoa Jurídica de Direito Privado[4].

As dificuldades, no entanto, se impõem no registro dos estatutos perante a Justiça Federal, condição imprescindível para que o partido possa disputar pleitos eleitorais, tenha acesso ao tempo de televisão e rádio gratuitos e aos recursos do fundo partidário. Para que ocorram tais registros, é necessário colher número significativo de assinaturas de apoiadores dentre o eleitorado nacional (pelo menos meio porcento dos votos válidos na última eleição geral, distribuídos em um mínimo de 1/3 dos Estados da Federação, com pelo menos 0,1% do eleitorado de cada um desses Estados)[5].

Parte desta lei dos partidos foi tida como inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, conforme se observa na ADI1351-3/DF, pela qual se decidiu que a existência de cláusula de desempenho eleitoral, pela qual a não obtenção de um número mínimo de votos ensejaria reduções nas prerrogativas parlamentares da liderança[6], bem como restrições ao fundo partidário e ao tempo gratuito de televisão e rádio, contrariariam os princípios da proporcionalidade e da igualdade de condições de acesso à política. Impende salientar que tal cláusula, diferentemente da denominada “cláusula de barreira”, não impedia o partido de ter representação no congresso nacional, nos casos em que fosse atingido o coeficiente eleitoral mas não a cláusula de desempenho, mas tão somente limitava as prerrogativas de liderança e o uso de recursos públicos na eleição posterior à do não cumprimento da aludida cláusula. Assim, talvez a decisão do Supremo Tribunal Federal tenha sido excessiva, o que ocasionou um incentivo para a proliferação de partidos políticos que hoje se apresentam à sociedade (como um termômetro disso, temos o fato de que 28 partidos políticos obtiveram, nas eleições gerais de 2014, representação no Congresso Nacional), o que aumenta a percepção de uma crise de representação e dificulta sobremaneira a governabilidade.

Em 1997, a lei 9.504, denominada Lei das Eleições, traz novos avanços: além de regulamentar limitações às coligações e implementar a verticalização[7], permitiu o uso das urnas eletrônicas que, em que pese as inúmeras críticas, consolidou-se como um modelo a ser estudado internacionalmente, seja pela segurança, seja pela velocidade de apuração por ele permitida.

No mesmo ano, é promulgada a famigerada EC16. Por meio dela, passou-se a permitir a reeleição, por uma única vez, nos cargos do Poder Executivo. Cumulativamente, modificou-se o período de mandato para os aludidos cargos, reduzindo-o de 5 (cinco) para 4 (quatro) anos. As críticas a tal Emenda se relacionam, de maneira geral, muito mais às alegadas irregularidades que teriam sido cometidas em seu processo de aprovação do que propriamente ao mérito da mesma. Isso pois, ainda que até hoje se discuta a conveniência da reeleição, parece-nos razoável admitir que a prática foi bem incorporada no ambiente político nacional, com a população aprovando a medida em questão: prova disso é que, desde a EC em questão, todos os Presidentes da República até hoje conseguiram obter a reeleição – o que demonstra que os eleitores têm entendido por oportuna a possibilidade de um maior continuísmo dos projetos políticos do executivo à nível nacional, em detrimento de uma alternância imposta em ciclos de tempo mais diminutos. Curioso, aliás, que grande parte (senão a totalidade) das críticas e das movimentações políticas em prol do fim da reeleição não partem da sociedade, mas sim dos políticos, o que indica que tal pauta na agenda da reforma política atende muito mais à perspectiva dos indivíduos políticos de obtenção dos cargos executivos do que, propriamente, a um anseio popular.

Já em 2006, proibiu-se a distribuição de brindes e uso de outdoors, bem como a contratação dos chamados showmícios para divulgação de candidaturas eleitorais. A justificação de tais medidas pautou-se na tentativa de barateamento das campanhas eleitorais, que geraria menor necessidade de grandes doações e de uso do chamado caixa dois, bem como permitiria um maior acesso ao jogo político de candidatos com dificuldade de arrecadação para campanhas. De todo modo, impende salientar que as medidas foram, coincidentemente ou não, impostas em alguns dos modelos de campanha que mais têm apelo com o eleitorado de baixa renda, e acabou por forçar o enfoque da disputa eleitoral, primordialmente, através da televisão, rádio e, agora, redes sociais.

No ano seguinte, uma “reforma” haveria se realizado por meio da atuação pretoriana. O Tribunal Superior Eleitoral passou a entender que haveria a obrigatoriedade de fidelidade partidária nos mandatos eleitorais proporcionais, interpretação esta confirmada posteriormente pelo Supremo Tribunal Federal. Em que pese ser eventualmente contestável a implementação de restrições ao direito parlamentar por meio do ativismo judicial, a decisão apresentada, no mérito, andou bem: é sabido que o critério para a obtenção de um mandato no Brasil é o atingimento, pelo partido, do quoeficiente eleitoral. Obtendo determinado partido (ou coligação) um número de cadeiras, estas serão distribuídas entre os candidatos mais votados naquele partido (ou coligação). Assim, a obtenção do mandato pelo candidato, no mais das vezes, se dá através do “empréstimo de votos” de outros candidatos do partido ou coligação, que conseguiram mais votos do que precisavam para se eleger ou, não conseguindo representatividade suficiente para serem eleitos, cedem seus votos àqueles que necessitam dos mesmos para obter mandato parlamentar. Tais circunstâncias ocorrem pois o voto proporcional, no Brasil, é tido como voto em lista aberta: a votação principal é, a bem da verdade, direcionada aos partidos, e não aos candidatos. Estes são indicados tão somente para demonstrar a preferencia do candidato no momento da formulação da lista. Contudo, se o voto no candidato vincula o partido à seguir a ordem dos mais votados, não impõe nenhuma vinculação no sentido de direcionar o voto do eleitor ao candidato escolhido, ou seja: ainda que o candidato não obtenha o mínimo para conseguir mandato parlamentar, o voto em questão continuará a ser computado ao partido[8].

Em 2010, implementou-se a lei da ficha limpa, ampliadora das hipóteses de inelegibilidade parlamentar. Por meio desta reforma, dificultou-se as estratégias dos candidatos de renunciar aos seus mandatos para manter a chamada cidadania passiva (direito de ser votado).

Todas essas mudanças, contudo, não foram capazes de pacificar e estabilizar o sistema eleitoral, de tal maneira que continua-se a discutir a viabilidade de uma reforma eleitoral.

III. Partidos políticos e representação: crise?

A organização política por meio de partidos apresenta-se, especialmente em casos como o brasileiro nos quais inexiste a possibilidade de candidaturas avulsas, como o único meio hodierno de se garantir o regime democrático de governo.

Isso pois, entende-se, há duas formas pelas quais viabiliza-se o autogoverno. A primeira delas concretiza-se pela observância do princípio da identidade: típico das chamadas democracias diretas, entende-se por meio desse princípio haver a necessidade de plena identidade entre governantes e governados, de tal maneira a existir um autogoverno perfeito. Assim, todas as decisões que vinculem os indivíduos deverão ser tomadas pelos próprios, havendo intensa deliberação na sociedade. Tal democracia sem intermediários, afim com o modelo rousseaniano, pode até ser eventualmente funcional em pequenos Estados, mas não se demonstra adequada a organizações políticas com maior extensão territorial, nem com as maiores complexidades que advieram com a modernidade, que exigem intensa especialização para poder deliberar sobre os mais diversos fatos da vida hodiernamente existentes.

Como alternativa a tal modelo, apresenta-se a chamada representação. Tal forma de deliberação democrática consolida-se nas Revoluções Liberais, em especial, na americana e na francesa, ainda que também seja fruto do longo percurso – sem saltos e rupturas – que é o Constitucionalismo Britânico.

Reconhecendo-se como inviável o processo de deliberação direta pelos cidadãos acerca dos assuntos que ensejarem decisões aos quais os mesmos estarão vinculados e, ao mesmo tempo, entendo o valor da democracia e do autogoverno como uma conquista inarredável e necessária para a ampliação de patamares civilizatórios que rompam com a autocracia absolutista que havia precedido os movimentos revolucionários mencionados, implementou-se a chamada representação.

Por tal modelo de democracia, os indivíduos escolheriam, por meio do voto, pessoas que os representariam na tomada de decisões políticas. Tais pessoas, dotadas de mandato, teriam o poder de deliberar em nome daqueles que por ela eram representados, de tal sorte que a vontade emanada da assembleia de representantes seria, para todos os efeitos, considerada como a vontade da coletividade de cidadãos.

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Aliás, impende salientar que tal modelo teria ao menos duas vantagens: a primeira delas seria permitir o autogoverno mesmo em espaços de soberania grandes, com um número ampliado de cidadãos. Afinal, se é impossível que um enorme coletivo delibere a vontade geral, é viável que este todo escolha representantes que, estes sim, determinem e deliberem sobre as escolhas políticas da nação. Um segundo aspecto, por sua vez, diria respeito a uma maior qualidade das decisões dos representantes, em comparação às decisões do povo. Afinal, é celebre o trecho de Montesquieu no qual ele afirma que se a massa dos cidadãos não é culta e instruída o bastante para conseguir refletir sobre as decisões políticas que os cercam, ao menos é apta para escolher quem, no meio dela, é ou seria capaz de fazê-lo: até mesmo o mais ignorante dos homens seria capaz de selecionar e escolher alguém hábil e capaz de tomar decisões políticas.

A questão é que se o procedimentalismo que determina a escolha dos representantes impõem-se, nos ordenamentos jurídicos, como critérios objetivos, o que dá ao resultado das eleições que seguirem as formalidades e requisitos previamente estipulados legalidade, o mesmo não pode se dizer em relação à legitimidade: a impressão que os indivíduos regularmente eleitos não são capazes de representar devidamente os cidadãos que os elegeram, decorrendo-se dai uma incongruência das vontades dos eleitores e dos eleitos, acaba por gerar uma crise de legitimidade. E, sendo os partidos os anteparos pelos quais se escolhem os representantes populares, resvala também neles tais crises de ilegitimidade.

Frise-se, porém, que tais crises são inerentes ao modelo representativo, e não se relacionam especificamente a um lugar ou período. Gianfranco Pasquino, por exemplo, afirma na Itália de 1980 sobre uma verdadeira crise dos partidos políticos, que quer não seriam capazes de se autodemocratizar por prestar deferência mais à ideologias e modelos teóricos do que propriamente aos indivíduos que os compõem (caso dos partidos de esquerda), quer por apresentar programas fisiologistas, entendendo-se que a busca pelo poder é justificadora de eventuais mudanças de paradigmas de governo ou de ideias políticas contanto que, frise-se, mantenham-se o núcleo duro dos ideais partidários (caso dos partidos de direita, que entendem o liberalismo como núcleo duro, e versatilizam-se em prol da busca pelo poder).

De todo modo, fato é que talvez seja por tal característica de crise e de ilegitimidade, inerente ao modelo representativo, que a reforma política seja muito menos um momento e muito mais uma constante, como se viu pela análise histórica anteriormente realizada, bem como que novamente se discutam e se rediscutam os temas da reforma política, a fim de reduzir a chamada crise dos partidos e, por conseguinte, sensação de ilegitimidade que a democracia hodierna vem apresentando.

IV. A Reforma Política e os partidos

Se “o universo da Reforma política é composto de mais de uma dezena de propostas específicas que visam alterar as regras de funcionamento dos partidos políticos, das eleições e até mesmo o funcionamento do Congresso Nacional”[9], acaba restando evidente a impossibilidade de analisar todas as propostas de modificações atualmente existentes.

As principais, contudo, se dividem em dois grandes grupos, e têm como finalidade reduzir o número de partidos, ampliando a governabilidade e a sensação do povo de congruência entre as suas próprias ideias e a aplicação de deliberações políticas pelos mandatários parlamentares.

O primeiro destes grupos diz respeito ao financiamento das campanhas. Vigora no Brasil o chamado financiamento misto, pelo qual todos os partidos igualmente 5% do fundo partidário e do tempo de televisão e rádio públicos, sendo o restante dividido proporcionalmente de acordo com a representatividade obtida pelos partidos na eleição anterior para a Câmara dos Deputados. Igualmente, podem receber os partidos e candidatos contribuições privadas, desde que se respeitem as restrições máximas impostas pela lei eleitoral: uma pessoa física pode doar no máximo 10% dos seus rendimentos do ano anterior, enquanto pessoas jurídicas podem doar 2% de seu faturamento.

A primeira proposta alternativa a tal opção seria a do financiamento exclusivamente público, com a finalidade de reduzir os gastos dos políticos (que seriam limitados à sua quota no fundo partidário). Contra tal modelo, há ao menos duas argumentações: a primeira delas, de ordem cínica, afirma que as contribuições privadas sempre continuarão existindo, de tal modo que tudo o que se obterá por esse modelo será empurrar para a ilegalidade e para o caixa dois doações que hoje encontram respaldo legal e podem ser licitamente declaradas; a segunda, que a busca pelas doações acaba por mobilizar o eleitorado, que se vê mais envolvido com o candidato e, por conseguinte, com o pleito como um todo.

Alternativamente, se sugere a adoção de financiamentos exclusivamente privados, pelos quais o Fundo partidário deixa de existir, e os candidatos deverão buscar recursos para suas campanhas tão somente nas doações a eles direcionadas pela sociedade. Tal modelo, em alguma medida, privilegia os candidatos com maior afinidade intelectual com o mercado, excluindo a possibilidade de pessoas com diferentes visões de mundo participarem, ainda que infimamente (já que, hoje, a parte pública dos financiamentos já é minoritária na maior parte das campanhas exitosas), do jogo democrático. Tal modelo subdivide-se em dois, havendo as pessoas que defendem o fim das restrições de doação máxima por pessoas físicas e jurídicas (financiamento privado sem restrições) e quem entende dever ser mantidos os limites atuais (financiamento privado com restrições).

Tal medida de mudança no sistema de financiamentos implica em uma reforma do modelo atual, podendo-se reduzir o número de partidos, a medida que os partidos pequenos tendem à ser sufocados quanto maior for a “privatização das campanhas”. Afinal, se o fundo partidário não cumpre papel importante na esmagadora maioria das campanhas políticas, inclui-se também como parcela do financiamento público a propaganda eleitoral gratuita, que é capaz de dar amplitude e conhecimento para indivíduos que, em um modelo exclusivamente privado de financiamento, jamais teria acesso real ao eleitorado.

De todo modo, é fato que outra vertente da reforma política amplamente debatida, que também se relaciona – talvez, até de maneira mais direta – à redução do número de partidos e à busca por maior governabilidade é a reforma do sistema eleitoral.

Como visto acima, o Brasil atualmente aplica o sistema proporcional de lista aberta no qual o voto dos eleitores é computado primeiro ao partido, para se definirem pelos cálculos eleitorais o número de cadeiras por ele obtidas, e depois ao candidato, para se realizar a lista e definir quais os eleitos naquela agremiação política.

Modelo alternativo é o chamado voto em lista fechado. O partido, por meio de deliberações internas anteriores e prévias partidárias, define a lista que será apresentada ao público de eleitores. Esta lista, que não permite mudanças em sua ordem de elaboração é levada para escrutínio, com o povo votando nela (e no partido que a elaborou, por conseguinte), e não nos candidatos individuais. Encerrada a eleição, define-se o número de cadeiras destinadas a cada partido e cumpre-se, rigorosamente, o disposto em momento anterior à eleição nas listas partidárias.

Tal modelo favorece o fortalecimento dos partidos políticos, simplifica o sistema (que acaba sendo mais facilmente compreendido pelo eleitorado leigo) e permite maior amplitude de ideias no Congresso Nacional (já que, se por um lado inviabiliza que candidatos famosos puxem votos para partidos pequenos, mantém grande representatividade no legislativo por não romper com o sistema de votação proporcional). Por outro lado, há quem o repute como antidemocrático, por impedir o povo de deliberar a respeito de quem serão, efetivamente, os representantes detentores de mandato popular no jogo político pós-eleições.

De maneira mais alternativa, uma proposta bastante encapada pelos principais partidos políticos da atualidade é a implementação de eleições majoritárias para cargos legislativos. Através desta proposta de modelo, divide-se o ente federativo para o qual se está votando o preenchimento das vagas legislativas em distritos, nos quais acontecerão eleições majoritárias, em um ou em dois turnos. Assim, rompe-se com a ampla representatividade política atualmente existente, já que o partido mais votado em determinado distrito conseguirá 100% da representação dele, simplificando o jogo de governabilidade. A vantagem principal é a redução das dificuldades de governabilidade e uma maior aproximação entre eleitores e eleitos, enquanto a desvantagem é a diminuição da representação de diferentes visões de mundo dentro do parlamento.

Para mitigar tais problemas, por fim, há o sistema majoritário misto, onde o eleitor votará para preencher metade da Assembleia por meio do sistema distrital e, a outra metade, através do voto proporcional, em lista aberta ou fechada.

Antes de encerrar, cumpre salientar também outra proposta de mudança, que também gera como impacto a redução do número de partidos dotados de representatividade dentro do Congresso Nacional. Trata-se da mudança de paradigma do modelo de união entre partidos, abandonando-se as coligações em favor das chamadas federações partidárias.

As coligações têm finalidade meramente eleitoreira já que,  muitas vezes, dissolvem-se pouquíssimo tempo depois das eleições. Assim, servem tão somente para trazer imprevisibilidade ao jogo político e reduzir a congruência entre a vontade do voto do eleitor e o destino do mesmo.

De todo modo, é fato que as Coligações são instrumentos hábeis e imprescindíveis para que partidos, especialmente os pequenos, viabilizem-se eleitoralmente, de tal maneira que a extinção de tal modelo geraria grande redução no número de partidos por manifesta inviabilidade de organização. Para tentar resolver tal questão, sugere-se a adoção das federações partidárias. Uma federação, em alguma medida, seria semelhante às atuais coligações, com a diferença de que deverá, necessariamente, funcionar tal qual um partido único durante todo o período dos mandatos parlamentares obtidos por aquela federação. Assim, não se extingue em definitivo os partidos pequenos, mas se força os mesmos a se unirem, apresentando candidaturas conjuntas e reduzindo, na prática, o número de partidos em funcionamento dentro do Congresso Nacional. No mais, cria-se possibilidade de “balões de ensaio”, para testar a viabilidade de fusões futuras.

V. Conclusão

A reforma dos partidos políticos tem como objetivo primordial ampliar o nível de legitimidade sentido pela população, que se vê como órfã de representantes cada vez mais incapazes de satisfazerem seus anseios e necessidades.

Visa-se, por conseguinte, reestruturar o modelo de partidos políticos, a fim de reduzir o amplo número de partidos, ampliar a governabilidade e aproximar a vontade popular do centro de decisão política. Cumpre ressalvar, contudo, que tais reformas, por si só, são incapazes de resolver a crise partidária, haja vista que é da essência do modelo representativo um nível – maior ou menor – de desconfiança popular, bem como uma dificuldade de diálogo efetivo e franco dos partidos com seu eleitorado. Isto, se puder ser minimizado por meio de reformas e mudanças eleitorais, jamais poderá ser totalmente extinto, já que a crise partidária não é exclusividade de nenhum lugar ou tempo histórico, existindo como decorrência direta de tal modelo agremiativo de busca pelo poder.

VI. Referências Bibliográficas

DE ARAGÃO, Murillo. Reforma Política: O debate inadiável. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2014.

DUVERGER, Maurice. Les partis politiques. 5a ediçãoo. Paris: Armand Colin, 1964.

JEHA, Pedro Rubez. O processo de degeneração dos partidos políticos no Brasil. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo, 2009.

LOBREGAT, Rodrigo. Breves considerações acerca da constituinte específica de reforma política. In: Jus Navigandi, Teresina, ano 19, n. 4122, 14 out. 2014. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/32741>. Acesso em: 30 nov. 2014.

PASQUINO, Gianfranco. Crisi dei partiti e governabilità. Bolonha: Il Mulino, 1980.

RABAT, Márcio Nuno. Reforma política: histórico, estágio atual e o lugar da recente proposta do executivo. Brasília: Biblioteca digital da câmara dos deputados, 2009.

URBINATI, Nadia. Representative Democracy: Principle and genealogy.Chicago: University of Chicago, 2006.

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Sobre o autor
Rodrigo Lobregat

Doutorando em Direito do Estado na Universidade de São Paulo.<br>Especialista em Jurisdição Constitucional pela Università degli Studi di Pisa (Itália).<br>Bacharel em Direito pela Universidade de São Paulo.<br>Advogado, sócio do escritório Lobregat e Advogados, onde atua diretamente na área de Direito Público.

Informações sobre o texto

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