A presunção de vulnerabilidade no crime de estupro de vulnerável

12/12/2014 às 10:44
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A presunção de vulnerabilidade preconizada pelo legislador penal no tipo do art.217-A do Código Penal Brasileiro admite relativização? Doutrina e jurisprudência divergem e constitucionalização do Direito Penal nos apresenta imperiosa discussão.

1.INTRODUÇÃO

Reza o Art.217-A do Código Penal Brasileiro que é crime “Ter conjunção carnal ou praticar qualquer outro ato libidinoso como menor de 14 anos”. Inobstante ser indispensável a tipicidade subjetiva(dolo ou culpa) por parte do agente , depreende-se da leitura do dispositivo que o legislador desconsiderou o “ consentimento da vítima” como elementar do tipo, ou seja, a consumação delitiva independe da aceitação do ato sexual por parte da vítima  . Ao fazer isso o legislador pressupôs para estas vítimas( menores de quatorze anos) uma incapacidade de gerir a própria sexualidade, apelidada pela doutrina de “vulnerabilidade”.

A celeuma surge quando nos deparamos com a possibilidade ou não de relativização desta “ vulnerabilidade”. Afinal, é aceitável a ideia de que todos os menores de 14 (quatorze) anos são incapacitados de vivenciar e aceitar de forma livre e consciente a prática de um ato sexual?

A discussão ganha terreno da jurisprudência e na doutrina pátria na busca por um entendimento compatível com o Direito Penal Constitucional.

2.DESENVOLVIMENTO

         A jurisprudência do STF e do STJ é firme no sentido de que não se admite prova em contrário, ou seja , trata-se de um presunção absoluta de vulnerabilidade, conforme segue :

“A violência presumida foi eliminada pela  Lei 12.015/2009.A simples conjunção carnal com menor de quatorze anos consubstancia crime de estupro.Não há mais que se perquirir se houve ou não violência. A lei em espécie-Crime contra a didnidade sexual,  consolidou de vez a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”.HC 101.456,Rel.Min.Eros Grau,julgamento em 9.3.2010,Segunda Turma,DJE de 30.04.2010).

            Não obstante este entendimento, a doutrina majoritária tem se inclinado em sentido diverso. Argumenta-se que a “presunção absoluta de vulnerabilidade” é antes de mais nada, uma negação da “presunção de inocência”(art.5°LVII,da Constituição Federal) uma vez que inviabiliza o exercício do contraditório ,quiçá da amplitude de defesa , também princípios constitucionais (art.5°LV, Constituição Federal).

            Outro argumento que robustece a necessidade de flexibilização da presunção de vulnerabilidade advém de uma interpretação sistemática do Código Penal Brasileiro com o Estatuto da Criança e do Adolescente. Este último, ao tratar de forma diferenciada da responsabilidade pela prática de ato infracional por  crianças (menor de 12 anos) e adolescentes( menor com doze anos completos até os 18 anos). É que parece inconcebível que um adolescente( menor de 18  entre 12 e 14 anos) possa ter maturidade para experimentar a aplicação de uma medida sócio- educativa mas não possua capacidade para administrar livremente uma escolha sexual.

            Destarte, segundo esta linha doutrinária , trata-se de uma incoerência do sistema legal considerar que já existe maturidade para sofrer uma reprimenda Estatal, mas não reconhecer esta mesma maturidade para escolhas sexuais no caso dos adolescentes.

3.CONCLUSÃO

É forçoso reconhecer o apelo do legislador para a necessidade de se proteger a criança e o adolescente presumindo a sua vulnerabilidade, vez que estes sujeitos de direito se encontram em situação de pessoa em desenvolvimento, carecendo de uma atenção especial do sistema normativo. No entanto, não há como negligenciar a presunção de inocência , o contraditório, a amplitude de defesa e a situação peculiar dos adolescentes , de modo que a somente possibilidade de relativização da presunção de vulnerabilidade aferida casuisticamente é compatível com o ordenamento jurídico vigente.

4.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS­

BARROS, Francisco Dirceu .Vulnerabilidade nos Novos Delitos Sexuais. Carta Forense, 02 de março de 2010.

GRECO, Rogério .Curso de direito penal parte especial. Rio de Janeiro: Impetus, 2010.

MAGALHÃES, Eduardo Noronha. Direito penal. São Paulo: Saraiva , 2007.

STF. Segunda Turma .Relator Ministro Eros Grau. Habeas Corpus. n°101.456,D.J.E. 30.04.2010.

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Sobre o autor
Hadriel Farias Costa

Advogado .Sócio ALL Advocacia.<br>Pós-Graduando em Ciências Criminais pela UNIDERP-ANHANGUERA.<br>Consultor Jurídico do IBRADEM(Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Municipal-Aracaju).<br>

Informações sobre o texto

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