Fusões e aquisições.

Aspectos jurídicos e econômicos

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01/06/2014 às 00:26
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3. Motivadores Econômicos e estratégicos para operações de reorganização empresarial

No presente capítulo, falaremos sobre os motivadores econômicos e estratégicos que justificam as decisões das operações de reorganização empresarial.

3.1 Exemplo de casos

Conforme se observa, não só no Brasil como no mundo, as operações de M&A tem crescido monumentalmente.

O número de M&A entre 1994 e 2001, só no Brasil foi de 2440 operações23, lembrando que essas foram as operações que foram submetidas ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), pois as operações onde nenhuma das empresas faturam mais de R$ 400.000.000,00 por ano, não sofrem interferência do CADE.

Um exemplo de M&A foi a fusão entre Americanas.com e Submarino, onde as duas sociedades uniram forças, afim de atuar de forma mais competitiva e eficiente no mercado, originando assim a empresa B2W – Companhia Global de Varejo.

A fusão dessas duas Companhias se deu por meio de reuniões, não por oferta pública, que é o tipo de tentativa e adquirir uma companhia menos vista.

No caso Sadia e Perdigão ocorrido em 2006, os acionistas da Perdigão foram pegos de surpresa, pois a Sadia informou que pretendia adquirir a Perdigão por meio de oferta hostil, onde a interessada em adquirir o concorrente publica seu interesse de compra na forma de oferta pública, assim, os sócios que recebem a oferta são pegos de surpresa.

Na oferta hostil, não é feito qualquer acordo prévio, a oferta é feita diretamente aos acionistas.

Este tipo de oferta não é comum no Brasil, onde até o caso Sadia x Perdigão, só tivemos o registro de duas ocorrências desse tipo, ambas ocorridas ha mais de 20 anos. Uma delas na década de 70, que envolveu uma companhia de eletricidade de Juiz de Fora – MG e a CEMIG, e a outra na década de 80, que resultou na aquisição da Cimento Aratu pela Votorantin.

A oferta hostil não é comum no Brasil, a compra da Perdigão pela Sadia restou infrutífera, pois a Sadia ofereceu uma oferta baixa no primeiro fato relevante24, já na segunda oferta, a Sadia aumentou a proposta num montante de apenas 4% por ação, o que não atraiu os acionistas e foi contrário a legislação, pois no § 1º doa art. 261 da Lei 6.404/76 está estabelecido que a segunda oferta deve ser aumentada no mínimo 5%.

3.2 Estratégia

A estratégia nas operações de M&A é fundamental, aliás, é uma justificativa muito comum para se adquirir uma empresa.

A estratégia em uma empresa serve para deixá-la na fronteira da eficiência.

Quando uma empresa está na fronteira da eficiência, quer dizer que ela é capaz de extrair o máximo de seu investimento, ou seja, custar o mínimo pelo que produz ou produzir o máximo pelo custo.

Em certas ocasiões, a única forma para uma empresa chegar a fronteira da eficiência é a aquisição ou fusão com outra, o que pode até deixá-la única em sua posição, demonstrando assim uma estratégia perfeita25.

3.3 Eficiência operacional

A eficiência operacional é uma das peças mais importantes em uma empresa, pois ela diz respeito a centralização ou descentralização de decisões e operações.

Essa discussão é muito acirrada em todos os debates, pois a eficiência operacional influencia na posição da empresa em face aos seus concorrentes.

Vejamos o caso do Carrefour. Na época em que entrou no Brasil para concorrer ao mercado varejista, se destacou frente aos concorrentes, pois tinha uma visão de descentralização de decisões, o que dava mais eficiência aos seus gerentes.

Hoje, essa descentralização não é mais vantajosa, pois os meios de informações evoluíram e também temos o poder de barganha com os fornecedores, ou seja, se o Carrefour descentralizar as decisões, perderá terreno para os concorrentes, principalmente frente aos fornecedores, pois será tratado como um comprador pequeno.

A eficiência operacional, as vezes, se dá apenas com a aquisição de outra empresa, pois nem sempre é vantajoso mudar todo um sistema para atender um nicho maior de mercado, adquirir um concorrente pode ser a melhor estratégia para isso, aí teríamos de salientar que a aquisição nesse caso não é estratégia, mas o meio de implementá-la26.

3.4 Economia de escala

Uma das justificativas mais comuns nas operações de fusões são os ganhos de escala.

Escala, ao contrário do que muitos pensam, não é ser grande, mas sim diluir custo fixo de uma empresa, aumentando sua produção, o que fará com que o custo unitário caia.

Tomemos como exemplo os softwares desenvolvidos pelas empresas.

Para desenvolver um software, uma empresa investe um montante, esse montante é um custo fixo, então, quanto mais essa empresa vender, mais terá o custo de desenvolvimento diluído nas unidades do software.

Porém, uma aquisição que visa a obtenção de economia de escala, precisa ter definida a presença do custo fixo e como ele será diluído.

Na prática, existem duas situações para se tirar proveito da economia de escala: o investimento fixo que se deseja viabilizar e aquele já incorrido.

Vemos a figura do custo fixo que se deseja viabilizar em uma empresa que já dispõe de um amplo mercado e pode fazer um grande investimento, sabendo que terá como recuperá-lo depois.

Nesse caso, temos como exemplos a GM e a FIAT, que desenvolviam certos componentes de um veículo em conjunto, diluindo o custo fixo.

Já na busca do investimento já incorrido, temos uma empresa que possui uma capacidade ociosa e busca mercado adicional por meio de uma aquisição, porém tem o risco de unir-se a uma empresa em condições semelhantes27.

3.5 Economia de escopo

Na economia de escopo também observamos a redução do custo, porém diferentemente da economia de escala que visa a redução por meio de produção, aqui essa redução é casada pelo aumento da variedade de produtos.

Podemos observar um exemplo com a marca Mont Blanc. Ao longo de anos foi feito um grande investimento para desenvolver essa marca. Após a marca se reconhecida nos produtos de canetas de luxo, foi usado essa investimento para comercializar produtos variados.

A Mont Blanc desenvolveu uma marca que ficou reconhecida nas canetas, após esse sucesso utilizou-se essa marca, que já era reconhecida pelo mercado para aplicá-la em bolsas, sapados, roupas e malas.

Temos também outros exemplos de economia de escopo, esses que motivam grandes aquisições, como fabricantes de cerveja que pretendem lançar um bom refrigerante, ou empresas de software que lançam provedores de acesso a Internet, ou ainda empresas de produtos lácteos que desejam lança biscoitos ou cereais28.

3.6 Poder de Mercado

Poder de mercado é a capacidade de impor aos fornecedores um preço mais baixo do que seria possível no mercado ou de impor aos clientes um preço mais alto do que o normal.

Uma terminologia mais freqüente denomina poder de mercado como concentração de poder de mercado.

Assim como em Economia de Escala, a concentração do mercado é equivocadamente comparada com a idéia de tamanho da empresa.

O público não vê com bons olhos a concentração excessiva de poder de mercado, como o caso da Microsoft com o Internet Explorer, ou mesmo grandes redes de super mercados ou montadoras e indústrias de auto-peças. Esse tipo de poder de mercado está sempre sob o comentário da imprensa e da supervisão do CADE.

Porém a concentração de poder de mercado não é necessariamente ruim.

Os direitos autorais e o registro de marcas, patentes e desenho industrial são mecanismos legais que permitem a concentração de poder de mercado aos seus inventores. Isso é um mecanismo de defesa, pois se esses autores e pesquisadores não tivessem controle de sua própria pesquisa e desenvolvimento de produtos, não teriam o maior incentivo de realizá-los. A maior capacidade de obter lucro.

Exemplos clássicos de concentração de poder de mercado são da Antártica e Brahma, Colgate e Kolynos.

No caso da Colgate e Kolynos o domínio do mercado seria tão abrangente que o CADE decidiu que uma das marcas teria de deixar o mercado por um tempo determinado, que no caso foi a Kolynos.

A Kolynos foi substituída pela marca Sorriso e atualmente a marca Sorriso tem uma aceitação tão grande no mercado que a marca Kolynos foi deixada de lado.

A quem diga que o caso da Colgate e Kolynos ainda é uma concentração de poder de mercado, pois a marca Kolynos apenas foi substituída pela marca Sorriso29.

3.7 Barreiras de entrada

Barreiras de entrada são barreiras criadas pelas indústrias. Essas barreiras impedem que novos competidores entrem no mercado, o mais interessante é que quanto maior a barreira de entrada de um mercado, maior é o número de competidores que são atraídos, pois se a barreira é grande, o mercado provavelmente gera um grande lucro.

Vejamos o exemplo de um mercado que possui uma barreira de entrada significativa: o mercado brasileiro de cerveja.

A indústria de cerveja é um mercado extremamente competitivo, e essa competição é local, pois a cerveja exige um cuidado de transporte semelhante ao do vinho, mas seu valor unitário é apenas uma fração daquele. Para entrar nesse mercado duas coisas são imprescindíveis: escala e logística, que tem sido a justificativa para muitas fusões.

Montar uma empresa e investir para que ela cresça no mercado com seus próprios recursos é muito difícil. Exemplo disso é a Kaiser, que utilizou-se da rede de distribuição da Coca-cola, a maior do país e ainda assim demorou anos para competir com as grandes.

Para investir em uma empresa e criar uma rede nacional de distribuição e agredir o mercado com grandes volumes a curto prazo exige um capital astronômico, lembrando que o risco terá a mesma proporção e é incontestável que haverá um considerável período de operação deficitária.

Diante disso, fica claro que se uma empresa estrangeira desejar entrar no mercado brasileiro se valerá de uma aquisição, certamente de uma empresa que já tenha escala e logística.

Podemos ver esses exemplos de barreiras de entrada no mercado de varejo, telecomunicações e bancário.

Um exemplo clássico e engenhoso de quebra de barreira de entrada é o caso da JCPenney.

A JCPenney desejava entrar no mercado brasileiro de varejo, porém não tinha escala e muito menos logística, o único meio economicamente viável era a aquisição, que foi o que eles fizeram, em uma operação muito bem elaborada e bem sucedida, quando adquiriram a Renner30. Cumpre observar que essa operação já não existe.

3.8 Grupos Econômicos

O que caracteriza um grupo econômico é a diversificação de várias empresas que coabitam entre si.

Existem outros motivos para formação de grupos econômicos que não seja a simples diversificação como é o caso de empresas que realizam aquisições com o objetivo de obter economia de escala ou escopo.

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Por vezes, a formação de grupos econômicos tem por objetivo a conveniência fiscal, como é o caso de vários negócios diferentes com uma única razão social.

A formação de grupos econômicos não implica necessariamente em combinação de empresas, mas também em combinação de negócios.

Nos grupos econômicos podemos ter simplesmente a administração de carteira, que é a diversificação por meio de aquisições, bem como podemos ter a reestruturação, onde o investidor está disposto a investir na administração.

Ainda podemos observar exemplos onde há transmissão de competências, onde o investidor assume o controle da empresa e promove alguma forma de reestruturação.

Nos exemplos de grupos econômicos que vemos a administração de carteira e reestruturação, o investidor quase sempre tem intenção de vender a empresa quando seu aviamento estiver maior. Esse tipo de atitude é difícil de encontrar quando temos transmissões de competências.

Por último temos o compartilhamento de atividades, onde vemos uma formação quase perfeita de sinergia que é o caso de uma unidade do grupo absorver os recursos e competências de outra unidade31.


4. DUE DILIGENCE

Nas operações de M&A vemos um procedimento muito importante, onde são coletados informações de negócios. Esse procedimento é conhecido como Due Diligence.

A Due Diligence surgiu pela primeira vez nos Estados Unidos com o Securities Act, seguido pela Serucities and Exchange Commission (SEC); no Brasil, o órgão semelhante à SEC é a Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Num primeiro momento, o procedimento de Due Diligence era limitado a emissões de valores mobiliários, porém com o grande volume de ofertas públicas, a Due Diligence marcou presença e outras áreas, principalmente em F&A, onde a podemos identificar contingências capazes de afetar o valor dos ativos.

A Due Diligence em F&A tem como objetivo a verificação da boa ordem dos registros contábeis, mas também avalia-se os aspectos legais relacionados ao ativos, pois essas questões refletem em seu patrimônio.

A Due Diligence pode ser traduzida para o português como “auditoria jurídica”.

A Due Diligence é muito importante antes da assinatura do contrato, pois o adquirente em qualquer operação de F&A terá uma oportunidade maximizada na negociação, pois terá como plus o conhecimento da real situação da empresa32.

Além disso, a Due Diligence permite ao adquirente estudar as políticas a serem implantadas na nova empresa.

A verificação da legalidade em operações de F&A tem extraordinária importância no mercado, visto que na legislação brasileira, há diversas situações em que o comprador da empresa torna-se responsável pelas dívidas.

Também, a Due Diligence pode servir de defesa para o vendedor, caso o comprador reclame, pois esse terá em mãos as informações precisas, se realizou o negócio o fez por livre e espontânea vontade.

A Due Diligence previne o vendedor e eventuais ações judiciais quanto a vícios ocultos, conforme define os art. 138 e 441 do Novo Código Civil, pois o comprador terá conhecimento dos mesmos.

O interesse de realizar Due Diligence é ter conhecimento da situação jurídica, contábil e financeira da empresa, o que traz uma situação de desgaste muito grande pelas partes33.

O procedimento de Due Diligence analise as seguintes questões:

1. Aspectos Societários;

2. Aspectos tributários e previdenciários;

3. Aspectos trabalhistas;

4. Relações contratuais;

5. Titulação dos bens do ativo;

6. Questões ambientais;

7. Direito do consumidor.

Nos aspectos societários são avaliados os atos constitutivos da empresa e seu estado perante os órgãos de registro do comércio, a fim de identificar entraves na operação.

Em caso de companhias de capital aberto, verificam-se os registro na CVM e Bolsa de Valores, a emissão de títulos, ofertas públicas eventualmente realizadas e a posição da empresa referente aos acionistas minoritários34.

Já nos aspectos tributários e previdenciários, analisa-se processos judiciais e procedimentos administrativos, rotinas fiscais e previdenciárias, bem como os problemas que podem surgir caso ocorra à operação.

Nos aspectos trabalhistas são analisados os processos judiciais e os eventuais casos de sucessão.

Relações contratuais são auferidas com grande ênfase, pois as quantidades de contratos são enormes, principalmente os contratos financeiros e operacionais, pois podem gerar inadimplemento. Ademais, os processos judiciais também são analisados.

A titulação dos bens do ativo tem o objetivo de avaliar a regularidade documental dos bens componentes do ativo, identificando eventuais ônus e gravames, em que pese, hipotecas, penhoras, servidões, alienações etc.

Também é comum a análise de documentos comprobatórios dos bens imóveis.

Nas questões ambientais são analisadas as licenças ambientais e exigíveis, bem como possíveis atos que possam ensejar em infrações. Processos judiciais também devem ser analisados.

No Direito do consumidor é analisada a situação da empresa auditada referente à relação com seus consumidores, bem como a existência de processos judiciais35.

No final do processo de Due Diligence sempre é emitido um relatório, esse que deve ser redigido de forma simples e direta, a fim de que qualquer leigo possa compreender as informações ali apresentadas.

Nesse relatório deve conter os critérios específicos utilizados na avaliação das informações analisadas36.

No relatório da Due Diligence são apresentadas as garantias que devem ser exigidas da empresa, onde fica o vendedor obrigado a indenizar quaisquer danos decorrentes de falsidade ou inexatidão.

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Sobre o autor
Thiago Silva Ribeiro

Sócio - Henrique Prado Raulickis Advocacia. Advogado (OAB/SP 366.650). Pós-graduação em Direito Processual Civil pela EPD. Consultoria Tributária em Big Four - 04 anos. Especialidades: tributos, trabalhista e previdenciário. Contabilidade Tributária - Trevisan Escola de Negócios. Árbitro - Câmara de Mediação e Arbitragem.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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