Apontamentos sobre a interrupção do contrato de trabalho

25/04/2023 às 16:38
Leia nesta página:

NOTAS INTRODUTÓRIAS

Conhecer a natureza jurídica dos institutos, seus conceitos, similitudes e distinções, facilita sobremodo o desempenho da atividade do intérprete e aplicador do direito.

Nesse passo, o presente estudo objetiva tratar conceitualmente do instituto da interrupção do contrato de trabalho, fornecendo uma abordagem doutrinária e legislativa sobre o tema, sem olvidar de contemplar sua análise frente ao instituto análogo da suspensão do contrato de trabalho, a fim de identificar as distinções e similitudes entre eles.

DA INTERRUPÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

A interrupção do contrato de trabalho constitui uma figura que, no seio de um contrato de trabalho, mostra-se capaz de interromper a prestação dos serviços por parte do empregado sem, contudo, provocar o desfazimento do vínculo lá pactuado entre este e o empregador, quando da ocorrência de determinados fatos jurídicos.

Com Vólia Bomfim Cassar (2011, p. 1018):

Ocorre a interrupção do contrato de trabalho quando o empregado deixa de prestar os serviços, porém continua a receber a totalidade ou ao menos parte do seu salário. O contrato permanece em vigor, mas algumas cláusulas ficam paralisadas. Conta-se o tempo de serviço para todos os efeitos, como se trabalhando estivesse.

Na mesma linha, Gustavo Filipe Barbosa Garcia (2012, p. 534), para quem “a interrupção do contrato de trabalho conceitua-se pela ausência provisória de prestação do serviço, mas sendo devido o salário, bem como computando-se o período no tempo de serviço do empregado”.

Por essa peculiaridade de apenas haver a interrupção da prestação dos serviços por parte do obreiro sem, contudo, afetar a vigência das demais cláusulas pactuadas, Maurício Godinho Delgado (2012, p. 1073), relata que há uma grande variedade de denominações para o fenômeno da interrupção do contrato de trabalho na doutrina, dentre as quais destaca a nomenclatura interrupção da prestação de serviços, pontuando que:

A primeira das denominações variantes (interrupção da prestação de serviços) justifica-se pelo fato de a sustação de efeitos incidir apenas sobre a prestação laborativa (e disponibilidade obreira, é claro), mantendo incólumes as demais cláusulas contratuais.

De fato, a referida interrupção do contrato de trabalho, a despeito de provocar a sustação da prestação de serviço pelo empregado, não ocasiona a paralisação, durante o seu período, das demais cláusulas contratuais, dentre elas uma que constitui uma das principais obrigações patronais: a de manter o pagamento dos salários devidos ao trabalhador. Bastante adequada, destarte, a denominação citada pelo autor alhures.

A este respeito, Vólia Bomfim Cassar (2011, p. 1001), menciona a crítica de autores como Orlando Gomes à denominação adotada pela CLT. Isto porque, conforme explica, a doutrina estrangeira somente prevê a suspensão do contrato de trabalho, sendo esta subdividida em total (que equivale à suspensão do contrato de trabalho) e parcial (que equivale à interrupção do contrato de trabalho em si).

O argumento principal envidado é o de que a denominação adotada pela CLT (interrupção do contrato de trabalho) não seria a mais adequada para substituir a nomenclatura estrangeira (suspensão parcial), que melhor se prestaria a definir a figura jurídica em comento.

Durante o período de interrupção contratual, conforme interpretação da literalidade do art. 471 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o empregado não perde a posição ocupada, no trabalho, quando da sustação parcial do contrato. De outra ponta, também é assegurado ao obreiro afastado temporariamente todos os direitos alcançados pela categoria a que pertence durante sua ausência.

O referido art. 471, in verbis, dispõe que “Ao empregado afastado do emprego, são asseguradas, por ocasião de sua volta, todas as vantagens que, em sua ausência, tenham sido atribuídas à categoria a que pertencia na empresa”.

Há, entrementes, uma ressalva na CLT, presente no §1º do art. 472, de que o empregado afastado em razão de prestação de serviço militar obrigatório ou de encargo público (hipóteses de interrupção do contrato de trabalho) deverá notificar o empregador, por telegrama ou carta registrada, de seu desiderato de voltar a ocupar o cargo do qual se afastou para que tenha direito a voltar a exercê-lo.

Da norma inserta no supracitado artigo 471, também se extrai a impossibilidade de o empregado ser despedido sem justa causa durante o período de interrupção do contrato de emprego. Nesse sentido, a título exemplificativo, a CLT, no caput do art. 272, dispõe que:

Art. 272 - O afastamento do empregado em virtude das exigências do serviço militar, ou de outro encargo público, não constituirá motivo para alteração ou rescisão do contrato de trabalho por parte do empregador.

Contudo, se houver caracterização de hipótese autorizadora de dispensa por justa causa, cometida durante o período de interrupção, para Maurício Godinho Delgado (2012, p. 1085), não há dúvida quanto à possibilidade de dispensa motivada ainda durante o período interruptivo.

O autor, contudo, não mantém a mesma opinião quando se trata da hipótese em que a justa causa foi praticada antes do surgimento do fato jurídico interruptivo e ainda esteja em fase de apuração. Diante deste cenário, ele defende que a efetiva rescisão contratual só deveria se concretizar após o término do período de interrupção contratual.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

Por fim, impende salientar que, tão logo finda a causa interruptiva do contrato de trabalho, deve o obreiro retornar às suas atividades, voltando a prestar serviços ao empregador e, também, a estar disponível para o mesmo.

DAS SEMELHANÇAS ENTRE A SUSPENSÃO E A INTERRUPÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

Ab initio, mostra-se possível perceber que tanto a suspensão quanto a interrupção contratual, quando operadas, provocam a sustação dos efeitos de determinadas cláusulas contratuais, que pode se dar de forma ampla ou restrita.

Em comum, são figuras que se caracterizam pela sustação de uma cláusula contratual específica: a que diz respeito à obrigação de prestação de serviços e de disponibilidade por parte do empregado em benefício do empregador. Isto porque, quer na interrupção, quer na suspensão contratual, há sustação de prestação de serviços por parte do obreiro.

Esta sustação da prestação de serviços, por sua vez, se mostra incapaz de acarretar o término do vínculo de empregado em ambos os casos, mantendo-se a plena vigência do contrato de trabalho.

Do mesmo modo, quando da ocorrência de suspensão ou interrupção contratual, não se vislumbra alteração subjetiva do contrato de trabalho. Como explica Maurício Godinho Delgado (2012, p. 1072), isto se dá porque “elas não envolvem, de maneira direta, a modificação de cláusulas do contrato, mas apenas a efetiva sustação provisória de seus efeitos”.

Outrossim, ambas as formas de sustação dos efeitos de determinadas cláusulas contratuais aqui estudadas têm o condão de restringir, durante o seu interregno, a liberdade que o empregador possui de romper imotivadamente o pacto de emprego.

CONCLUSÃO

Através do presente estudo, espera-se ter trazido ao leitor as balizas necessárias para a compreensão do instituto da interrupção do contrato de trabalho, mormente para diferenciá-lo frente às modalidades de suspensão contratual.

Crê-se que, a partir do conhecimento de sua natureza jurídica e características particularizadoras, mormente dos efeitos causados ao contrato de trabalho por ocasião de sua concretização, será possível ao leitor ter o presente estudo como um ponto de partida para descortinar suas amplas hipóteses de incidência previstas na legislação e na jurisprudência pátrias.

REFERÊNCIAS

CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do trabalho. 5ª Ed. Niterói: Impetus, 2011.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 11ª Ed. São Paulo: LTr, 2012.

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito do trabalho. 6ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012.

Justicia, a inteligência artificial do Jus Faça uma pergunta sobre este conteúdo:
Sobre a autora
Thaissa Lauar Leite

Analista Judiciária no Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região. Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Escola Superior da Magistratura do Trabalho da 21ª Região (ESMAT-21).︎

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Publique seus artigos